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Quarta-feira,
4/11/2009
A arte do romance, por Milan Kundera
Julio
Daio Borges
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Digestivo nº 439 >>>
Philip Roth tira sarro de Milan Kundera, em A marca humana (2003), criando uma personagem que é uma típica acadêmica norte-americana, e que, entre leituras sufocantes de Hegel, idolatra o autor de A insustentável leveza do ser (como se esse livro, em seu sucesso de best-seller, transmitisse uma impressão diluída do que é a literatura). Mas Roth, igualmente, presta sua homenagem a Kundera, entrevistando-o em Entre Nós (2008), onde reúne outros escritores que obviamente respeita. A arte do romance, agora em versão de bolso, talvez sirva para mostrar que Kundera, apesar da dubiedade de Roth, entende, sim, de literatura, abrindo logo com um excelente ensaio sobre o autor do Quixote, intitulado "A herança depreciada de Cervantes". Só por esse texto, a obra já valeria a pena — na realidade, uma apaixonada defesa do gênero romance, refazendo sua trajetória desde o mestre espanhol até o século XIX, até a produção contemporânea. Kundera, por exemplo, coloca que o romance deixou de ser uma "aventura", como a do Dom Quixote que saiu pelo mundo, para se tornar um mergulho na psicologia, na intimidade, nas nossas miudezas mais profundas, a partir de Flaubert. Do épico, de quem abrangeria um império, como o espanhol, chegaríamos à atomicidade de um único dia, com o Ulisses, de Joyce, no século XX. Esse ensaio poderoso, de menos de 20 páginas, poderia ser, inclusive, desdobrado num curso, que deveria ser oferecido aos nossos romancistas pátrios, que escrevem, infelizmente, mais por intuição, e que, na maioria dos casos, não têm a menor ideia da tradição do romance nos últimos séculos. Além disso, A arte do romance reúne entrevistas de Kundera à lendária Paris Review, um discurso feito em Jerusalém, mais um ensaio sobre Os sonâmbulos, de Hermann Broch, e outro sobre Kafka, com quem divide a origem tcheca. Num tempo em que a maior defesa do romance que se pode encontrar é a de Mario Vargas Llosa, sente-se um alívio quando a evocação de velhos mestres ainda dialoga conosco...
>>> A arte do romance
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Julio Daio Borges
Editor
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