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Segunda-feira, 3/3/2003
Exploradores mais do que inventores

Julio Daio Borges




Digestivo nº 123 >>> Ernesto Sabato não foi contemplado com as loas da crítica tupiniquim, porque é mais comum conhecermos as letras da Europa e dos Estados Unidos do que a produção da nossa vizinha, América Latina. Sabato foi polígrafo na Argentina, onde trocava figurinhas com Borges, até romperem politicamente. Compartilhavam impressões sobre Heráclito, para, futuramente, Sabato enxergar em Borges um discípulo de Parmênides (ou, ao menos, da "esfera de Parmênides"). No Brasil, a Companhia das Letras vem reeditando suas obras e, justamente, abriu 2003 com "O escritor e seus fantasmas" (1963), reunião de ensaios e notas do autor sobre o seu métier. Bastam algumas páginas para saber que os nossos vizinhos, em Buenos Aires, não estavam mal informados sobre literatura - e para lamentar que não tenha havido, entre os nossos escrevinhadores, maior intercâmbio. Na introdução, Sabato evoca os dilemas do criador na periferia do mundo - mas, ao contrário dos vitimados que fazem disso uma retórica, não apela para a sua condição de "subdesenvolvido" e procura abordar os problemas em pé de igualdade com os grandes (sem complexos ou ressentimentos). Fala da idade de ouro do romance, o século XIX, com proficiência - e não hesita em apontar, no século XX, os tropeços que atravancaram os realizadores contemporâneos seus. Não aceita que a abordagem psicológica (de um Proust, por exemplo) esteja fora de moda e não perdoa as investidas (equivocadas, segundo ele) na onda cientificista e na pretensa objetividade herdada do jornalismo. Entusiasta do romantismo alemão, aposta num retorno à paixão, ao conhecimento que escapa à razão, como saída para o atual realismo frio e para a paulatina desumanização do público. Extrapolando um pouco os domínios de quem escreve, não poupa nem os literatos, nem os críticos. Os primeiros, por causarem-lhe aversão; os segundos, por puro nojo. O volume caminha aleatoriamente e, por isso, não fecha com uma única conclusão. Contudo, se houvesse uma, ela seria a da persistência - mesmo num mundo em que os homens de letras têm sofrido reveses sucessivos.
>>> O escritor e seus fantasmas - Ernesto Sabato - 202 págs. - Companhia das Letras
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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