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Segunda-feira, 7/7/2008
Flip 2008 ― IV
Fabio Silvestre Cardoso

"Os livros que não lemos" era o tema da mesa de abertura do último dia da Festa Literária de Paraty. Eduardo Carvalho, direto do seu BlackBerry, já estava a caminho da estrada de volta para São Paulo, mas a discussão entre o psicanalista Pierre Bayard e o jornalista da Folha de S.Paulo Marcelo Coelho foi pertinente. Bayard atraiu a atenção do público principalmente graças à sua postura, algo irônica e certamente contestadora, a respeito da experiência da leitura. A partir do debate, a impressão é de que muita gente saiu do local com a sensação de que a proposta do autor francês era a de estabelecer uma nova forma de contato com a cultura, com os livros e com a literatura.

Pode-se afirmar, no entanto, que, em se tratando de impacto, nada se compara com a mesa "Folha Seca", que contou com a presença do crítico literário José Miguel Wisnik, do sociólogo Roberto DaMatta sob a mediação do jornalista Matthew Shirts. O tema? Futebol. Então, de repente, havia um auditório praticamente lotado para a discussão intelectual de um tema das multidões. Coincidentemente, há poucos dias, o Fluminense perdeu o título da Libertadores da América em uma partida, no mínimo, épica, com contornos que remetiam aos textos de Nelson Rodrigues.

Entretanto, o debate não era sobre os principais lances desta ou daquela partida. Mais do que tergiversar sobre o futebol de hoje e de ontem, os dois intelectuais, cada qual com sua formação, souberam dar um toque de classe ao apresentarem análises a propósito do significado do futebol para o Brasil e para os brasileiros. Assim, Wisnik mostrou de que forma seu livro Veneno Remédio ensaia um estudo sobre o esporte à luz das principais interpretações do Brasil no século XX. Nesse ponto, observa, Gilberto Freyre é o autor que mais se aproxima de uma interpretação mais bem acabada acerca do significado do futebol para a nação, ao apontar o esporte como democrático. E completou com sacadas do tipo: "o Futebol de Ronaldinho Gaúcho é pós-moderno, porque seus gols são verdadeiras citações literárias a outros mestres do jogo"; ou "O Brasil é um primor na tecnologia do ócio".

Roberto DaMatta, por sua vez, não apenas concordou com a tese de Wisnik, como também aproveitou para arrancar da platéia algumas risadas amiúde suas considerações. DaMatta soube, porém, dialogar à altura, sobretudo ao afirmar que "o Brasil não se realiza apenas no Futebol; do contrário, não estaríamos aqui [numa Festa de Literatura]". Na opinião do sociólogo, o esporte rearranja a questão da desigualdade de formas diversas, sem mencionar a questão da justiça do jogo (um dado que contrasta com a política, por exemplo), bem como o aspecto do mérito que valoriza o desempenho (e não a proteção deste ou daquele). Além disso, para DaMatta, o fato de o Estado não ter tentado (no passado, ao menos) organizar o jogo fez com que o futebol vingasse. Em uma platéia repleta de VIPs, esse discurso não poderia ter sido mais apropriado ― mas Orlando Senna, ministro do Esporte, apareceu lá para saudar os convidados depois.

(Continua no próximo post.)

Fabio Silvestre Cardoso
7/7/2008 às 10h02

 

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