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Sexta-feira, 17/7/2009
Rodrigo Capella em 2009
Julio Daio Borges



1. Antes de começar, Rodrigo, eu gostaria de dizer que você é um dos escritores mais inquietos que eu conheço. Como consegue manter esse ritmo de vários lançamentos anualmente?

Quando era criança, eu era muito agitado. Gostava de me esconder dentro do fogão ou da máquina de lavar e gritar: "Socorro!". Todos ficavam preocupados, pois eu era muito pequeno e totalmente indefeso. Quando me descobriam, eu corria para não apanhar. Gostava também de subir em muros - naquela época: grandes; hoje: minúsculos - e berrar: "Vou cair, me segurem!".

Acho que transferi um pouco dessa inquietude juvenil para a escrita. Escrever, para mim, é tão bom quanto ter um orgasmo. Alivia as tensões, dá ritmo e fortalece a minha energia interna. Eis o porquê de eu compor e lançar tantos livros.

Mas somente nos anos ímpares, pois nos pares o contato com o "eu" interior é menor, mais longínquo. Agora, em 2009, chegam ao mercado @ntologia online, Loucuras de um escritor e Dicas para escrever, publicar e vender um livro - que terão lançamento virtual no dia 4 de agosto, a partir das 19 horas.

2. Aqui no Digestivo, alguns dos textos mais procurados, através do Google, têm relação com aprender a escrever e se lançar no mercado editorial. Seu novo Dicas para escrever, publicar e vender um livro é exatamente sobre isso, não?

Todos os dias, eu recebo mais de 30 mensagens de jovens escritores, de curiosos e leitores interessados em desvendar o mundo editorial. O meu livro Dicas para escrever, publicar e vender um livro é, basicamente, uma obra sobre as curiosidades do mercado editorial, desvendando passo a passo o que ocorre nesse mundo, muitas vezes obscuro e injusto. Não se limita apenas em dar dicas para as pessoas publicarem; ele oferece também elementos para quem quer saber exatamente onde está se metendo...

Digo, por exemplo, que, no Brasil, não há uma crítica literária realmente competente. Falo também sobre agentes literários e explico que as fracas vendas de livros estão associadas ao deficit de leitura no Brasil. Concluo que a literatura, assim como o esporte mais popular do Brasil, é feita de momentos: O lance é único, o gesto merece ser contemplado e o drible precisa ser eternizado com uma fotografia marcante.

3. Você concorda que, justamente, o que diferencia um escritor amador de um profissional é esse compromisso de publicar sempre, que você já tem? Será que todos os amadores querem, efetivamente, se tornar profissionais?

O compromisso com o leitor deve sempre existir, já que o verdadeiro leitor, diferente do "leitor crítico", consegue buscar elementos dentro de uma obra e qualificá-los de acordo com seus gostos. O escritor deve escrever pensando no leitor, deve atender aos desejos do leitor, deve se tornar, desde o primeiro livro, um grande prestador de serviços - de entretenimento - ao leitor. Esse é o ponto chave que distingue o amador do profissional. Quem tem esse compromisso, já é um profissional.

O escritor precisa entender que o que ele escreve não lhe pertence. O que ele escreve pertence ao leitor, pois é este que dá vida às suas palavras, transformando-as em narrativas concretas. É o leitor quem vai chorar, rir, questionar, falar mal de um personagem. É ele quem, durante toda a história, se envolve com o livro. Será que todos os escritores querem ser profissionais? Também acho que não.

4. Já no seu @ntologia online, você procurou transcender o Orkut e reunir, em livro, todos aqueles que participavam da sua comunidade com dicas para escrever e publicar. Como foi o processo, do on-line para o off-line?

Criei a comunidade no Orkut "Dicas para escrever um livro" no começo deste ano e rapidamente ela foi "invadida" - no bom sentido - por curiosos e escritores. O resultado foi espetacular. Até hoje temos uma média de 10 novos membros por dia. E a comunidade, que nasceu com a ideia de ter um número limitado de membros - apenas 100 - já conta com quase 600.

Diante desses números e da excelente qualidade dos textos postados diariamente na comunidade, eu e os moderadores criamos a @ntologia online para publicar os melhores textos dos melhores autores participantes. Recebemos mais de uma centena de textos inéditos, em poucos dias. Com a ajuda dos moderadores, selecionei o melhor material e publicamos agora o livro.

A ideia principal foi mostrar que, hoje em dia, o escritor não pode ficar de fora das mídias sociais. Ele precisa estar inserido em sites como Orkut, Twitter, MySpace, Skoob, LibraryThing, Flickr e Facebook (entre outros). Um blog já pode ser considerado até "básico" perto disso!

5. Você concorda que, ainda para muitas pessoas, o livro é um fetiche, um sonho, uma realização - quando, na verdade, é cada vez mais fácil publicar, em papel, bastando, para isso, custear uma edição? Como enxerga o paradoxo?

