Digestivo nº 495 | Julio Daio Borges | Digestivo Cultural

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DIGESTIVOS

Segunda-feira, 28/10/2013
Digestivo nº 495
Julio Daio Borges
+ de 8200 Acessos




Teatro >>> Os Saltimbancos
Todo mundo cantou Os Saltimbancos, nos anos 80, quando era criança: "Nós, gatos, já nascemos pobres, porém, já nascemos livres..." Sem perceber que havia uma tremenda mensagem política embutida. Quando se assiste hoje ― e há montagens que nunca saem de cartaz ―, a primeira associação é com A Revolução dos Bichos, de Orwell. Porque os animais se revoltam contra seus donos e resolvem fugir, como na novela do autor de 1984. Acontece que ― ao contrário de concluir que a "revolução" é apenas outra forma de opressão (entre os próprios bichos) ―, Os Saltimbancos insiste na luta de classes, maldizendo os "patrões" e navegando na maré política do Brasil de então. Ainda sob o impacto da ditadura militar, havia o aceno da redemocratização, mas os bichos, n'Os Saltimbancos, são "o povo", naquela visão romântica da época da fundação do PT: "explorado", "injustiçado", "oprimido" etc. Do PT antes da tomada do poder, vale dizer; antes da presidência de Lula, portanto. Quando o partido se colocava como o último reduto da "ética na política". Antes do mensalão... Assistir a Os Saltimbancos, hoje, é viajar no tempo... Quantos ideais, quanta inocência... Sendo que, atualmente, o próprio Chico Buarque não vota mais "com o PT". Sentia-se responsável ― afinal Sérgio Buarque de Hollanda assinou a ata de fundação do partido e costumava dizer, antecipando o "discurso", que, nos livros de História, sempre faltava "o povo"... Os Saltimbancos "de Hollanda" ainda mistura um pouco do teatro de Ariano Suassuna: e o Jumento, que lidera a bicharada, tem a inteligência de um João Grilo, de uma Caroba, mas sem o mesmo humor, e sem a mesma poesia (afinal serve a um fim "útil"). Não seria errado aproximar o Jumento do sindicalista e líder operário Lula (e não pelos mesmos motivos que Diogo Mainardi aproximaria). Ocorre que o Jumento, com fama de "burro", revela-se um líder nato, na peça. "Uma força da natureza", como Collor definiu Lula. O Jumento vem "dos rincões", não domina nenhum saber específico e desconfia dos apelos da "cidade grande", que parece seduzir os outros bichos. O texto, abrasileirado, evoca um País menos urbano. O Cachorro funcionaria como uma espécie de "Sancho Pança" do Jumento, entre a fidelidade e a falta de senso crítico. (Como um Chicó, d'O Auto da Compadecida?) Já a Gata tem a malícia da cidade grande, abusa do charme em benefício próprio, mas dialoga também com o feminismo à brasileira, com a mulher moderna, independente, pós-desquite... Os Saltimbancos, o título, num dado momento é confundido com "assaltantes de banco", provavelmente fazendo alusão à "guerrilha urbana", que, de fato, assaltava a bancos e, inclusive, sequestrava embaixadores, sempre em nome da causa (basta assistir a O que é isso, companheiro?, baseado no livro de Gabeira). Aliás, ao reencontrar seus "donos", todos reunidos na "Pousada do Barão", os bichos fazem uso da força, colocando os "patrões" para correr e assumindo o controle da estalagem. Evidentemente uma sugestão de que o povo, um dia, chegaria ao poder ― por ser mais forte ou, numa democracia, por ser maioria. As "diretas" não viriam de imediato e a eleição do PT, com Lula, demoraria um tanto. Ocorre que, em 2002, o povo não chegou à "terra prometida" e o Brasil não se converteu no "paraíso" da propaganda política. O mensalão revelou que o PT queria se perpetuar no poder ― como qualquer outro partido? ―, e o grau de corrupção dos que falavam "em nome do povo" se revelou o mesmo, senão maior, que o de seus predecessores... Ou seja: ao contrário do que a fábula pregava, a realidade, ou a verdade, se impôs ― como sempre. Em clima de julgamento do mensalão, é interessante observar o gesto, anacrônico, de um Antonio Candido, que escreve para José Genoíno, ex-guerrilheiro, ex-presidente do PT, "em solidariedade" depois da condenação, como um desagravo, como se a máquina de comprar apoio do Congresso Nacional, montada pelo Partido dos Trabalhadores, fosse tão inocente quanto... aqueles assaltos a banco, amadorísticos, do filme de Bruno Barreto... Aliás, o Barretão (pai) estava lá, ao lado de José Dirceu, sobre quem anunciou uma "cinebiografia". E Fernando Morais, o autor de A Ilha, estava lá também, no apartamento de Dirceu... Chico Buarque, felizmente, capitulou; e dos outros... quando vai cair a ficha? Afinal: O po-vão é tão ba-ca-na...! Mas-também-não-é-nenhum-banana...! [Comente esta Nota]
>>> Os Saltimbancos
 



