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Quarta-feira, 12/1/2005
Digestivo nº 209

Julio Daio Borges

>>> LÍNGUA DE ÍNDIO Desde que a Cult desistiu da literatura pura, as revistas literárias saíram de circulação nas bancas. O empreendimento de Manuel da Costa Pinto – que até parece que se deu melhor agora, sozinho – mudou de mãos em 2002 (para ele finalmente abandoná-lo em 2003) e, sob a direção de Daysi Bregantini, apostou mais na “cultura” como um todo. A “vaguidão específica” (apud Paulo Mendes da Rocha) mostra-se hoje uma tendência entre os produtos para jornaleiros. Claro que outras publicações literárias existem (descontando as da internet, é óbvio): essas sabiamente preferiram o circuito de livrarias e, muitas vezes, abandonaram o conceito de periodicidade fixa. Então, um título como esse novo da editora Escala, Discutindo Literatura (com enorme ênfase na palavra “literatura”), surge, em grande circuito, para destoar das conclusões acima. Afinal, existe esperança (ou seja: alguém aposta só em literatura nas bancas)? Bem, na verdade, não. Mesmo considerando a boa vontade dos realizadores, Discutindo Literatura faz parte de uma série (ou coleção), Discutindo... (alguma coisa) e – num primeiro exame – apresenta-se como uma mistura da antiga Cult com a badalada Nossa História, com a adolescente Superinteressante. A combinação é, sim, esdrúxula, mas, também, explicável até certo ponto. Discutindo Literatura procura dar aquele tratamento de “curiosidade generalista” a temas como poesia, prosa regionalista e até lingüística (forçando aqui a nota um pouco) – como se esses assuntos, que exigem uma iniciação mínima, pudessem caber em um daqueles “guias” organizados por Marcelo Duarte (Curiosos, Olimpíadas, etc.). Traduzindo: para o público médio, o poeta, por exemplo, está tão próximo do alienígena que, de repente, é até mais viável embalá-lo como curiosidade histórica ou científica. A esse approach, adiciona-se nomes como João Alexandre e Frederico Barbosa e – pronto – a coisa ganha uma aparência menos asséptica e – bônus – uma chancela intelectual. O pior é que: aos letrados e wannabes não resta outra alternativa senão torcer para que Discutindo Literatura firme o pé e encontre uma linha – pois, mesmo que plena em equívocos, a revista, ainda assim, tenta resgatar uma era geológica perdida: a da literatura.
>>> Discutindo Literatura
 
>>> BET YOU’LL NEVER GET TO KNOW ME Num tempo de recesso para a indústria fonográfica em geral, Leandro Carvalho conseguiu a proeza de praticamente lançar 2 (dois) CDs num mesmo ano. Ou, então, uma proeza igualmente portentosa: trabalhar 1 (um) disco por ano. Estamos falando de Cromo e do mais recente London Poem, que vieram à luz no mesmo ano de 2004, mas que lidam com diferentes horizontes. Na verdade, a quase confusão é bastante justificável e até natural: Cromo teve sua divulgação envolvida pela turnê de Leandro Carvalho com o Britton Quintet e London Poem foi inteiramente concebido para essa formação: quinteto de cordas mais violão solo. O projeto todo – com apoio do British Council, da GlaxoSmithKline e da Secretaria de Estado de Cultura do Rio de Janeiro – procurou abordar o cancioneiro brasileiro que teve inspiração (ou então raiz) anglo-saxã. Assim, abre grandioso com uma versão instrumental para “Maria Bethânia”, a composição de Caetano Veloso durante seu exílio em Londres, que – na virada de 2004 para 2005 – mereceu arranjo de um dos pais orquestrais da Tropicália: sim, Júlio Medaglia. Caetano ainda aparece, no CD de Leandro e do Britton Quintet, com “You don’t know me” (do antológico Transa) – impecavelmente cantada por Regina Machado. Como a interpretação vocal era historicamente uma raridade na discografia desse violonista de gênio, não seria errado aproximar essa intervenção da de Kenny Hagood, que, em Birth Of The Cool, quebrou brilhantemente a cadência do clássico de Miles Davis e fundou, junto com seu ensemble, o cool jazz. Mais do que o autor de “Triste Bahia”, é Tom Jobim quem fornece o pilar de sustentação para que Leandro Carvalho deslize suave, macio e envolvente com o seu inseparável Quintet. Do mestre de “Chovendo na roseira”, estão (além da própria): “God and the Devil in the land of the Sun”, “Amparo”, “Remember” e “Caribe” – algumas resgatadas do songbook de Paulo Jobim com o pai e de uma trilha sonora esquecida do mesmo Tom. Fecha o mestre dos mestres: Villa-Lobos, com “Big Ben”, cujo subtítulo, justamente, intitula o álbum. Leandro – com a modéstia e serenidade habituais – apresenta no encarte sua “carta de intenções”, de reforçar a ponte cultural, antes e depois da bossa nova, entre a musicalidade das línguas inglesa e portuguesa (leia-se: brasileira). Ambição mais que realizada, London Poem ficará como mais um exemplo de ousadia e de criatividade – e de brasileiros conquistando o mundo – antes e depois daquele 1963, no Carnegie Hall.
>>> London Poem (ouça as faixas) - Leandro Carvalho
 
