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Terça-feira, 18/9/2007
Uma questão de sexo e morte
Adriana Baggio

Uma questão de vida e sexo (José Olympio, 2006, 400 págs.), de Oscar Moore, lançado no Brasil em 2006 pela José Olympio, é um livro denso, pertubador e cruel. Apesar disso, ou por isso mesmo, é uma boa história, daquelas que prende e que dá vontade de saber o que vem em seguida. Um dos responsáveis por isso é o herói da narrativa - neste caso, um anti-herói.

Hugo é um menino que vive no subúrbio de Londres na década de 1970. O livro mostra o dia-a-dia do adolescente, a sua relação com a família e com escola e o desenvolvimento de um aspecto de sua personalidade que vai acompanhá-lo até o fim da sua breve vida: a libido exacerbada.

Quando Hugo descobre o sexo e aprende como satisfazer o desejo que ele sente em seu corpo quando vê homens sem camisa, passa a mentir e organizar sua rotina de forma a proporcionar o maior número de oportunidades possível para encontrar homens com os mesmos desejos que ele. E essas oportunidades acontecem, em sua maioria, nos banheiros públicos londrinos da época.

Reforçando, a narrativa é bastante crua nos termos e nas descrições, mas sem ser apelativa ou pornográfica. Ela é adequada ao contexto e o autor parece ir se soltando aos poucos, talvez para não chocar o leitor. Aliás, a linguagem vai pesando à medida em que a vida de Hugo fica mais pormíscua e perigosa.

A questão a que se refere o título é o papel do sexo na vida de Hugo. Por mais autodestrutiva que tenha sido essa relação, ela não poderia ter sido de outra forma. O personagem até faz uma reflexão: e se essa dependência acontecesse com uma mulher? Ela, provavelmente, sofreria mais preconceito, mais machucados e mais violência do que ele. Ele, portanto, apesar de tudo, ainda se considera uma pessoa de sorte.

Uma questão de vida e sexo parece ter aspectos autobiográficos da vida do autor. Oscar Moore escreveu e lançou o livro em 1991, sob o pseudônimo de Alec F. Moran. Foi só depois de sua morte, em 1996, que a verdadeira identidade foi descoberta pelos leitores. Moore foi jornalista e crítico de cinema, e de 1994 a 1996 assinou a coluna PWA - Person with Aids - no The Guardian. Hugo morre em decorrência da Aids no livro e, assim como Moore, também teve horríveis dores de estômago e a retina literalmente comida por um vírus na última fase da doença.

Informações como essas estão em textos que aparecem quando você a faz a busca por "Oscar Moore" no site do do The Guardian. Um deles, bastante curioso, é um comentário da mãe de Moore, Elisabeth, publicado em 2003, em que ela se posiciona contra a ordenação de bispos gays. A senhora começa seu argumento pedindo para não ser taxada de homofóbica por sua opinião, até porque tem muito carinho pela memória do seu filho homossexual. E, depois, cita várias passagens da Bíblia para embasar sua posição.

Uma questão de vida e sexo não é leve e nem fácil de digerir. Porém, é instigante e vale a pena acompanhar as desventuras de Hugo. Como todos os anti-heróis, ele é um desses personagens que, por mais burradas que façam, sempre acabam conquistando a nossa simpatia.

Adriana Baggio
18/9/2007 às 18h46

 

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