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Segunda-feira, 24/12/2007
Papai Noel de saco cheio
Ana Elisa Ribeiro

Em outubro, quase novembro, vi na TV uma propaganda com temas natalinos. Custei a crer. Será possível? Cheguei a conferir a data no relógio. Meu Jesus Cristinho, nem bem atravessamos a primavera e as lojas já começam a fazer a cabeça do consumidor. Nem vou tocar no assunto "religiosidade". Não vale a pena. O negócio é mesmo o consumo.

De outubro para cá, o número de cenas de árvores de Natal só aumentou na telinha. Meu filho, que não sabe bem do que se trata (ainda), pensa que Natal é sinônimo de luzes piscantes. Chama qualquer lanterna estragada de Natal. Por mim, tudo bem. Mas já andou perguntando sobre Papai Noel. Na dúvida, alimentei a fantasia. Qualquer coisa que ele peça, inclusive comer leite condensado na colherzinha, é atribuição do Papai Noel.

O shopping mais próximo da minha casa é bem na frente da obra da Linha Verde. Chegar até lá é uma cruzada cheia de aventuras. Atravessar a avenida leva alguns minutos, bastantes minutos, diga-se. E entrar naquele lugar é uma festa para os sentidos: cheiro de perfume nacional, coxinha e empada, decibéis acima do suportável, engarrafamento nos banheiros, preços nas alturas. As lojas novas já aparecem dos cantinhos mais improváveis. Ampliação do shopping bem na época do Natal, claro.

Mas Natal é muito chato. Ninguém mais acha não? Pois eu me regalo é com outras épocas do ano. Para quem não curte confusão e programa tosco, Belo Horizonte é o melhor lugar para se estar no Réveillon e, especialmente, no Carnaval.

As festas de família pipocam e as estatísticas de roubo de carros e arrombamentos vão ao auge nestas épocas. No Natal, muita festinha na varanda, muita bebedeira no quintal, muito acionamento de seguro, essas coisas. As famílias gastam alguns encontros definindo o amigo oculto, faixa de preço de 30 reais, bolsa de oncinha, carteira de couro sintético, CD do Calypso, não é? Comelança, como diz um amigo. Detesto comida salgada misturada com doce. Não como passas no arroz à grega. Dá um trabalhão separá-las no canto do prato. Azeitona preta me dá azia. Não suporto nem o cheiro do panetone. Come, come, bebe, bebe. E eu que não tomo cerveja de nenhuma espécie? O jeito é participar, bater papo e não ligar muito. Torcer para o dia passar, aí vem o réveillon. Fogos de artifício e meu filho morrendo de medo. Medo de foguete, acho.

Presente meia boca, declarações de amor insossas, até mesmo falsas. Viagens de férias para disputar sombrinha na areia de alguma praia. Aventura no deserto. E BH mais nossa. Cinema à vontade, vaga para parar o carro na rua, até os flanelinhas vão para Cabo Frio. As moças compram biquínis caros e fazem marquinhas de bronzeamento na altura da anca. Uma graça.

Papai Noel deve estar de saco cheio. Meu filho só pensa em Hot Wheels. Tudo é carrinho. Não pode ver uma linha atrás da outra que diz que é pista. Não pode abrir a porta de casa que quer ver carro batido. Impressionante. E a gente compra Maisto pra ele pensando que engana. É que nem quando minha mãe me deu um Bamba no lugar de um All Star. Pensou que enganava minha sede de consumo da marca bacana, dos tênis de cano alto, mas se deu mal. Ou eu é que me dei mal. Não é que Bamba fosse ruim, o nome é até mais bacana, mas é que a grife não era aquela norte-americana. Não é não?

E lá vou eu comprar presentes. A família cresceu em 2007. São irmãos e seus pares, filhos, enteados, tios bacanas, retribuição de favores. Lá vou eu procurar bagulhos bacanas pra marcar esta data. Todo mundo louco pra ver 2007 pelas costas. Não foi um ano bom para muita gente. Demissão, assalto, seqüestro, é isso aí, mas deu pra esconder uma graninha dos bandidos que entraram em casa. A mensalidade da escolinha aumentou. Ano que vem serão 15 reais a mais por mês. Por enquanto. Lá vou eu. Mas eu bem que gosto de ir às feiras de artesanato chique. Lá eu compro presentinhos mais baratos e exclusivos para as pessoas de que realmente gosto. Há outras tantas que bem mereciam um presente, mas a grana está curta, não dá pra sair da intenção tão cedo.

Natal é isso aí. O trabalho dá um tempo, a escola pára, não tem correria pra levar criança para a escola, a tia e a avó vêm do interior, a cidade fica intransitável. Papai Noel pede demissão a qualquer momento.

Ana Elisa Ribeiro
24/12/2007 à 00h25

 

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