>>> LA FORZA DEL DESTINO John Neschling, para muita gente, acaba mais conhecido pelas opiniões polêmicas que emite do que por seu trabalho propriamente dito. Quem acompanha música no Brasil, no entanto, sabe de seu feito inigualável na direção da Osesp. A orquestra, antes de sua gestão, praticamente não existia para o mundo e hoje, além da Sala São Paulo – que é uma referência no globo –, podemos dizer que os músicos eruditos e os compositores brasileiros há muito tempo não desfrutavam de tamanho crédito. Neschling se desdobra em mil e, fora as turnês pelo exterior, as gravações de autores nacionais e as realizações inestimáveis junto ao ascendente Roberto Minczuk, agora comanda, também, um programa de rádio. Na Cultura FM. Neschling, aos sábados à tarde, retransmite concertos da Osesp, tanto em matéria de obras consagradas (de grandes vultos da música) quanto em termos de autores novos (sob cuja reputação ainda pairam dúvidas e cujo opus merece ser estudado). Sua transmissão segue o mesmo pulso firme e o mesmo conhecimento de causa que se tornaram sua marca registrada. Neschling, ainda que conviva com esse universo profissionalmente, tem a paciência necessária para abordar cada trecho, estabelecendo, por exemplo, comparações e analogias em seguida levadas ao ar pela edição do programa. É uma pena que suas emissões não sejam diárias e que atualmente se concentrem numa faixa de difícil acesso para a maior parte do público. Afinal, o fim de tarde de sábado continua disputado (com outras formas de lazer, mas disputado). De todas as alterações que a rádio Cultura sofreu, desde a nova presidência de Marcos Mendonça, essa pareceu a mais sensata até agora; as demais, bastante questionáveis (principalmente pela retirada de programas como o de Dante Pignatari sobre música de câmara). A torcida é para que John Neschling receba, mais uma vez, o reconhecimento que merece – e que sua influência se espalhe beneficamente nos meios de comunicação.
>>> Osesp ao vivo - Cultura FM (ouça agora)
 
>>> O CONSELHEIRO TAMBÉM PUBLICA NO RASCUNHO

E, finalmente, foi ao ar a colaboração publicada no Rascunho do fim de outubro sobre o perfil de Paulo Francis escrito por Daniel Piza em 2004. O texto, intitulado "No palco corrosivo de Paulo Francis", foi a primeira incursão do Editor do Digestivo Cultural no mais importante suplemento literário atual, dirigido por Rogério Pereira.
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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