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Sexta-feira, 7/9/2007
A obra de Chico Buarque
Débora Costa e Silva

"Vida, minha vida. Olha o que é que eu fiz". Como na música "Vida", o jornalista Fernando Barros fez os alunos do curso de MPB do Espaço da Revista Cult olharem para o que Chico Buarque fez durante sua vida. Na última terça-feira, o autor do livro Chico Buarque - Folha Explica analisou a obra do cantor e compositor carioca, intercalando músicas, histórias, análises e curiosidades. O artista, quase unanimidade entre público e crítica, tem cerca de 40 álbuns, três romances e quatro peças de teatro. Um prato cheio para discussões, pena que num espaço tão curto de tempo. Afinal, são mais de 40 anos de carreira para serem relembrados em duas horas de aula.

Mesmo assim, o panorama traçado por Barros englobou várias questões. Uma delas foi a própria análise que a mídia e os estudiosos acadêmicos fazem da obra do cantor. O jornalista comentou sobre uma das principais tendências que o mercado e a academia seguem: dividir a obra, seja em épocas, fases ou temas. É muito comum ver CDs com coletâneas de canções que falam de uma só temática ou estudos que abordam determinada fase do artista.

Mesmo reconhecendo o quão difícil é lidar com toda a obra de Chico, que além de complexa é extensa, Barros critica algumas dessas clivagens. Uma das tendências desaprovada por ele é privilegiar o período de confronto do regime militar. Para o jornalista, isso ocorre porque o compositor ficou mais famoso nesta época. "Ainda hoje sua imagem é refém da caricatura que se construiu no auge da ditadura. O combate à ditadura não é a tônica da obra dele e a interpretação da obra ainda está muito viciada nesse viés", afirma.

No entanto, uma das principais teorias defendidas durante a aula foi justamente o contraste existente entre a produção musical feita até os anos 80 e o que foi feito depois. De acordo com o jornalista, nos anos 70 há um predomínio de expressões artísticas (peças e músicas) que tratam de temas coletivos, que solicitam o engajamento e a participação das pessoas em alguma causa, talvez por conta da situação política em que vivia o Brasil.

"A partir dos anos 80 o Chico é mais recluso, tanto na música quanto na literatura. A obra fica menos óbvia. O antigo inimigo, a ditadura, não está mais lá", explica. Segundo Barros, as canções e os romances são mais introspectivos. Mas por quê? "A obra dele é muito reveladora. Ele percebeu muito antes como seria frustrante nossa redemocratização, pois ela não cumpre o que prometeu", avalia.

Um dos temas mais freqüentes dessa nova fase é o papel do artista na sociedade, a sua função, propósitos, frustrações e a relação com a mídia. "Na carreira" e "Mambembe" foram as canções que Barros utilizou para exemplificar essa temática freqüente na obra de Chico. Na literatura, isso pode ser observado no livro Budapeste, que fala, entre outras coisas, sobre a relação do escritor com a indústria cultural.

Se tem algo que explica o porquê de toda a genialidade de Chico Buarque é o fato de que em suas canções ele fala de temas universais por meio do retrato do cotidiano dos brasileiros. O jornalista até cita uma frase, tirada de um ensaio de José Miguel Wisnik e Guilherme Wisnik, que resume essa idéia: "Chico Buarque faz como se virasse uma canção a página da história". Para Barros, Chico é o segundo maior poeta modernista do Brasil, sendo o primeiro Carlos Drummond de Andrade.

"Vida, minha vida
Olha o que é que eu fiz
Toquei na ferida
Nos nervos, nos fios
Nos olhos dos homens
De olhos sombrios
Mas, vida, ali
Eu sei que fui feliz"


Chico realmente tocou na ferida, nos nervos, nos fios e nos olhos de muitos homens e mulheres com sua música. Por isso tem se dedicado a escrever canções inspiradas no ofício do artista, tentando talvez entender a própria obra.

Para ir além
Espaço Revista Cult

Débora Costa e Silva
7/9/2007 às 20h19

 

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