Internet >>> Homenagem a Fred Leal, do podcast É Batata
A história da internet se perde na frustração dos links quebrados. Fred Leal morreu e, por ser um herói da internet brasileira, não conseguimos resumir sua importância. Quanta energia em blogs que já não existem mais, em argumentos ou discussões que envelheceramm rápido, em formatos que desapareceram, ou que não são mais compatíveis, ou que ninguém consegue recuperar. Já disseram que a internet foi, em dado momento, uma continuação da utopia hippie dos anos 60. Quando tanta gente trabalhou por simples amor à causa, esperando uma queda da "velha ordem", mas que não veio, e as contas seguiram se acumulando. Quantos existencialistas dedicaram madrugadas inteiras a colocar um "super conteúdo" no ar, mesmo sabendo que sua chance de "monetização" (como se falava) era zero ou quase zero? A verdade é que encerramos a década dos 2000 sem decifrar o enigma da desvalorização do conteúdo, se ela vai continuar para sempre ou se algum milagre vai reabilitá-lo. Fred Leal foi capaz de inaugurar um formato no Brasil, o do podcast, mas seu pioneirismo nunca lhe proporcionou o devido retorno material, se é que lhe proporcionou o mínimo reconhecimento. Fama? Talvez. Gloria? Depende. Fred Leal era capaz de se jogar na esbórnia da Flip e de trazer de lá algum conteúdo relevante. Era capaz de encarar o ocaso do jornalismo, no extinto caderno "Link", produzindo matérias em série, em troca de uma remuneração apenas simbólica. Se alguém construísse um panteão dos heróis da internet brasileira, como iríamos homenageá-los? Como descreveríamos sua importância para as gerações futuras? Dizendo que, sem eles, não haveria Google, Wikipedia, YouTube, Twitter? E quando esses formatos passassem, o que diríamos deles? Os velhos formatos ainda são os que permanecem (para além da internet)? Quais formatos (exatamente)? Fred Leal morreu no meio da balbúrdia dos suportes que se consomem uns aos outros, e sua arte, sua produção, seu conteúdo pode ter se perdido nessa transição. Quem vai reunir o que ele nos legou? Quem vai contextualizar? Quem vai "formatar" para a posteridade? Quem tem esse tempo? Ninguém. Estamos todos sobrevivendo. Ou cuidando da própria sobrevivência. E qual editor, de conteúdo, se arriscaria a apostar no legado de um pioneiro, quando pode apostar numa série para teens que, com sorte, atingirá milhares, ou milhões? O Brasil produziu blogueiros que se estabeleceram como nos EUA, ou nos países anglófonos? Se sim, quem são eles? Podcasters, então, nem se fala. Se nem de Adam Curry, o pioneiro inconteste nos Estados Unidos, temos notícia... Agora a moda é ser vlogger. Felipe Neto, Porta dos Fundos, essas coisas. Fred Leal conseguiria se converter em vlogger? Se conseguisse, que tipo de vlogger ele seria? Ao fim e ao cabo, o formato que prevalece, na internet, é o mesmo da televisão? O do vídeo ― para uma audiência de milhões? Por mais que Felipe Neto tenha tido os seus "15 minutos" com a teenager sulista em fúria, e por mais que a trupe da Fábio Porchat seja uma renovação no humor em vídeo, será que é o máximo que podemos almejar em termos de "conteúdo"? Todo o resto, que não faz rir ao vulgo, é muito "pretensioso"? Estamos condenados à velha estética dos programas de auditório, onde o máximo de gravidade é um discurso "a favor dos protestos", de Fausto Silva? Esses são os nossos grandes comunicadores? Você queria ser um deles? Será que, como Fred Leal, não estamos nos desperdiçando em microposts? Em "curtidas", em "compartilhamentos" e em "comentários"? Em fotos. Até em vídeos. Existe "arte" nisso tudo? Quem está olhando? Haverá a possibilidade de uma "curadoria" dessas coisas? No futuro? Que futuro? Estaremos vivos até lá? Quem ganharia com isso? Nossa descendência? Quem teria interesse? Alguém pagaria por isso? A discussão sobre conteúdo vale a pena ou ela só gera mais conteúdo? Fred Leal talvez não possa ser salvo do rolo compressor das "atualizações em tempo real". Mas será que o seu legado não merecia a nossa reflexão? Não pelo conteúdo, em si, mas pelo que estamos fazendo, ou pelo que queremos fazer, com o nosso próprio conteúdo? Você já pensou nisso? [Comente esta Nota]
>>> Fred Leal no Digestivo
 



