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Terça-feira, 20/1/2009
Na Campus Party 2009 I
Julio Daio Borges


Escrevo do Campus Blog, enquanto o Noblat fala e é "mediado" pelo Jorge Rocha. Coloco entre aspas porque o Noblat engata uma primeira e ninguém consegue segurá-lo. Anotei que a primeira pergunta do Jorge deveria ser: "Noblat, o jornalismo morreu definitivamente?". Encontrei, antes, o Wagner "Mr Manson" Martins e ele lembrou que o Noblat foi "pato" do Cocadaboa. Não é que o Noblat igualmente lembrou (na sua explanação)? E prestou sua homenagem, pessoalmente, ao Manson. "Você continua fazendo aquilo?" (com sotaque nordestino) O Noblat, contudo, é muito simpático e conquistou a platéia. É daqueles jornalistas que não existem mais; com uma longa carreira em redações (que não existem mais ― também). Gostei da idéia dele de uma "grade de programação" pro blog. E ri da sua observação sobre a Campus Party: "Redação de jornal é um pouco menos barulhenta...".

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A Campus Party é atordoante. Vários palcos com palestrantes ao mesmo tempo. Um palco maior, com volume mais alto, no meio. Fora estandes (é assim que se escreve?), com música própria. Tecno. Barulhos de jogos. Gente falando. Toques criativos de celular... Foi difícil usar o Twitter ao longo do dia. Talvez eu use menos amanhã. Até porque vou mediar uma mesa no Campus Blog às seis da tarde. Mas eu ia falar da Campus Party... Vim com a referência da Flip, por causa dos convidados internacionais, mas fui remetido, inúmeras vezes, às minhas experiências em "Feiras da Música" (ainda existem?). Aqueles espaços imensos, muita coisa simultaneamente, gente fantasiada, conhecidos da área etc. Íamos para ver músicos e assistir a shows; procurar novidades em equipamentos, também. Aqui, na Campus Party, o público vem para ver os blogueiros ― embora muitos deles já sejam ―, "webcelebridades", conhecer novidades (ferramentas?) e interagir socialmente. Uma forma de estar na internet e na "vida real" ao mesmo tempo.

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Tirei sarro dos nerds no Twitter logo de manhã. Ocorre que o público se diversificou e aquela se tornou uma falsa primeira impressão. Se, no início, os geeks ― vamos usar esta palavra mais simpática ― chegaram primeiro, com seus mochilões e muxoxos, o mundo corporativo desembarcou logo em seguida, com suas camisas e hostess (tem plural?), para a noite fechar com uma turma que lembra, neste momento, os frequentadores de eventos de música eletrônica. Como disse Tim Berners Lee (falta um hífen em algum lugar), "se você acha a Web estranha, é porque a humanidade é estranha; e se você me pede uma opinião sobre a Web, você me pede uma opinião sobre a humanidade". No meio da tarde, por exemplo, ia gozar os velhos hippies que, igualmente, dão o ar da graça, com suas barbas, seus notebooks adesivados com slogans e suas corcovas, quando reconheço o admirável Hugh MacLeod, do Gaping Void. Barbudo ruivo, com oclinhos fundos, e um computador vermelho. Como eu disse, cuidado com as (falsas) primeiras impressões...

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O Tim me lembrou meus professores da Poli. Se teve um estalo na década de 90 e criou, simplesmente, a World Wide Web, atualmente se tornou um embaixador da coisa toda. Portanto se burocratizou, fica muito preocupado em discutir regras, suas propostas soam abstratas demais (como a da Web Semântica) e muita gente não se interessa. Tim se recusa a discutir o presente, as realizações concretas (as marcas e as empresas de internet, por exemplo), está ocupado com os conceitos; é, como eu disse no Twitter, um acadêmico. Brilhante mas está desconectado da "realidade" da WWW que concebeu há quase 20 anos. Já o Hugh é um sujeito que aconteceu, mundialmente, por conta dos desenhos que distribui pela internet. É alguém que teve sua vida transformada pela Rede. Logo, embora seja um idealista, acredita que existe uma saída para quem está preso agora num escritório (ele era publicitário) e guarda um talento represado qualquer. É mais a minha história da internet, também. Não uma questão de "standards", mas de mudar, efetivamente, a vida das pessoas.

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No Campus Blog, gostei muito da mesa sobre podcasts mediada pelo Cris Dias. Foi um pouco como a mesa de "Internet & Humor", que fizemos lá na Mário de Andrade. Animadíssima, com muitas risadas, convidados espertos e uma platéia viva. Combinação rara de acontecer e difícil de repetir. Impossível de planejar. O Cris levou a discussão adiante com muita habilidade, marcando presença mas sem aparecer demais, fazendo perguntas mas abrindo também para a platéia. O Maestro Billy se revelou uma simpatia, com excelente voz de locutor. Experimentadíssimo (niguém deve ter gravado quase mil podcasts, no Brasil, como ele). Os Jovens Nerds são uma piada em pessoa. O locutor principal parecia um político, cumprimentava todo mundo, era adorado e poderia, tranquilamente, se candidatar a vereador. O outro, um Armínio Fraga mais gordo, complementava, rememorando detalhes da produção e revelando os podres. O pessoal do IDG, igualmente, brilhou. A moça, que eu escuto na CBN, me lembrou a jornalista de Boleiros 2; e o rapaz tinha um jeito mais cerebral, falando com muita propriedade. Enfim, foi uma mesa de alto nível, a de podcasts.

