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Sexta-feira, 16/11/2007
Digestivo nº 348

Julio Daio Borges

>>> TROPA DE ELITE, DE JOSÉ PADILHA O que sobrou ou o que vai sobrar de Tropa de Elite, de José Padilha? O símbolo do filme já virou até uniforme para dançarinas de programa de auditório no fim de semana, foi, de maneira tão condenável (ou até mais), usado para justificar reportagem-editorial de revista semanal e, entre a diluição total e a apropriação ideológica indébita, ameaça virar enredo de escola de samba no Carnaval 2008, ou argumento na boca de governador, filho de carnavalesco, para declarar enfim a guerra civil no Rio. Por pior que seja a conseqüência – e ignorando a discussão estética, que já foi mesmo para as cucuias (ou nunca teve lugar) –, é bom lembrar como um filme, uma obra de arte ou um “produto cultural” (como dizem agora) pode ainda ser poderoso. A discussão, desta vez, não partiu das hard news, não foi iniciativa de nenhum parlamentar e, muito menos, teve o empurrão de nossos carcomidos intelectuais (pós-silêncio): a discussão, prescindindo da cadeia de distribuição da indústria cinematográfica, e prescindindo até da ex-todo-poderosa mídia, partiu das próprias pessoas, que não precisam mais do establishment para se comunicar, pois estão conectadas pela internet. Eis a grande novidade do longa de José Padilha: a imprensa, o poder constituído e a chamada “sociedade civil” vão correr atrás da internet, das pessoas, que estão abrindo mão dessas velhas estruturas, para estabelecer uma nova ordem muito interessante. Em vez de travar o debate pré-Muro de Berlim, sobre qual lado, no filme, tem mais razão, muito mais produtivo seria localizar o gênio do marketing viral por trás do fenômeno on-line Tropa de Elite. Certamente ele teria respostas muito mais úteis a fornecer, para as nossas já obsoletas perguntas.
>>> Tropa de Elite
 
>>> HOMEM EM QUEDA, DE DON DELILLO Parece que todos os ficcionistas hoje também têm de encarar o 11 de Setembro. Desde o inglês Martin Amis – que leu os primeiros esboços de Casa de Encontros na Flip – até grandes nomes da literatura norte-americana, como John Updike, passando por best-sellers como Frederick Forsyth, todo mundo se inspira no primeiro fato histórico do século XX, para escrever sobre terroristas, fundamentalistas e/ou simplesmente the american way. E se um dos melhores livros de não-ficção sobre o assunto parece ser mesmo o de Lawrence Wright, um dos melhores de ficção, justamente, parece ser o de Don DeLillo. O autor de Nova York já havia acertado na mosca em Cosmópolis, mas, infelizmente, quando o livro chegou (em 2003), o assunto já não era mais – por motivos óbvios – os novos yuppies, da chamada nova economia, tão cibernéticos quanto desumanizados, quanto superpoderosos. Homem em Queda, que chega agora, enfrenta a desvantagem de suceder uma porção de tiros n’água literários – e ainda que não seja a obra-prima sobre o 11 de Setembro é talvez a descrição ficcional que mais se aproxima do desastre, nas primeiras e nas últimas páginas. Nas primeiras, o protagonista caminha entre os escombros e vemos, nitidamente, a Nova York logo depois dos ataques (DeLillo deve ter presenciado – ou apurado em detalhes). E nas últimas, o mesmo protagonista volta à cena dos ataques, só que, desta vez, em retrospecto, e dentro das Torres Gêmeas. No meio, uma historinha boa, mas banal (sobre separação e reconciliação). Parece que o volume se justifica pelas bordas e não pelo miolo. DeLillo, obviamente, já passou da idade de captar o 11 de Setembro em sua totalidade – se é que alguém o fará (Philip Roth?) –, mas apenas algumas páginas de Homem em Queda, vale repetir, são, até agora, a melhor recompensa para quem quer mergulhar literariamente na catástrofe.
>>> Homem em Queda
 
>>> ORQUESTRA SINFÔNICA DA GALÍCIA COM JOSEP COLOM Desde a União Ibérica (1580-1640) provavelmente que os brasileiros não tinham tanto contato com a Espanha, os espanhóis, suas empresas e instituições. Mas se antes foi à força, hoje o relacionamento é consentido e ninguém questiona que, até agora, a “invasão espanhola” tenha sido para melhor. Desde a Telefônica que tirou a telefonia paulista do atraso histórico (apesar da briga pelas tarifas e apesar das trapalhadas do Speedy) até recentemente a aquisição do Banco ABN Amro Real pelo Santander (compondo, para o bem e para o mal, a terceira maior instituição bancária do País), a influência da Espanha se torna incontrastável no Brasil, também nas artes. Culturalmente, basta pensar no fôlego de uma editora Alfaguara e na pujante programação do Instituto Cervantes, na capital paulista. Talvez pensando em tudo isso, o Mozarteum Brasileiro incluiu, em sua Temporada 2007, a Orquestra Sinfônica da Galícia, num dos últimos concertos deste ano, no mês de outubro. E talvez para demonstrar a mesma consistência das ações dos espanhóis em tantas áreas de nosso País, a Orquestra fechou a noite com um tour de force, a Quarta Sinfonia de Brahms (sendo que o próprio compositor só concluiu sua Primeira depois dos quarenta anos). Mas o melhor do programa foram as peças de Manuel de Falla (autor ainda por se conhecer aqui): o “interlúdio” e a “dança” da obra La Vida Breve e as “impressões sinfônicas para piano e orquestra”, as Noches en los Jardines de España (onde Josep Colom brilhou no seu instrumento). A abertura dos trabalhos teve, ainda, Andrés Gaos, em sua Impresión Nocturna. E se o Instituto Cervantes resgatou, em 2007, a secular arte do violão ibérico (e de seus antecessores), o Mozarteum complementou com o universo erudito orquestral. Esperamos que, em 2008, a presença espanhola continue tanto economica quanto artisticamente interessante para nós.
>>> Mozarteum Brasileiro
 
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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