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Segunda-feira, 17/2/2014
Toda Poesia, de Paulo Leminski

Julio Daio Borges




Digestivo nº 497 >>> Paulo Leminski teve a sorte de ficar esgotado ao mesmo tempo em que sua fama renascia. Morto em 89, em consequência do alcoolismo, permaneceu quase inédito para toda uma geração até o ano passado. Não por acaso, seu desparecimento, nas livrarias, coincide com a queda da editora Brasiliense e com a ascensão da Companhia das Letras. E o editor por trás de tudo isso: Luiz Schwarcz. É uma feliz coincidência que Leminski tenha sido lançado nacionalmente pelo principal editor das últimas décadas e que tenha sido reeditado, por ele, quase 25 anos depois de partir. Sua fama entre os jovens de hoje, contudo, tem uma história à parte. Leminski começou ambicioso, com formação em latim, dialogando com os concretistas, até sua versão tupiniquim do Ulisses, o Catatau (1975). Mas Leminski se aproximou da publicidade, flertou com a MPB, com o rock brasileiro, e poderia ter mexido bem mais com audiovisual. Mal comparando com Vinicius de Moraes, que começou metafísico, em Oxford, fundou a bossa nova, com um maestro, e acabou nos braços das mais variadas musas terrenas, Leminski não quis ser filósofo de gabinete, caiu nos bares da vida, trocou os irmãos Campos pelos roqueiros dos anos 80 e emplacou versos que são, mormente, achados verbais, cultura pop em último grau ― algo entre o jingle que marca uma época e o refrão que gruda para sempre. Não espanta que tenha virado best-seller entre a geração que cita até "fake" da Clarice Lispector e se identifica com a prosa urgente (existencialista?) de Caio Fernando Abreu. Dada a sua aproximação com o haicai, muito do efeito da lírica de Leminski não se perde em 140 caracteres, por exemplo. O coloquialismo de sua produção encanta jovens globalizados, deslumbrados com o fenômeno "contemporâneo", e a anos-luz de qualquer tradição ou história. Leminski não exige pré-requisito para ser lido. Numa poética mais afinada com a canção popular, não por acaso dialogou, em vida, com gente como Caetano Veloso. Em outras palavras: quando a poesia virou letra de música, perdemos os "estritamente" poetas, como o próprio Vinicius, seguido por Chico Buarque, desembocando na geração roqueira (tardia) de Cazuza. Paulo Leminski é a música popular que virou poesia novamente, em papel, ainda que "por tempo limitado". Claro que está longe de se comparar com o último grande poeta a fazer frente a Vinicius de Moraes: Ferreira Gullar. Apesar de ter feito parte do concretismo, nas artes plásticas, e por ter acreditado na revolução via poesia de cordel, Gullar se tornou crítico dos descaminhos da arte conceitual e rompeu com a ideologia, desiludindo-se com a esquerda brasileira em todas as suas manifestações. Gullar faz parte do cânone; Leminski abraçou a contracultura e o underground. Por essas e por outras, Toda Poesia, o volume, pode ser sorvido em uma sentada. O melhor livro na antologia: La vie en close, de 1991. Uma vida que estava se encerrando, literalmente. Alice Ruiz, companheira de dores e delícias, abre, contextualizando o homem Leminski.
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Editor
 

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