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Segunda-feira, 25/4/2005
Hell Bar

Julio Daio Borges




Digestivo nº 224 >>> Em 2004, Miguel do Rosário apareceu nas páginas da revista NovaE, de Manoel Fernandes Neto, desbancando os escritores iniciantes. Era um artigo vibrante, desprovido de autocomiseração (já que Miguel era também autor) e cheio de verdades, sobre a atual geração, que ninguém ousava proclamar. Lúcido, preenchido com insights, até promissor, o texto lançava a suspeita de que Miguel do Rosário, quando começasse a escrever, funcionaria como uma espécie de redentor. Por isso, toda a expectativa em torno de Contos para ler no botequim, sua estréia em livro, agora este ano. O resultado, lamentavelmente, está bem longe das promessas de antes – talvez, quem sabe, para provar que a cura não tem nada a ver com o diagnóstico e que, se Miguel do Rosário foi mais um profeta a desmascarar um estado de coisas na literatura nacional, ele não é o messias tão esperado. Se, como jornalista, Miguel, obviamente, jovem, demonstrou uma maturidade incomum, como escritor, tem um longo caminho a percorrer (se essa for sua ambição). O livro, para começar, passa a imagem de uma coletânea apressada, sem muita unidade – onde, desde a falta de cuidado com a apresentação, até o desleixo na preparação dos textos e na revisão, denunciam um amadorismo, insustentável, no presente estado da técnica. A não ser que a tática seja anticomercial, antimercado, em suma, antieditorial – já que Miguel do Rosário é militante de esquerda. Mesmo assim, da maneira como foi feito, não se justifica nem se paga. Literariamente, que é o que no fundo importa, os contos são de um primarismo assombroso. Reina a temática ainda adolescente, do sexo, da rebeldia, da contestação; e reinam, formalmente, os cacoetes da geração de escritores que Miguel tanto criticou. A sucessão de cenas foi feita para cinema ou televisão (e não para literatura); a superficialidade das personagens (mal introduzidas, mal desenvolvidas) não sustentam a narração; a porção autobiográfica ofusca qualquer esforço de criatividade, já que o volume repete, exaustivamente, os mesmos clichês em voga (violência, corrupção, alienação). Miguel do Rosário, vaidoso como todo escritor, muito provavelmente não aceitará que se lhe apontem as falhas – mas, num rompante de raiva, deve lembrar que a honestidade que, como crítico, sustentou deve ser aplicada também a ele próprio, como escritor.
>>> Contos para ler no botequim - Miguel do Rosário - 79 págs. | Aflições de um jovem escritor
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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