Literatura >>> Um Coração Simples, de Flaubert, por Milton Hatoum
Em meados da década de 2000, Milton Hatoum deu um curso na Casa do Saber. Estava às vésperas de lançar Cinzas do Norte (2005), e Dois Irmãos (2000) era objeto de culto só de alguns críticos, como Daniel Piza. Naquele curso, Milton Hatoum mencionou suas traduções de Faulkner e de Flaubert. Era um momento em que a Cosac Naify, pujante na fase desbragada de Augusto Massi, incentivava tradutores, pagando-lhes verdadeiros direitos autorais, em edições luxuosas, de capa dura. Foi na coleção "Prosa do Mundo" que saiu Três Contos, de Gustave Flaubert, uma parceria de organização (e tradução) entre Milton Hatoum e Samuel Titan Jr., então uma estrela ascendente na Flip e na mesma Casa do Saber. Os anos se passaram, e Milton Hatoum tinha razão: o conto "Um Coração Simples", sobre a vida da criada Félicité, é primoroso. Se mais contistas brasileiros o lessem, nos poupariam de seus próprios volumes de contos. Flaubert, como todo mundo sabe, é um estilista como poucos. Se Nabokov escreveu seus contos como um poeta (que também foi) ― e pode ser colocado ao lado de Tchekhov e Hemingway, como mestre da forma ―, Flaubert não transborda em poesia, mas aplica a precisão que a história exige, construindo-a como uma pequena obra-prima. Se Nabokov nos impressiona com seu poder verbal, Flaubert não nos impressiona: deixa que a história nos impressione sozinha. Se tecnicamente, o domínio é absoluto, estruturalmente, a composição não fica atrás. Na história da literatura, não são muitas as personagens esculpidas com a perfeição da Félicité de "Um Coração Simples". Subvertendo a expectativa de quem esperava uma heroína, uma mártir ou alguém "nobre", Flaubert nos brinda com uma criada. Hoje, uma empregada doméstica? Uma daquelas figuras-chave em qualquer família, que, além das tarefas domésticas, faz as vezes de mãe, de tia, às vezes de avó, emprestando seu amor materno (mesmo sem filhos), transformando uma casa num "lar", funcionando como braço-direito da dona, ajudando, enfim, na sustencação social, e psicológica, daquele núcleo que é simplesmente a base de qualquer sociedade. A beleza de Félicité, justamente, reside no fato de que ela ignora a complexidade do mundo, não compreende as sutilezas da convivência humana, tem origem humilde, não é estudada, mas age brilhantemente "por instinto", responde às demandas com galhardia e, no seu despojamento natural, cativa. É impossível terminar a história sem se deixar conquistar por esse "coração simples" (ou "singelo", na tradução de Fernando Sabino). Flaubert concentra a participação de Félicité na vida da família da senhora Aubain, mas acrescenta um prelúdio, narrando a juventude da criada, e finaliza com seus últimos anos, sozinha, na casa vazia, após a morte da senhora, e a erosão daquele círculo íntimo. No extremo oposto das práticas da nossa época, onde a "literatura" virou uma forma mal disfarçada de autobiografia, Flaubert, como um pintor, constrói painéis. É um observador poderoso, não se consola com uma visão "impressionista" da realidade, procura ajustar cada detalhe, como numa engrenagem, onde cada peça é única e não pode ser substituída. "Le mot juste", reza o clichê ― que, aliás, todo mundo repete, mas que a grande maioria dos escritores não entende (ou não põe em prática, o que dá no mesmo). Em música, é como se Flaubert, ao escrever uma canção, ou uma suíte, compusesse uma sinfonia, com o mesmo rigor, e o mesmo cuidado com a harmonia de conjunto. Por último, a escolha dos temas. Suas narrativas não soam como um "acerto de contas"; Flaubert não "se justifica" através delas. Não quer entender uma particularidade sua, forjando uma "paisagem" em torno. Como um grande artista, escolhe, primordialmente, um grande tema ― e o explora a fundo. Se um grande tema não se apresenta, Flaubert não se sente na obrigação de preencher um vazio, apenas para entregar "um novo livro" (como tantos fazem hoje em dia). A grande arte, como sempre, está acima das demandas de mercado. É preciso repetir? Flaubert, mais do que tudo, fala por si. E ler "Um Coração Simples", na tradução de Milton Hatoum, é um privilégio que a Cosac Naify, com todo o seu projeto gráfico nababesco, nos proporciona. [Comente esta Nota]
>>> Três Contos | Um Coração Singelo
 



