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Quinta-feira, 4/9/2003
Gott in Frankreich

Julio Daio Borges




Digestivo nº 143 >>> Mort Rosenblum é provavelmente um dos maiores jornalistas gastronômicos em atividade atualmente. Seu livro, “Um ganso em Toulouse”, pela Rocco, praticamente não teve divulgação no Brasil, dentro das editorias a que corresponde. Talvez porque o brasileiro não tenha o hábito de ler longamente sobre comida, preferindo simplesmente a crítica impressionista, com foto do prato e, se possível, estrelinhas (ou, melhor ainda, cifrões). Aqui, claro, a coisa não atingiu o “estado da arte” de se converter em cultura – como no caso da França, objeto da análise de Rosenblum. O país permitiu a esse correspondente da Associated Press tecer longos relatos (ou, mais precisamente, reportagens) sobre a incomparável produção francesa de comes e bebes. Ele esquadrinhou cada região (dedicando a cada uma um capítulo), de acordo com a temática e a geografia. Rosenblum vai do lugar-comum de assuntos como “queijos” e “vinhos” até a complexidade do que chama “la France profonde”. Os termos em francês são constantes (posto que inevitáveis) e esse aspecto talvez desencoraje o bravo leitor não-familiarizado. Mas a abordagem não é técnica e o autor aposta na curiosidade que pode haver por trás de uma criação de escargots, de uma caça às trufas (através de uma vara de porcos treinada) e de perseguição a veados, floresta adentro, como na Idade Média. Afinal, na terra de Napoleão, a História há muito se confunde com o que se bebe e se come – como, aliás, afirma a epígrafe de Brillat-Savarin: “O destino das nações depende de como se alimentam”. Na França, mais do que em qualquer lugar. Ao mesmo tempo, Rosenblum não é reverente e põe em dúvida, ao longo do livro, a vitimização de uma cozinha que se vê invadida pelos ditames do “fast-food” e da globalização. Ele coleta pontos de vista os mais diversos: ora os de um “chef” que enxerga no McDonald’s (“McDô”, para os íntimos) a imagem do apocalipse; ora os de outro que vê nos “barbarismos” um despertar dos franceses para um de seus legados mais ricos. Entra igualmente na polêmica do Guia Michelin (que tradicionalmente confere notas aos estabelecimentos) e não deixa de cutucar a delicada questão “árabe”, que produz nos seus interlocutores sucessivos “pufs!” e “pafs!”. Mort Rosenblum é, acima de tudo, jornalista, e seu feito merece crédito na seara da gastronomia – ainda que exija, do leitor, a mesma paciência que os comensais, hoje em dia, não têm mais tido.
>>> Um ganso em Toulouse - Mort Rosenblum - 376 págs. - Rocco
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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