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Terça-feira, 2/1/2007
Concisão e sensibilidade
Ana Elisa Ribeiro

Paulistana nascida em 1981, Elisa Andrade Buzzo estréia na poesia com o livro Se lá no sol (7Letras, 2005, 64 págs.), lançado pela do Rio de Janeiro. Curiosamente, o livro, da coleção Guizos, que já lançou também um pequeno catálogo de bons novos poetas, não sai por alguma das tantas editoras de São Paulo, atualmente o grande centro da literatura brasileira, ainda que pressionado pela produção do Rio Grande do Sul.

Elisa Buzzo apresenta ao leitor uma obra com 43 poemas em apenas um bloco. Embora caiba bem publicar a autora numa coleção inspirada na poeta portuguesa contemporânea Adília Lopes (a coleção tem o nome de Guizos porque este seria o nome de um dos gatos da poeta d'além mar), não é na dicção portuguesa que Se lá no sol mais se afilia. Elisa tem a leveza de quem leu os poetas marginais brasileiros dos anos 1970, relaciona-se com os temas da atualidade e brinca com certo instinto de mineiridade. Em "Cupido", tudo parece acontecer em Ouro Preto: "Anjinho mulato/ surrupiou/ meu coração barroco". E embora ela aponte para um eu poético anguloso e complicado, não é bem assim que se expressa. Muito pelo contrário, Elisa parece saltitar entre os versos com leveza e minimalismo. O coração barroco não se deixa migrar para a forma dos poemas, tão retos e suficientes.

O traço mais prazeroso da poesia de Elisa Andrade Buzzo pode ser, entre tantos outros, a concisão. Difícil, hoje, encontrar poetas que consigam fazer poema com pouco material lingüístico. Mais difícil é que isso aconteça de propósito, numa demonstração de domínio da ferramenta. A poesia, não raras vezes, tem sido verbosa ou mesmo apenas uma coleção de metáforas que pouco comunicam (às vezes nem mesmo entre si).

Uma certa nota musical cai bem, mas poesia "puro som" não convence o leitor que deseja, também, compreender. E a poesia de Elisa Buzzo, além de dar seus pinotes na linguagem ordinária (sem o quê não seria poesia), consegue dizer das coisas, consegue comunicar, algo que, imagino, pode facilitar até mesmo que ela seja falada em público. Tomara que públicos cada vez maiores.

Às vezes Elisa vem com versos auto-retratáveis, mas borrada de um ar de leveza, como em "Renascimento": "criei-me santa,/ mas sou perversa,/ galho de mil pontas". As pontas surgem na combinação de palavras e na flauta que parece ter sido regida por um "Cacaso": "quando meu amor/ tira os olhos de mim/ eu não enxergo". Se a autora não leu o poeta dos '70, é de fato uma coincidência deliciosa.

Em "Amor", Elisa Buzzo atormenta: "Frasco garrafal/ de perfume/ adoro/ tirar/ a tampa". Para o leitor que tira a tampa deste frasco cheio de poemas, fica a sensação de que não havia ali apenas cheiro, mas também uma brisa leve cheia de talentos já revelados no primeiro livro. Que Se lá no sol seja a primeira nota desta essência poética consistente.

Para ir além
Se lá no sol

Ana Elisa Ribeiro
2/1/2007 à 00h33

 

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