Música >>> Heavy Metal Music, do Newsted
Jason Newsted teve a difícil missão de preencher a vaga de Cliff Burton, quando este faleceu tragicamente, depois de cair pela janela do ônibus da banda, durante uma turnê. O último álbum de estúdio do Metallica havia sido o clássico Master of Puppets (1986). Talvez para evitar uma comparação entre os baixistas logo de cara, o grupo preferiu um EP de covers, o Garage Days (1987), que inesperadamente se converteu em outro clássico da banda. Jason, originalmente do Flotsam and Jetsam, havia passado no teste. Considerando que o próximo álbum de estúdio, ...And Justice for All (1988), também se converteria num clássico, o futuro parecia sorrir para Jason Newsted. Mas os anos 90, segundo a profecia de Joey Ramone, seriam "o começo de fim do Metallica". O lendário vocalista dos Ramones afirmaria isso ao brasileiro André Barcinski, no livro Barulho (1992), enquanto James, Lars, Kirk e Jason viviam o auge da consagração do Black Album. Dito e feito: o conjunto nunca mais gravaria nada próximo de Metallica (1991). E em algum momento entre o auge e a queda ― incluindo a polêmica contra o Napster, na virada do milênio ―, Jason Newsted teve o bom senso de abandonar o navio, terminando substituido por Robert Trujillo, do Suicidal Tendencies. (Que, por sua vez, nunca se integrou totalmente ao Metallica ― parecendo sempre um baixista emprestado... do Suicidal Tendencies. Mas essa é outra história.) Jason ainda se aproximaria do Sepultura no seu auge, também na década de 90, comparecendo ao casamento de Ig(g)or Cavalera, em São Paulo, e provavelmente fazendo a "ponte" entre Andreas Kisser e o resto do Metallica, quando James Hetfield se acidentou e precisaram de um guitarrista urgente. O fato é que ninguém mais tinha ouvido falar de Jason Newsted ― fora uma participação ou outra na comemoração de 30 anos do Metallica ― até Heavy Metal Music (2013). E quem daria bola para um disco solo do ex-baixista de uma banda decadente, que só se mostra "em forma" para executar velhos hits? A verdade é que Heavy Metal Music é um grande disco ― uma autêntica celebração do rock pesado dos anos 90 ―, e o Newsted, a banda de Jason, merece respeito. Ainda mais no meio de tantos revivals que não parecem empolgar nem os "seguidores" mais fiéis. Incluindo, obviamente, reencontros históricos, como o de Ig(g)or e Max, no Cavalera Conspiracy. A impressão que se tem é de que mesmo os músicos que permaneceram "na ativa" perderam a velha "pegada". E as novas gravações não tem nada a acrescentar. Na realidade, diluem o que havia de bom. E como soa o Newsted? Não necessariamente como o Metallica, como era de se esperar. Primeiro que Jason canta. Sim, ele canta. Mas nada a ver com James Hetfield; sua inspiração parece ser mais Lemmy Kilmister, do Motörhead, com o baixo distorcido e acelerado a puxar o resto do comboio. E, por incrível que pareça, Dave Mustaine, ex-renegado do Metallica, é também uma inspiração para Jason. "By the teeth of my skin", um simples verso, evoca Countdown to Extinction (1992), um hit radiofônico, e musicalmente Rust in Peace (1990), outro álbum clássico ― mas do Megadeth. Claro que alguns solos de guitarra homenageiam o timbre de Kirk Hammet; muitas "paradas" evocam o Metallica clássico (da época de Jason e de antes); e as faixas mais lentas, e arrastadas, de Heavy Metal Music pagam tributo ao formato consagrado em ...And Justice... e Black Album. Ocorre que os méritos do Newsted, apesar disso, persistem. Jason se revela um letrista de mão cheia. Ao contrário de uma estrela do rock que poderia estar aposentada, guarda uma visão de mundo bastante sombria, um inconformismo saudável (dentro do gênero), não apostando em "imagens" gastas e conhecidas. Nos melhores momentos, acena para as "filosofias de vida" de um Max Cavalera. Instrumentalmente, ainda, as sessões rítmicas são assaz trabalhadas ― sobretudo para alguém que já conheceu o mainstream. O Newsted, no seu esforço sonoro, brilha como uma banda iniciante ― não se poupando em estúdio e não facilitando as execuções durante a turnê. Ao contrário de seus contemporâneos, em resumo, Jason Newsted deixa registrado que ainda tem algo a acrescentar ao gênero. E Heavy Metal Music é o disco que toda banda dos anos 90 adoraria gravar e não conseguiu. [Comente esta Nota]
>>> Heavy Metal Music
 

 
Julio Daio Borges
Editor
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Rocco
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Saunders / Elsevier
(2003)



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Theodor W. Adorno
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Livro Ensino de Idiomas Food For Thought Level 3
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