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Mal acompanhei, como disse de manhã, a mesa da Bia Kunze, sobre mobilidade. Uma pena. Não encontrei posição e o som estava particularmente difícil. Ocorre que o Campus Blog é um palco entre vários, logo há bastante concorrência sonora. Depois, no mesmo espaço, um pesquisador apresentou estatísticas interessantes sobre blogs, mas, do mesmo jeito, o som não me ajudou. Espero que disponibilize sua apresentação em algum lugar da Web, porque os dados sobre a blogosfera do Brasil eram reveladores. Na sequência, encontrei, provavelmente, o pessoal da grande imprensa falando sobre estratégias com mídias sociais. Foi interessante a declaração de um jornalista oriundo do papel: "Em jornal, era mais fácil, tinha a primeira página. O mais importante vinha no alto. Depois, à direita. Por último, embaixo e à esquerda". Ainda se disse impressionado com o Orkut: "40 milhões de pessoas! Só a Globo tem isso; e as pessoas são praticamente obrigadas a ver a Globo... Às vezes eu tenho vontade de matar aquele turco que inventou. Fico olhando pra ver se entendo a atração que exerce o negócio".

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E a Bia Kunze tem razão: uma das melhores coisas da Campus Party é encontrar as pessoas. Está todo mudo sempre tão ocupado com seus afazeres on-line, no esquema 24/7, que, se não se vê no Twitter, praticamente não se vê em nenhum outro lugar (físico). A Campus Party é a oportunidade de poder trabalhar com todos esses internautas que lemos, comentamos, lincamos. No mesmo espaço físico. O Inagaki e o Edney estavam muito bem-humorados para quem trabalhou organizando o Campus Blog. O Cris Dias sempre na mesma serenidade. O Pedro Markun sempre ocupadíssimo. A Brambilla tão amável. A Ceila sorrindo e vivendo a Web com intensidade. O Jorge afiado para o Noblat (que o enrolou). E até o Manson, brother, desde quando não me passava seu nome verdadeiro, com medo de que eu fosse delatar o Cocadaboa... Essas pessoas, além de escrever a história da internet brasileira, escreveram, inconscientemente, a história umas das outras.

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Tentei assistir a outros eventos em outros palcos, mas nenhum me empolgou demais. Além do palco central, que teve o Tim e o Hugh... Muita coisa para desenvolvedores. Mas coisa muito básica, tipo a apresentação de ferramentas, técnicas ou softwares. Imaginava encontrar novidades que poderia aplicar no Digestivo, mas a própria internet, através de seus sites, continua sendo a grande divulgadora. Ou seja, você encontra alguma coisa que te interessa, num site que você admira, depois tenta implementar no seu. Não vai partir, diretamente, de uma linguagem ou de um aplicativo. Entendo as preocupações dos patrocinadores, mas não é assim que funciona. Pelo menos, não é assim que funciona comigo. Agora me ocorreu que, numa Bienal do Livro, os estandes das editoras funcionam melhor nesse ponto. Existe uma ligação (minha, talvez) com as editoras de livros que é diferente de uma ligação com as fabricantes de softwares.

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Fiquei pensando, ainda, na reclamação do Dahmer contra a Telefônica, na Folha, mas achei que as empresas atrapalharam pouco, digo, perto do que poderiam ter atrapalhado. Talvez elas saibam que os usuários de internet não suportam marketing goela abaixo, como pessoal da televisão que está acostumado, e precisam ter cuidado, para não criar antipatia, nem revolta. As empresas são aquelas de sempre, de telecomunicações, grandes portais, corporações "de fora" e algumas nacionais que cresceram à margem. Todo mundo sentiu falta do Google. E eu, particularmente, notei a ausência da grande mídia, estabelecida, com exceção da Abril. Um único estande vendendo assinaturas de publicações impressas; revistas de tecnologia, no caso. Algo completamente diferente de qualquer "feira" que já frequentei. Nenhum vendedor de jornal, nenhum vendedor de semanal de grande circulação. A gente ouve e repassa que o papel vai sumir, mas, quando ele some mesmo, é meio assustador...

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O Inagaki acertou, a guerra entre jornalistas e blogueiros ficou praticamente arquivada no ano passado. É verdade que, como vi menos publicações impressas (menos impressos, em geral), vi menos jornalistas também. Não dá para comparar, por exemplo, com eventos como a Flip, onde a massa de jornalistas é certamete maior do que a de escritores convidados. É como se a Campus Party prescindisse da velha imprensa, de certa forma. E não por esnobismo, mas porque tem tanta divulgação espontânea... Não deve haver nada parecido em termos de evento no Brasil. (E no mundo.) Montes de tweets por segundo; os Twitteiros, inclusive, estão reclamando... Não sei se é o ideal em termos de cobertura (tanto que estou agora escrevendo a minha), mas não deixa de ser espantoso. A "guerra" entre blogueiros e jornalistas ficou para trás, sim, mas porque os blogueiros venceram...

Para ir além
Na Campus Party 2009 II (a continuação...)

Julio Daio Borges
20/1/2009 às 20h12

 

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