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Segunda-feira, 23/2/2004
O que o fogo já leu de cartas

Julio Daio Borges




Digestivo nº 163 >>> A poesia, conforme a frase de Robert Frost, se perdeu na tradução. E a expressão, de tão batida, acabou virando título de filme. Enquanto isso, segundo Ricardo Silvestrin (do jornal “Zero Hora”), o Brasil inteiro está “carpinejando”. Estamos falando da antologia “Caixa de Sapatos”, do poeta gaúcho Fabrício Carpi Nejar, de 31 anos. Provavelmente o nome mais ovacionado, em matéria de poesia, de sua geração. São quatro livros (1998, 2000, 2001 e 2002) reunidos em um (2003), pela Companhia das Letras. Como poesia de verdade, há muito tempo, deixou de existir, falta-nos critérios para julgar o “carpinejarismo” (se é apenas uma unanimidade irresistível ou se é mesmo um fato incontestável). Como estamos mais próximos à tradição da prosa, podemos afirmar, desde já: – Carpinejar é um grande frasista; ou, se preferirem: – Carpinejar é um grande versificador (mais da “filigrana” do que da estrofe). Exemplos (que valem o livro): “Só na velhice a mesa fica repleta de ausências”; “Tornei-me o diário de uma viagem cancelada”; “A literatura não prestou para me entender”. Ou então, explorando contradições e invertendo o sentido do “óbvio” (Oscar Wilde era mestre nisso, e Umberto Eco tentou desmascará-lo): “O medo é de dormir na luz”; “Aprendeu a se deslocar parado”; “Ainda que não me lembre, legarei memória”. Claro: são pontos luminosos, e ainda não saiu nenhum “Poema de Sete Faces” (eu sei que não é correto comparar). Muito menos uma “Educação pela pedra” (também sei que é covardia). Mas, obviamente, entende-se o entusiasmo em torno de Fabrício Carpinejar. Finalmente alguém trata a poesia como se ela não fosse um “slogan” publicitário (Leminski); como se ela não fosse uma fórmula matemática ou um jogo de armar (Irmãos Campos); e como se ela não fosse banal o suficiente para se converter em refrão de música popular (nem precisa citar). Carpinejar torce algumas das nossas noções, e isso, por enquanto, basta.
>>> Caixa de Sapatos - Fabrício Carpinejar - 80 págs. - Companhia das Letras
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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