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Sexta-feira, 20/7/2007
Não queimem os jornais, ainda
Daniel Lopes

Talvez por conta de um problema na vista, que cansa depois de algum tempo lendo no computador, talvez por pão-durismo, ao não querer ver a conta da energia nas alturas, ou talvez simplesmente pelo fetiche por papel, tendo a ficar com um pé atrás em relação às "novas mídias".

Mas vou defender a mídia tradicional criticando-a. Primeiro, aquele que já é um lugar comum: ou os jornais se reinventam ou morrem. Estão morrendo, mas ainda dá tempo de se reinventarem. Torço por sua vida eterna, mesmo não gostando de lê-los. E não gosto porque não trazem o tipo de texto que me interessa, as análises e as reportagens de fôlego. Por isso, prefiro as revistas.

Comovo-me ao ver quem acha que os sites e blogs, com milhares de textos disponíveis gratuitamente para leitura, farão com que os veículos tradicionais saiam do mapa. Comovo-me porque um pouco de utopia não faz mal a ninguém. Na pior das hipóteses, os jornais sairão do mapa, mas dinossauros como este escriba continuarão a fazer e a comprar revistas, nem que tenhamos de formar uma seita, secreta, se necessário.

Do lado dos jornais, essa pior hipótese se confirmará caso teimem em continuar sendo calhamaços de notícias e poços de mediocridade e hipocrisia, ao se anunciarem como imparciais. Se um dia desses eu fundar um jornal, o lema será "parcial e independente". Porque é primordial ter um lado, dizer que o tem, e, ao mesmo tempo, não estar vinculado diretamente a grupos políticos ou financeiros, vinculado a ponto de não poder discordar de seu partido, senão vai à bancarrota.

Uma das razões pelas quais mais e mais pessoas estão deixando os jornais de lado e passando para a internet é que, nesta, elas já encontram, com muito maior rapidez, as hard news, em quantidades infinitas. E encontram, também, opinião não travestida de informação, principalmente em blogs.

Como mencionei, é igualmente vital à mídia em papel lançar mão de e aprofundar aquele que ainda é seu diferencial - a grande reportagem, de preferência grande nos dois sentidos. E grandes reportagens, até onde se sabe, ainda só se consegue fazer com dinheiro, por mínimo que seja. Eu prefiro pagar para ter acesso a uma revista ou a um jornal com matérias esclarecedoras sobre meu país e o mundo feitas por repórteres que sabem escrever, do que abrir mão disso em nome de milhares de textos gratuitos na internet, sem profundidade alguma e lamentavelmente mal escritos.

Vamos aos Estados Unidos, país com o maior número de gente conectada à grande rede. Quantos sites, lá, substituem a leitura de uma The Nation, uma New York Review of Books, mesmo de um NY Times ou Washington Post? Aqui no Brasil, quantos sites têm textos melhores que uma Caros Amigos, uma Entre Livros, piauí ou Carta Capital? São todos veículos que, acredito eu, terão vida longa.

A mídia virtual veio, veio forte, e trouxe benefícios, um deles, o poder de dizer aos donos e editores de jornal "ou vocês criam um serviço diferenciado, ou nós vamos roubar todo o seu público, porque quem tem dinheiro para consumir jornal regularmente, tem computador em casa, e não vai pagar pelo que pode ter de graça". Se, por autismo, aqueles que fazem mídia tradicional não escutam o recado, é outro problema; se escutam e mesmo assim resolvem não fazer nada, é suicídio, e com suicidas não se deve argumentar. E, obviamente, simplesmente torcer para eles não terem sucesso numa provável tentativa de mudança de rumo, em nome de um luddismo às avessas, é ato infantil.

Daniel Lopes
20/7/2007 às 10h53

 

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