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Quarta-feira, 16/4/2003
E agora, José?

Julio Daio Borges




Digestivo nº 129 >>> Cuba é a Disney World das esquerdas. Uma frase de Sérgio Augusto. Mas logo vem a pergunta: – Será que ainda é? Estamos falando da última “execução sumaríssima” de Fidel Castro, que, no fim de semana passado, expurgou três “seqüestradores de balsa” (rumando, logicamente, para Miami). Também calou algumas vozes e caçou a liberdade de expressão dos poucos intelectuais independentes que restavam. Mais de 80. Uma ação de rotina (aos olhos de quem vem denunciando os barbarismos do ditador há anos)? Na verdade, não. Primeiro, porque os jornais do mundo inteiro noticiaram (embora o estratagema tenha sido urdido no “apagar das luzes” de uma guerra como a do Iraque), e os jornais daqui, mesmo os “progressistas”, não tenham podido deixar de noticiar. Segundo, porque José Saramago, o comunista luso-brasileiro mais teimoso desde Barbosa Lima Sobrinho e Oscar Niemeyer, resolveu se manifestar. E rompeu com a ilha, e com seu comandante. Terceiro, porque a esquerda brasileira teve (muitos ainda vão ter) de se posicionar. Fernando Morais, do alto da contradição de ter entusiasticamente biografado Chatô e enfaticamente apoiado Orestes Quércia, foi trágico e declarou solenemente que “o mundo vai acabar”. (Tradução: não há nada de errado com Cuba mas sim com Saramago.) E até apelou para João Ubaldo Ribeiro, como que sugerindo seu ulterior apoio, incitando-o a falar. Talvez o autor de “O sorriso do lagarto” sabidamente faça como o Governo Federal, que deu uma gafe condenando o conflito no Iraque (que o diga Palocci) e que, agora, resolveu “moitar”. O PFL [oposição] lançou um manifesto de repúdio à repressão castrista, mas PT e PC do B [situação] preferiram não assinar. No “Estadão”, a propósito do pronunciamento do autor de “A Caverna”, mais uma meia dúzia de três ou quatro decidiu comentar. Haroldo de Campos optou por um escapismo vocabular (sua especialidade) e usou uma palavra difícil, “nódoa”, para não ter que apontar o dedo para a ilhota. Renato Janine Ribeiro deu também voltas e, na delicada posição de quem ensina Maquiavel na faculdade, limitou-se a afirmar que ditaduras “desse tipo” estão fora de moda. Quem se saiu melhor foi Antonio Torres, que ironicamente soltou essa: se protestaram tanto contra a guerra, como, agora, ignorar um ato sanguinário de Fidel Castro? A esquerda ainda vai patinar muito com essa história. Quem sabe até enxergue o óbvio. Mesmo que muitos profetas tenham morrido em vão: tentando fazê-la enxergar.
>>> Saramago rompe com Cuba
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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