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Quinta-feira, 19/3/2015
Walter Burkert (1931-2015)
Celso A. Uequed Pitol



Neste último sábado, dia 14, no silêncio que convém aos homens de estudo, faleceu Walter Burkert, um dos maiores helenistas do último século e deste que inicia.

Na verdade, dizer "helenista" não é dar a exata dimensão da relevância de seu trabalho. Não que ser helenista signifique pouco: a questão é que este bávaro nascido em 1931 foi muito mais do que isso. Da mesma forma que Erich Auerbach, Ernst Robert Curtius, Georges Dumézil, Max Muller e tantos outros, Burkert foi filólogo, profissão que desafia os limites que a academia impõe ao pesquisador.

Explico: o filólogo impõe a si mesmo o trabalho de partir do idioma e do texto, sobretudo o literário, para chegar, em última análise, à compreensão de uma civilização inteira. De um trecho da Odisséia, Erich Auberbach extrai conclusões sobre toda a cosmovisão dos gregos; dos nomes que os nórdicos davam a seus deuses, George Dumézil faz inferências sobre toda a organização social e política daqueles povos.

Por isso, o filólogo tem de, por definição, ser um conhecedor de amplos domínios do saber. Não há, a rigor, especialistas em filologia. Talvez por isso não seja uma ciência muito presente nos currículos acadêmicos de hoje, que primam, bem ou mal, pela necessidade imperiosa de especialização.

A obra de Burkert é imensa, em variedade e importância. Em "De Homero aos Magos", abordou a influência oriental na tradição grega, incluindo aí insuspeitas presenças do Gilgamesh. Em "A criação do sagrado", a maneira como o sentido de sagrado se forma na mente humana. E naquela que muitos consideram sua obra prima, "Homo necans", Burkert investiga o processo de transformação da religião em arte. Os leitores de René Girard perceberão aí conclusões semelhantes às presentes em "Violência e o sagrado". E terão razão: Burkert reconhece, já no prefácio de Homo necans, que Girard tem pontos em comum com ele.

Nesta mesma obra Burkert define, em poucas e definitivas palavras, qual a tarefa que lhe coube, e que serve para definir plenamente a atividade de todos os filólogos:

"Sou um filólogo que parte dos antigos textos gregos e tenta encontrar explicações biológicas, psicológicas e sociológicas para os fenômenos religiosos".

Uma tarefa que cumpriu plenamente em seus 84 anos de vida.

Celso A. Uequed Pitol
19/3/2015 às 11h14

 

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