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Segunda-feira, 7/8/2006
A foto original de Che Guevara
Marília Almeida

Qual é a história por trás de uma foto? Ainda mais uma que virou ícone de uma geração, estampada exaustivamente em camisetas? Um foco rápido e acidental com uma câmera de 35mm, durante um ato de comemoração a vítimas de uma explosão, que conseguiu capturar o olhar distante de Che Guevara, considerado o herói da Revolução Cubana. Esta aura, aliás, foi perfeitamente captada pela foto O Guerrilheiro Heróico, que o fotógrafo publicitário e retratista de Havana Alberto Díaz, o Korda, tirou em 1960. Bom, nem tanto, já que descobrimos que a famosa foto foi cortada e endireitada em um ângulo mais certeiro.

É sua original que pode ser visualizada na exposição fotográfica A épica revolucionária cubana, na Galeria Senac Lapa Scipião, em São Paulo, até o dia 18. É a primeira realizada pelo Instituto de Mídia e Artes (IMEA), pólo de pesquisa em mídia criado em 2005, em parceria com a Fototeca de Cuba. Sua curadoria, aliás, é de Nelson Ramirez de Arellano, fotógrafo e curador-chefe da Fototeca.

Ela é apenas o começo de um intercâmbio artístico e cultural entre Cuba e Brasil. O grupo pretende levar a exposição para galerias no Rio Grande do Sul e trazer, em 2007, uma mostra sobre fotógrafos cubanos contemporâneos, além de selecionar trabalhos de fotógrafos brasileiros para uma exposição coletiva em Havana.

A mostra é uma seleção de fotos dos primeiros anos da Revolução Cubana. Em 69 obras em preto-e-branco, que abarcam o período de 1959 a 69, é possível ter uma noção do trabalho de oito fotógrafos expoentes do período: Corrales, Korda, Oswaldo Salas, Libório Noval, Perfecto Romero, Ernesto Fernández e Roberto Salas.

As fotos de Raúl Corral, o Corrales, recentemente falecido e que trabalhou para a agência de propaganda do Partido Socialista Popular de Cuba, conseguem captar as fortes expressões dos milicianos, como em La boda del miliciano, onde podemos ver, literalmente, um casamento no fogo cruzado e sentir um pouco do sentimento militante da época. Mas é Caballeria (60) sua foto de maior destaque. Apesar de parecer as antigas cavalarias napoleônicas, o contraste dos sombreiros e óculos escuros dos sorridentes cavaleiros montados em imponentes cavalos brancos não nos deixa enganar sobre qual é o tema tratado. A contradição da revolução é bela e veemente.

Libório Noval nos mostra a cara do sofrido povo cubano. Mas Perfecto Romero, assim como Alberto Díaz, o Korda, nos mostram o outro lado. É em certo sentido até uma contradição com estes rostos vermos Fidel e Che jogando golfe ou pescando. Mas aí está uma coisa curiosa: quando retratados próximos ao seu habitat ou como proletários, a aura de salvadores de uma nação, seja no olhar, no sorriso, teimam em não escapar dos retratos. Principalmente Che, que, em todas as fotos, aparece com o mesmo olhar distante da foto que o tornou um símbolo.

É a foto de Roberto Salas, La Señora e a Bandera, que é talvez a que mais marca a ousadia da luta cubana ao mostrar uma bandeira do Movimento Revolucionário de 26 de julho hasteada no alto da Estátua da Liberdade. Já Oswaldo Salas completa esta visão dando um panorama impressionante: o coletivo. Fotos como Playa de Girón (61) e Santiago de Cuba (64) exploram a eficiência dos discursos e figura de Fidel ao nos depararmos com uma praça repleta de pessoas vista de um ângulo igualmente impressionante e, na outra, Fidel ao microfone, com uma forte expressão e céu sombrio ao fundo.

Por fim, cada um dos fotógrafos destaca uma visão do que foi a revolução e conseguem se diferenciar e imprimir sua personalidade dentro da mesma temática. O que temos ao final é uma bela amostra de muitas facetas do sonho cubano perdido. O preto e branco confere um quê saudosista especial a elas. No final, nem é tanto a técnica fotográfica que vale, já que as câmeras fotográficas da época eram muito limitadas. Mas um sentimento coletivo que não se esvai em nenhuma delas.

Para ir além
Galeria Senac Lapa Scipião
Rua Scipião, nš 67
Tel.: 11 3866-2500

Marília Almeida
7/8/2006 às 08h25

 

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