DIGESTIVOS
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Segunda-feira,
8/12/2003
O herói devolvido?
Julio
Daio Borges
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Digestivo nº 152 >>>
Para quem não sabe, Marcelo Mirisola é considerado uma das revelações da nossa literatura. É difícil dizer quem o referendou; existe uma história (recente) da proteção fornecida por Manuel da Costa Pinto, quando tentaram censurá-lo na “Cult”; também a polêmica reportagem da “Trip”, que, como Millôr Fernandes fez com Woody Allen, chamou-o de “loser” (ou “nerd”, tanto faz) que deu certo. Mirisola é ainda amigo de Mário Bortolotto, o homem de teatro por trás do vanguardista “Cemitério de Automóveis”, que andou adaptando suas obras. Mas será que isso tudo basta para uma “consagração”? Para terminar, Mirisola proclama que vive “sem grana”, que o tempo de hoje não é o da literatura e que Big Brother é “Dostoiévski sem cérebro” (apud Pedro Bial). Pode até parecer interessante para uma “personalidade”, mas seus livros – que deveriam justificar toda essa “promoção” – não o são. Pelo menos, não esse “Bangalô” (2003): 125 páginas de confissões. Mirisola é, no máximo, um cronista – daqueles que destilam suas misérias. Dá muitas voltas para (não) falar de si próprio – e está lá em todas as folhas. Se fosse autodestrutivo, romântico e trágico, talvez desse uma versão anos 2000 para Carlinhos Oliveira, o “Órfão da Tempestade” – que não rendeu literatura (só crônica), mas que cresceu em função do folclore. Há, porém, uma contradição flagrante. Se os bêbados míticos do jornalismo brasileiro viveram demais e escreveram de menos, a geração “Mirisola” escreveu demais e viveu de menos. São montanhas de orgias, drogas, barbarismos e excrementos. No papel. Na realidade, o sujeito continua o mesmo gordinho bonachão de sempre. Uma persona literária altamente inverossímil, portanto. Parece querer usar seus escritos para “comer” quem não “comeu”, “tomar” o que não “tomou”, “agredir” quem não “agrediu”... E lamentavelmente não são poucos os “Mirisolas”. Qualquer um que já teve algum contato com o “métier”, deve ter topado com aquele tipinho clássico: entre 30 e 40 anos, “artista”, vociferando contra o mundo, enquanto se esconde debaixo da saia da mamãe (não necessariamente a genitora). Certamente um excelente caso para a psicanálise; mas não para a literatura.
>>> Bangalô - Marcelo Mirisola - 125 págs. - Editora 34
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Julio Daio Borges
Editor
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