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Domingo, 6/7/2008
Flip 2008 - III (parte 2)
Fabio Silvestre Cardoso

(Continuação do post anterior.)

Na mesa "Paraíso Perdido", às 17h, o holandês Cees Noteboom e o colombiano Fernando Vallejo travaram um interessante debate sobre preferências estéticas, literatura de viagem, ceticismo e visão de mundo. O interessante, no caso, se deu especificamente porque houve certa tensão entre os debatedores, em especial entre Vallejo e o mediador, Angel Gurria, jornalista do Financial Times. Difícil indicar com exatidão quando as rusgas começaram. Mas desde o início da mesa Vallejo se recusou a responder objetivamente o que o mediador lhe perguntava. Irreverente, o Diogo Mainardi da Colômbia, como escreveu Edu Carvalho, fez troça ao falar que não comentaria sobre política, religião e literatura num lugar tão agradável como Paraty, assinalando que a ocasião é para outro tipo de sentimento (felicidade). Gurria tentou, sem sucesso, outras vezes extrair respostas de Vallejo sobre a importância do lugar na sua literatura. Com isso, estabeleceu-se um clima intermediário entre o desconforto e a ironia. O público, que até então aplaudia cegamente a qualquer intervenção dos convidados, ficou dividido. Só alguns cumprimentavam o que o autor de O Despenhadeiro dizia.

Cees Noteboom obteve êxito, no entanto, ao elevar o debate. De fato, o holandês conseguiu catalizar a discussão para algo mais positivo, como quando tratou de sua estratégia de escrita (durante seu processo de criação, escreve 500 palavras por dia); ou quando falou acerca de sua relação com os livros de viagem (para ele, o fundamental é que o escritor viajante apreenda a essência do lugar em que está de passagem); ou, ainda, quando, de leve, ironizou a posição de Vallejo ao afirmar que o mundo também pode ser um lugar agradável. De sua parte, o escritor colombiano ficou isolado, mas, aqui e acolá, encontrou espaço para disparar contra a Igreja Católica ("o Cristianismo é uma empresa criminal, suja de sangue"); contra Darwin ("a Teoria da Evolução não explica muito"); e até mesmo contra os físicos quânticos. Nesse momento, o mediador não resistiu: "Em que você acredita, Vallejo?" Aí, sim, as palmas, efusivas, apareceram. Polêmica à parte, é possível observar uma diferença elementar no processo de criação desses escritores: enquanto Vallejo prefere formar sua narrativa com base na "língua falada transformada em língua literária", Noteboom possui uma relação mais íntima com a escrita, a ponto de, até hoje, escrever com sua caneta Mont Blanc em folhas especiais.

Para o último dia, Sérgio Paulo Rouanet, considerado por muitos o principal intelectual do País, promete fechar com categoria a sexta edição da Festa Literária de Paraty. Além dele, há, também, Pierre Bayard, Marcelo Coelho, Ana Maria Machado, sem mencionar o debate sobre futebol entre José Miguel Wisnik, Roberto DaMatta e Matthew Shirts.

Fabio Silvestre Cardoso
6/7/2008 às 11h55

 

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