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Quinta-feira, 13/11/2014
O que é que deu no Alckmin?
Julio Daio Borges

Como todo mundo sabe, desde 2002 que o PSDB disputa e perde eleição para o PT, para a Presidência da República. Foi assim em 2002 com José Serra, em 2006 com Geraldo Alckmin, em 2010 com José Serra (de novo) e agora, em 2014, com Aécio Neves.

A eleição de 2014 foi um raro momento de paz entre os líderes do PSDB. Principalmente porque Serra se elegeu para o Senado, Alckmin se reelegeu governador de São Paulo, para seu quarto mandato, e Aécio parecia o candidato consensual - todos se uniram para apoiá-lo.

Perdida a eleição, elencados os primeiros nomes para concorrer em 2018, a paz começou a se esvanecer. O nome de Aécio não era mais consensual, ainda que o PSDB nunca tivesse chegado tão perto da vitória. Começou a surgir o nome de Alckmin...

Até aí, faz parte do jogo. Como 2018 está muito longe, no horizonte político, as especulações vão prosseguir...

O problema começou há poucos dias. Enquanto o senador Aloysio Nunes, candidato a vice na chapa de Aécio, praticamente chamava a ex-candidata de "mentirosa" e a presidente reeleita de "estelionatária" no plenário, Alckmin se reunia com a dita cuja no Palácio do Planalto.

Quando indagado sobre isso, Alckmin tergiversou. Evocou a governabilidade. Como foi pedir R$ 3,5 bilhões a Dilma Rousseff para combater a crise hídrica, disse que a oposição deveria ser feita no Parlamento. Deu a entender que não era essa a função de quem ocupava "cargos executivos"...

Foi estranho. Mas ele podia estar sendo "prático". Ou pragmático. PSDBistas logo acudiram...

Agora, a coisa ficou um pouco mais séria, porque Alckmin foi a Nova York proclamar que "pessimismo é exagerado" em relação ao Brasil. E a Folha logo estampou: "Alckmin critica pessimismo na economia".

Descontando a malicia recorrente da Folha, a crise econômica não é mais uma questão de gosto. Ou de ponto de vista. Inflação descontrolada, juro real mais alto do mundo, crescimento próximo de zero e desemprego à vista... não são opiniões, são fatos. E devem ser encarados como tais.

Alckmin foi correto ao afirmar que se deve enfrentar "rápido" a questão fiscal. Até porque, como sabemos, o governo federal está à beira de se tornar um "fora da lei". Virtualmente incapaz de cumprir a meta para 2014, fixada em lei, apelou para o Congresso, querendo "revisar" a meta. Algo como mudar a média para passar de ano, quando o aluno ameaça levar pau... A oposição não quer "revisar", claro. E com razão. Sendo assim, o que quis dizer Alckmin?

Para completar, Geraldo Alckmin entoou, nos Estados Unidos, o canto da "reforma política", a mesma evocada por Dilma no discurso da vitória. Para não soar dúbio, levantou o problema do excesso de partidos, que ameaça a governabilidade. (Ele gosta dessa palavra.) Apesar de que, quando o PT fala em reforma política, a relação que se faz é com a tal "democracia direta" - que tiraria poderes do Congresso... para dar, em última instância, à militância (ao PT, de novo).

Como se percebe, com esses movimentos, Alckmin está adentrando em terreno pantanoso. Se no início parecia só uma disputa pela candidatura à Presidência em 2018, de repente o governador começou a melindrar a oposição encampada por seu próprio partido, no Congresso... E agora, fora do Brasil, defende o governo federal - e, mais do que isso, os *projetos* desse governo, cujo partido, conforme documentos oficiais deste, não morre de amores pela democracia...

Como se diz na gíria, depois de conquistar o quarto mandato, Alckmin está "se achando". Mas se esquece de que o primeiro mandato foi herança de Mário Covas, o segundo foi inércia de Covas. O terceiro foi por mérito próprio, OK. Mas neste quarto, apesar de existir mérito também, houve o fator "anti-PT", e a ausência candidatos competitivos. Paulo Skaf, o mais próximo disso, foi muito criticado pelo uso pessoal que fez da estrutura da Fiesp, e por não ter uma ideologia muito bem definida (sendo frequentemente comparado a Gilberto Kassab).

PSDBistas exaltados proclamam, nas redes sociais, que seu partido "não deve satisfação a ninguém" (sobre suas rusgas internas). Mas deve. Pior que deve. No mínimo, deve a quem votou nele. E isso inclui eleitores de Geraldo Alckmin.

Num momento em que até quadros representativos do próprio PT, como Marta Suplicy, vêm a público fazer críticas à condução da política econômica do governo federal, e até ao governo em si, não faz sentido que o governador reeleito de São Paulo, pelo partido da oposição, venha defender esse governo, indiretamente sua política econômica, e até obscuras "reformas" - em nome da "governabilidade", da crise hídrica, ou, pior, em nome de um suposto protagonismo numa longínqua disputa presidencial...

Geraldo Alckmin, com essa postura, desrespeita seus eleitores. Desrespeita a população de São Paulo, que fez questão de não eleger o PT em nenhuma instância. E desrespeita, além do posicionamento de seu partido, o voto de, no mínimo, 51 milhões de brasileiros - que decididamente não concordam com este estado de coisas...

Para ir além
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Julio Daio Borges
13/11/2014 às 15h00

 

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