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Terça-feira, 20/4/2010
Franz Kafka, por Louis Begley

Julio Daio Borges




Digestivo nº 461 >>> Kafka talvez seja o maior escritor do século XX. Maior do que Joyce, maior do que Proust. Afinal, mais que um inventor da linguagem, mais que um grande memorialista, Kafka profetizou os horrores do nazismo, das grandes guerras, da opressão e mesmo da burocracia. Morreu em 1924, mas a "acusação sem motivo" já estava presente em O Processo; a discriminação já estava em A Metamorfose; e toda a subjetividade moderna já estava contida em Carta ao Pai. Vila-Matas, um dos maiores autores contemporâneos, outro dia, confirmou; mas não é esta a tese de Louis Begley, em seu ensaio biográfico O mundo prodigioso que tenho na cabeça (Companhia das Letras, 2010). Kafka, cuja obra nunca cabe naquela vidinha de burocrata em Praga, tenta ser explicado, desta vez, pela linhagem familiar, pelo judaísmo ambíguo, pela parca vida sexual, pela poderosa literatura e pelo seu legado para a posteridade. Numa boa exploração de suas cartas, por exemplo, Begley mostra o quanto Kafka podia ser manipulador, estranho e irascível. Seu grande sofrimento, nas relações mais próximas, talvez revelasse — mais que a tirania de um pai ou a incompreensão de uma bem-amada — uma simples incapacidade de se relacionar. Ainda que enfrentasse uma porção de contratempos — que talvez ele quisesse exorcizar em suas obras —, Kafka viveu para seu trabalho literário, meramente suportando a vida prática e, no fundo, não fazendo muita questão das pessoas ao redor. Entre terminar a Metamorfose, trabalhar no romance Amerika e ir encontrar a noiva em outra cidade, Kafka não hesitava — deixava a noiva esperando. Em outros grandes escritores, isso é também nítido, como quando Fernando Pessoa dispensa sua única namorada, porque deveria atender ao chamamento de "outros mestres". O ensaio de Begley ainda vale pelas entradas nos diários de Kafka, habilmente citadas. Não é uma grande obra de interpretação do escritor tcheco, mas talvez mate um pouco da nossa insaciável fome de Kafka — enquanto Modesto Carone não nos brinda com uma tradução, justamente, das cartas e dos diários...
>>> O mundo prodigioso que tenho na cabeça
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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