Boa pergunta! É aquela velha história: "Plantar uma árvore, ter um filho e escrever um livro". O glamour de ser escritor vem de histórias, frases e lendas como essa. A maioria das pessoas que começa a escrever pensa no status e em ser reconhecido na rua. Mas se esquece de que, quando se publica um livro, há sempre um compromisso - com o leitor, o verdadeiro objetivo do escritor.

Então, quando me dizem que querem ser escritores e pedem dicas, eu respondo: vocês estão preparados para isso? Estão preparados para as obscenidades do mundo editorial? Estão preparados para despertar sentimentos contraditórios nas pessoas?

6. Em Loucuras de um escritor, você revela como é estar do outro lado do balcão. Eu tenho a impressão de que você se diverte muito escrevendo, publicando, fazendo turnê etc. Por que acha que, ainda assim, tantos escritores brasileiros reclamam?

Eu me divirto muito com tudo. Mas a minha risada é de alegria, de realização, de tarefa completada. O dia em que isso acabar, deixo de ser escritor. Sou um autor relaxado, pois tenho atendido às necessidades dos meus leitores. O dia em que eu não atendê-los mais, deixo igualmente de ser escritor.

Os escritores reclamam, na maioria das vezes, com razão. Os autores não têm incentivo governamental, não têm ajuda das editoras, não têm motivação para escrever, em suma. Ser escritor é realmente difícil. Outro dia, li uma entrevista de um renomado autor brasileiro contando que, quando acabava de escrever um livro, ele precisava implorar pela publicação (que poderia levar anos)...

7. Vi que você está publicando seus três novos livros via Clube de Autores - que é, provavelmente, a primeira editora sob demanda do Brasil. Ou seja, imprime conforme o livro vai vendendo... É uma boa solução para os estreantes?

No mundo literário, é difícil falar em solução sem analisarmos um contexto e refletirmos sobre o mercado como um todo. Publicar nunca foi uma tarefa tão difícil para os escritores - amadores ou profissionais. O grande diferencial do Clube de Autores não está na publicação propriamente dita, mas sim em conseguir congregar em um só espaço a publicação e venda dos livros. Ou seja, um livro publicado pode ser comercializado em poucos minutos.

Outra vantagem é a autonomia dos escritores. Ou seja, não temos as imposições frequentes do mercado editorial. Em vez de dizer "solução", prefiro classificar como "uma boa opção" para o escritor se consolidar dentro de uma esfera literária digital.

Outra boa ferramenta é o lançamento virtual de livro. Composto por vídeo e chat, é interativo e proporciona uma experiência única ao escritor e ao leitor. Para o autor porque ele consegue dar a atenção necessária a todas as pessoas. Para o leitor porque é uma forma de se economizar dinheiro e tempo (já que o lançamento presencial - realizado normalmente em livraria - exige gastos com combustível e estacionamento). Creio, inclusive, que o lançamento presencial deixará de existir futuramente.

8. Por outro lado, temos a contradição de que autores novos não querem ler seus contemporâneos. Mesmo os que pretendem lançar futuramente livros, muitas vezes não se interessam pelos lançamentos... Como resolver essa questão?

Não ler os contemporâneos é um grande erro! O escritor que não se dedica à leitura dos escritores atuais não tem elementos e embasamento para se inserir dentro de um movimento. E o pior: não consegue distinguir e entender o que realmente agrada ao público. Acaba perdido, isolado em uma ilha, sem condições de alcançar o barco e voltar ao continente.

Um escritor perdido não sobrevive muito tempo e vive em conflito psicológico.

Além de ler, os novos autores precisam ter paciência, paciência para ler e reler os próprios textos.

9. Para terminar, acredita que as novas tecnologias, para o livro eletrônico, podem converter os inúmeros leitores de telas, da internet, em leitores de livros, através de aparelhos como Kindle, iPhone ou similares? Como vê o futuro do escritor?

Acho que não. São duas coisas totalmente distintas, a meu ver. Os leitores de telas gostam de textos mais objetivos, curtos, claros e descontextualizados. Já os leitores de livros apreciam mais a história, gostam de se envolver e de conferir os elementos apresentados.

São também universos distintos, acredito, que não podem ser substituídos ou trocados. São apenas complementares. Quem lê nas telas, dificilmente leria livros no formato tradicional ou em aparelhos eletrônicos. Para agradar a esse público, os livros de leitores eletrônicos precisam ter outros formatos e linguagens (somente desta forma é que o material será bem aceito).

Precisam ser confeccionados nas mesmas características dos textos da internet. Ou seja, texto em aparelho eletrônico só tem futuro se for texto curto, objetivo, claro e descontextualizado. De outra forma, não tem futuro!

E o escritor precisa se adaptar a isso. Ele precisa, desde já, conhecer os vários formatos de obras, decifrar as várias mídias disponíveis para publicação e escrever de acordo com cada uma das suas particularidades...

Para ir além
Rodrigo Capella

Julio Daio Borges
17/7/2009 às 15h19

 

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