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Quinta-feira, 13/10/2005
All That Jazz
Fabio Silvestre Cardoso

Há alguns anos, a Revista da Folha publicou uma reportagem polêmica acerca dos melhores bairros da cidade. Em verdade, a polêmica em questão foi por que o quartier de Higienópolis ficou classificado acima de muitos outros, mais tradicionais, como o endinheirado Jardins e a descolada região de Pinheiros. O fato é que se a pesquisa fosse publicada agora Higienópolis seria, de verdade, um dos melhores da cidade. Os motivos são inúmeros - como a localização, as ruas arborizadas, os bons restaurantes, o clima residencial sem ser cafona -, mas, principalmente, porque abriga, desde segunda-feira, o Tom Jazz, a nova casa da música brasileira, conforme as palavras de um de seus fundadores, Paulo Amorim.

Fundadores, sim, pois trata-se de um empreendimento que leva a marca e a tradição de três casas de espetáculo de sucesso em São Paulo: Tom Brasil, Bourbon Street e Canto da Ema. Por que, então, criar mais uma casa de jazz? Este repórter teria mil e duas razões, mas, fiel ao ofício, prefere deixar que o já citado Paulo Amorim responda: "Esta se assume como a casa do músico brasileiro. Sempre que os grandes instrumentistas internacionais vêm ao Brasil, eles desejam ouvir a música brasileira. O jazz brasileiro. Então, este vai ser o lugar". E que lugar! Confortável, iluminação adequada e muito sofisticado. Para completar a justificativa acerca dos valores (cerca de R$60 o couvert), Amorim é categórico: "Jazz é elitista no sentido cultural. Então, o ouvinte é, por excelência, mais sofisticado. Sendo mais sofisticado, ele precisa de uma casa com conforto, cuja estrutura esteja de acordo com o espetáculo." E ele segue, enfatizando que a casa possui dois camarins e sala de espera para os músicos, assim como uma carta de vinho com 60 títulos, sem mencionar o ótimo tratamento acústico, detalhe que realmente importa numa casa musical como essa.

Nesta primeira semana, o Tom Jazz recebe atrações que reafirmam o caráter da mistura da música brasileira com o jazz. É essa a impressão quando se ouve a apresentação do pianista Wagner Tiso e do violonista Victor Biglione. A dupla, que continua com shows na casa neste fim de semana (leia a programação completa aqui), investe num repertório predominantemente de clássicos da música popular brasileira, que, não por acaso, são interpretados de maneira singular, ressaltando o caráter experimental e, por extensão, jazzístico. Nesse sentido, os presentes ouviram desde "Samba de um carnaval" (a primeira música gravada de Chico Buarque) até "Doce de Coco", de Jacob do Bandolim, esta última marcada pelo improviso e pelo swing dos músicos. Nota-se, aliás, que Tiso toca um piano de altíssimo nível com economia de gestos, contrastando com a vivacidade e certa pose de Biglione, num estilo mais roqueiro, quem sabe. De todo modo, é notável como essa diferença se transforma em unidade, sendo ora mais cadenciado, ora mais frenético.

Merece destaque, sem dúvida, as versões solo de "Eu sei que vou te amar", com Wagner Tiso quase que soletrando a letra da canção ao piano, e "As Rosas não falam", em que Victor Biglione esticava as frases da música original com seus improvisos virtuosos. A apresentação terminou com um medley: Tom Jobim-Jaques Prevért. De Antonio Brasileiro, a dupla executou "Samba de uma nota só", enquanto do poeta francês uma jazzística versão de "Les Feuilles Mortes". Um começo para lá de inspirado, portanto, a estréia do Tom Jazz.

Fabio Silvestre Cardoso
13/10/2005 às 10h00

 

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