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Domingo, 24/7/2005
Jazz com casa cheia
Fabio Silvestre Cardoso

Síntese. Assim aconteceu a última noite do 8º Visa Búzios Jazz & Blues. As atrações, cada qual com seu estilo, reproduziram neste sábado (23/7) um mosaico das noites anteriores em alta definição. Com isso, desde a última aparição da itinerante e animada Dixie Square na Rua das Pedras (com direito a entrada no restaurante Don Juan) até o derradeiro acorde do cover de "Bitter Sweet Symphony", executado por Vernon Reid e The Masque, tudo concordou para uma celebração musical no Balneário de Búzios, que parece ter se fixado como endereço certo do jazz e da música instrumental no litoral brasileiro nessa época do ano.

As principais atrações desse último dia eram, sem dúvida, o saxofonista Léo Gandelman e Vernon Reid, que, conforme disseram por aqui, "conquistou o mundo com a banda Living Colour". Além desses, houve ainda a presença do duo portenho Dall-Botafogo, desta vez tocando do Pátio Havana. Pela ordem, Léo Gandelman foi o primeiro a se apresentar na Praça Santos Dumont, que desde o início contou com um público muito receptivo para o lançamento do novo álbum do saxofonista, Lounjazz. A propósito, nota-se que não foi à toa que Gandelman foi escolhido como o Mestre de Cerimônias do Festival. Sua empatia com a audiência é de fazer inveja a artistas consagrados da música pop, que muitas vezes têm de se esmerar entre constrangimentos para ganhar uma simples atenção. De qualquer forma, não é o caso do saxofonista brasileiro, que tocou acompanhado pela banda Supernova.

E é com esse conjunto que o músico propõe uma interação singular, transcendendo as fronteiras do que se considera como um padrão dos concertos de jazz. Nesse contexto, cria-se espaço para a guitarra distorcida de João Gaspar, ou o contrabaixo arrojado de Alberto Continentino (o mesmo de Ed Motta), bem como os extensos solos do baterista Allen. Léo Gandelman arrisca, portanto, fazer uma música que acaba por mesclar estilos. Exemplo disso é a mudança não só no andamento das músicas, mas também no seu formato. Do repertório novo, entra nessa vertente "Bossa rara", na qual o saxofone abre espaço para um solo crescente de guitarra. Numa outra linha, surge "Love Total", também faixa do recém-lançado álbum Lounjazz e que foi tema do filme Garrincha (uma outra paixão de Léo Gandelman, o futebol). Mais intimista, o destaque dessa música fica por conta das longas frases do saxofone. Uma bela homenagem.

O auge do espetáculo, contudo, ainda estava para chegar. Quando todos esperavam uma última música comportada, com o "Tico-Tico no Fubá" (de Zequinha de Abreu), Léo Gandelman apresentou uma versão com altos e baixos, pontuado com solos de todos os instrumentos, e aqui vale destacar o talento de João Gaspar que ora estava no cavaquinho. No calor da interpretação, uma surpresa: enquanto o saxofonista descia do palco, dois jovens para lá subiam, dançando freneticamente, para delírio da platéia e desespero dos seguranças que os queriam fora de lá. No bis, houve uma canja com o guitarrista Pepeu Gomes. Nessa autêntica Jam Session, "Maracatu Atômico" foi executada com muito talento e entusiasmo por parte dos artistas.

As duas atrações seguintes, Dall Botafogo e Vernon Reid, fizeram apresentações em que também foram ovacionados pelo público. O duo argentino teve o privilégio de tocar para uma platéia majoritariamente portenha, o que provocou uma mudança de comportamento do recatado Pátio Havana. Já com Vernon Reid, direto do Chez Michou, a reação dos presentes corroborou o sucesso e a popularidade do Festival. Do ponto de vista musical, de mais a mais, o desempenho do grupo justifica o grande interesse das publicações especializadas em música pela entrevista dos componentes.

Final de Transmissão

O sol forte de Búzios não esconde o clima de ressaca no ar. Fim de festival após cinco dias de Jazz, Blues e música instrumental numa região cercada por praias e belezas naturais. Parece improvável que seja no Brasil, país onde a musicalidade se confunde, erroneamente, com a agitação dos trios elétricos, ou pela presença de um DJ aos olhos da multidão, como disse Ed Motta em entrevista aos repórteres do festival. É, portanto, notável que essa iniciativa prevaleça quando seria muito mais fácil se render às garras do populismo e encher a cidade de turistas com o pop das rádios FM. Que iniciativas como essa se multipliquem. A boa música e seus amantes agradecem.

* fotos de Sylvana Graça.

Fabio Silvestre Cardoso
24/7/2005 às 13h02

 

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