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Quarta-feira, 7/8/2013
Violões, tripas e prata
Eugenia Zerbini

O espetáculo de ontem a cargo da dupla de violonistas italianos que integram o Duo Maccari-Pugliese, na série Música de Câmara da Sociedade de Cultura Artística, começou no hall de entrada da sala no Itaim. Contando com o apoio do Istituto Italiano de Cultura di San Paolo, grande parte da plateia se expressava em italiano o que, por si só, encheu de um murmúrio cantante aquele recinto. A língua da poesia de Montale (1896-1981), DŽAnnunzio(1863-1938) e Leopardi(1798-1837): Vaghe stelle dellŽOrsa, io non credea/ Tornare ancor per uso a contemplarvi/Sul paterno giardino scintillanti/E ragionar con voi dalle finestre/Di questo albergo ove abitai fanciullo/E delle gioie mie vidi la fine (Vagas estrelas da Ursa, eu não acreditava/ Voltar ao hábito de contemplá-las/ Cintilantes sobre o jardim de meu pai/ E conversar com vocês das janelas/Deste refúgio onde morei menino/E vi o fim de minhas alegrias).

Paolo Pugliese e Claudio Maccari tocam em juntos desde 1988, ano em que se reuniram com o objetivo de interpretar peças para violão compostas no século XIX. Tocam música informada - ou seja, com instrumentos de época. Na apresentação de ontem, dois violões Guadagnini, nome da célebre família de luthiers italianos que os produziram. Um deles é de 1812; o outro de 1830. Ambos com as três cordas superiores de tripa e as três inferiores de seda recobertas de prata. Adotam uma afinação mais grave, tudo para recriar o som da música de outrora. E, uma curiosidade: os músicos tocaram sem partitura e em pé, com os corpos movimentando-se ligeira e expressivamente, como em um bailado improvisado, que brota da interpretação.

O violão erudito floresceu no século XIX. Muitos compositores dedicaram obras a esse instrumento, tais como o francês Antoine Lhoyer (1768-1852) e Fernando Sor (1778-1839), cujas obras Duo Concertante, Souvenir da Rússia e Fantasia Espanhola, respectivamente, fizeram parte do programa. Mas todo prazer ficou com a transcrição da popular abertura da ópera O Barbeiro de Sevilha, de Gioachino Rossini (1768-1868), em transcrição para dois violões, que abriu o concerto de ontem.

Abaixo, trecho do Duo Concertante Opus 31 de Lhoyer, na execução do Duo Maccari-Pugliese. Além de compositor talentoso, Antoine Lhoyer seguiu brilhante carreira militar. Membro da Guarda do Rei Luis XVI, escapou do massacre dos guardas na invasão de Versailles, em 1789. Sua vida daria um livro: alistou-se nos exércitos prussiano e depois austríaco, sempre lutando contra a França revolucionária. Morou na Rússia por uma década, onde viveu na corte, como professor de violão da czarina Elizabeth (mulher de Alexandre I), de quem se tornou favorito. Com a restauração dos Bourbon no trono francês, Lhoyer retorna a seu país para ocupar lugar de destaque no exército de Luis XVIII. Cai em desgraça em 1830, com a ascensão de Luis Felipe de Orleans ao poder, não apenas devido à reorganização do exército a partir de então, mas com a perda de prestígio do violão nos salões franceses. Depois de uma temporada na Argélia, volta a Paris, onde morre pobre e esquecido, com mais de 80 anos.




Eugenia Zerbini
7/8/2013 às 21h05

 

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