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Sexta-feira, 20/10/2006
Digestivo nº 300

Julio Daio Borges

>>> LES INDISPENSABLES Enquanto o formato CD atingia o auge e depois a queda, a imprensa musical não se animou a soltar novos títulos. Havia outras maneiras mais interessantes de se perder dinheiro, diziam. Por exemplo, com uma amante argentina. O irônico, ainda no tocante a publicações musicais, é que hoje a mesma Argentina serve de modelo para o Brasil. A Argentina não teve a sua Bizz – pelo menos, não com esse nome –, mas está na nossa frente com a sua versão da Rolling Stone (igualzinha à original, só que em espanhol) e com a sua adaptação para Les Inrockuptibles (esta uma revista inicialmente francesa). Por aqui, temos assistido às campanhas agressivas da velha Bizz (as últimas duas edições, respectivamente, com John Lennon e Renato Russo) e há quem anuncie a Rolling Stone brasileira (para quem não se lembra, já em sua segunda encarnação). Em termos de periódicos, e considerando-se o ocaso do CD (e do DVD), é um boom editorialmente tardio. Primeiro, porque havia muito mais dinheiro circulando, no reino da indústria fonográfica, nos anos 90. Segundo, porque imprimir papel, depois da internet, não faz muito sentido (sobretudo para as novas gerações...). Embora o público seja outro, os publishers parecem se inspirar no aumento recente da tiragem de uma New Yorker ou de uma Economist. No Brasil, vale repetir, é sintomático que o melhor site sobre música, nesse formato de revista eletrônica, seja ainda o CliqueMusic (do início do milênio, mas abandonado logo depois...). Apesar do TramaVirtual (outra proposta) e do Music News (mais uma newsletter). Será que uma nação musical como a nossa reencontrará sua fórmula? Não perca a resposta nos próximos, e emocionantes, capítulos.
>>> Los Inrockuptibles
 
>>> ENTRANCE Ainda que um tenha se originado a partir do rock e que o outro tenha praticamente fundado a noção de MPB (que ninguém aqui se esqueça da polêmica envolvendo a guitarra elétrica!), vale a pena malcomparar Fito Paez e Caetano Veloso. São dois ícones pop que, a exemplo da bossa nova, fazem mais sucesso fora (e são mais respeitados lá) do que em seu país de origem. Cansado de apanhar da crítica a cada novo disco, o nosso Caetano anda cada vez mais quieto em seus lançamentos em áudio. Do último, , ninguém ouviu falar. Os lojistas, na falta de uma classificação melhor, já o apelidaram de “Caetano com guitarras” ou de “Caetano tocando rock”. Já Fito Paez está, em forma de poster gigante, forrando as principais lojas de discos de seu país (ou as que ainda restaram...). Seu CD recebeu o título de El mundo cabe en una canción e a imprensa local não se dispõe nem mesmo a resenhá-lo. Reserva, para ele, um minúsculo espaço; lança dúvidas e não estabelece nenhum juízo sólido. Como se Fito Paez fosse uma doença contagiosa (como, aqui, o é Caetano). O fato é que El mundo... não soa mal, apesar de os compatriotas do autor terem razão: registra inquietações muitas, mas não apresenta necessariamente novidades. Como Caetano, Fito cresceu demais internacionalmente – e até há pouco era mais conhecido como marido de Cecilia Roth, a protagonista de Tudo sobre minha mãe (1999). E Caetano era aquele que cantava “Cucurrucucu Paloma”... Tudo culpa do Almodóvar. (Aliás, o modelo atual de felicidade para Paez é Victoria Abril.) São, no mau sentido, “antenas da raça”. Entre um verso e outro de uma gravação, se vêem obrigados a fazer um statement. Como o diretor de colégio em O Ateneu, estão condenados à obsessão da própria estátua. Pena para a música dos países dos dois...
>>> El mundo cabe en una canción - Fito Paez
 
>>> FERVOR DE BUENOS AIRES Borges também ficou conhecido por seus ares oraculares e por sua aparições públicas – cênicas, às quais já se dedicaram até alguns livros... Mas Borges, como qualquer pessoa, possuía seu duplo. Daqui a algumas semanas, está vindo à tona um Borges privado – também em formato de livro... Não, não é mais um lançamento duvidoso de Maria Kodama. São as anotações do diário de Adolfo Bioy Casares, a maior amizade em toda a vida de Jorge Luis Borges. O amigo fiel (ou infiel?) tratava de registrar os papos com o Bruxo, de duas a três vezes por semana, quando este comparecia à sua casa para jantar. Surge, então, um Borges muito menos diplomático que o de costume, mas tão interessante quanto (ou mais). Espanta um pouco que o erudito, que tinha por hábito embasar qualquer colocação, chame, por exemplo, Thomas Mann de “idiota”. Ou que não veja muita graça nos monumentos literários construídos por Joyce, embora reconheça, em sua linguagem, algo de “endiabrado”. Ou, finalmente, que menospreze a obra de contemporâneos como Ernesto Sabato (com o qual Borges teve, a propósito, um encontro – em livro aqui no Brasil...). A justificativa para essas e outras divertidas boutades reside na certeza – compartilhada por Borges e Bioy Casares – de que o escritor deve preservar apenas aquilo que diz respeito a seus temas, o resto deve terminantemente descartar. (Os autores brasileiros, eternamente fazendo média e escrevendo prefácios inócuos, vão se horrorizar.) Para quem não se interessa muito pela língua solta borgiana, o volume, intitulado simplesmente Borges, promete vir recheado de novos juízos literários bem-comportados. Felizmente, Borges ainda pode ser Borges – mesmo que por vias tortas.
>>> Borges, de Adolfo Bioy Casares: dos amigos implacables
 
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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