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Domingo, 23/9/2012
O baleeiro literato
Vicente Escudero


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Mas o enigma permanece enigma, e a Baleia Branca desaparece com todos os seus atributos, de modo que não se sabe nada sobre ela - ou, precisamente por isso, sabe-se tudo. Afinal, Melville não é um borra-botas que se vale de um halo de mistério sempre que necessita de um efeito, quando não lhe ocorre o que dizer. Melville é um daqueles São Tomás da razão que lançaram luzes sobre o século XVII. Assim como os Apóstolos não queriam crer na ressurreição, em Moby Dick Melville não quis acreditar nos eflúvios fantasmagóricos, não quis acreditar que Fedallah, o chefe dos malaios de Ahab, fedesse a enxofre, não quis acreditar nas profecias nem na ferocidade dos tubarões atrás da lança de Ahab, que tenta explicar pelo fato de os tubarões preferirem a carne dos malaios. Aquilo que permanece mistério em Moby Dick, o demonismo do universo, a consciência que está por trás de forças naturais destrutivas, esse "mundo invisível de que o visível não é mais que um retrato", tudo isso é realmente mistério - tendo em vista o mundo espiritual do autor -, e um crítico fantasioso diria que, aos que tentarem ir além na explicação, está reservado o mesmo fim do capitão Ahab.

(...)

Trecho do ensaio O baleeiro literato de 1932, escrito por Cesare Pavese. Tradução de Alexandre Hubner, faz parte do apêndice da 2ª edição de Billy Budd, de Herman Melville, publicado pela editora Cosac Naify.

Vicente Escudero
23/9/2012 às 13h57

 

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