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Segunda-feira, 13/12/2004
A política como cinema: Lula lá
Lucas Rodrigues Pires
+ de 3600 Acessos

Dois anos depois de eleito presidente, chegam aos cinemas dois documentários sobre Lula, um diretamente inspirado no candidato, outro indiretamente, voltado ao tempo das greves em que Lula surgiu no cenário nacional. O primeiro é Entreatos, de João Moreira Salles, o outro Peões, de Eduardo Coutinho. Ambos distintos em suas propostas, em sua linguagem, em seu intuito, ambos com a presença ou sombra do mesmo personagem.

Assisti aos filmes um seguido do outro. Saí da segunda sessão exausto, overdose de Lula (Entreatos) que cansou minha visão. Lula é uma figura emblemática, carismática e capaz de gerar os mais diversos sentimentos. Quem simpatiza com ele vai ver em Entreatos mais uma razão para admirá-lo, quem não vai com sua cara barbuda encontrará resquícios para criticá-lo a exaustão - os "s" comidos quando fala, o fato de gostar de beber etc. Mas antes de ser um filme sobre os bastidores do último mês de campanha de Lula à presidência - a proposta do filme nasceu da idéia de registrar sem censuras o candidato do PT em todos seus momentos durante o último mês de campanha (Lula anuiu e João Salles, como relata em narração off no início do filme, teve total liberdade para filmar, editar, não tendo inclusive o presidente visto o filme antes de chegar aos cinemas) - Entreatos se parece mais com um tratado sobre a política no Brasil.

O grande lance do filme - e também de seu protagonista - reside em mostrar o que é a política hoje. Salles mostra o que todos nós sabemos - que política é no fundo um jogo de encenação - pela prática. Vemos Lula lendo discursos pelo teleprompter, vemos Duda Mendonça e Aluisio Mercadante discutindo quais os temas que o candidato deveria enfatizar em tal discurso, qual palavra não deveria ser dita, vemos comentários e a repercussão de entrevistas de grandes empresários e de adversários políticos no centro nervoso da campanha Lula e, o que me surpreendeu, o acompanhamento em tempo real do debate entre Lula e Serra por pessoas que comentam o que estão achando e a equipe de Lula passa quase que instantaneamente as instruções do que vai bem e do que não está funcionando para a cúpula transmitir ao próprio candidato no estúdio em que se gravava. A política, tal qual a ficção, é um palco em que figurantes fazem a cena. Mudam-se apenas os nomes. Num são atores, noutro, políticos.

Ironia da situação, João Moreira Salles faz um cinema-verdade (o documentário, intenção de obter a realidade), busca uma realidade máxima que é, ao fim das contas, uma grande ficção. Filma com formato de realidade o que é encenação. Lula é um grande ator, cumpre seu papel com maestria e saímos da exibição com a sensação de que só ele seria capaz de governar este país. De fato, em termos de expressão nacional, como o próprio então candidato afirmou num dos vôos entre comícios, ele é a única liderança nacional. Não há alguém com o carisma e reconhecimento que Lula tem junto ao povo. Mas parece fato também que o homem privado há tempos não existe mais. Cedeu espaço ao homem-show, ao homem-mídia, ao homem público, ao homem-político, adaptado conforme seu tempo e eleitorado exigem. Luis Inácio da Silva morreu. Persiste apenas Lula. Mas um Lula transformado pelo tempo, pela experiência, pelos cabelos brancos e barba rala, pelos ternos de linho e gravatas de seda.

Um tanto longo e cansativo, Entreatos tem momentos de grande interesse histórico e de descontração, como aquele em que Lula, quando se preparavam para gravar um discurso para a TV de Belém, pega o telefone e finge falar com o presidente argentino como se este quisesse Luis Favre (marido de Marta Suplicy) de volta. Ou então quando Salles entrevista o rapaz porto-alegrense que perdera o vôo de Florianópolis-Porto Alegre, mas, depois de cumprimentar Lula no aeroporto, acabou "encaixado" por Lula em sua comitiva que se dirigia à capital gaúcha. É interessante ver também toda a patota de Lula que hoje governa o país: o sempre desconfiado Zé Dirceu, que não gostou da câmera de Salles, o tímido Palocci, hoje o homem forte de Lula, Graziano, José Alencar (responsável pela cena mais interessante do filme junto a Lula e Palocci, quando discutem futebol durante um dos vôos), Gushiken, Duda Mendonça, com seu brinquinho horroroso, Mercadante, o cérebro da turma, e em menor aparição os Suplicys.

Já o documentário de Coutinho, de nome Peões, tem outra proposta. Se em Entreatos a câmera se punha a espiar, a invadir, a registrar momentos como se ali não estivesse (como um Big Brother), Peões faz dela sua razão: Coutinho tira dos personagens depoimentos, eles sabem que estão ali para serem registrados. Em sua simplicidade de filmagens e trabalho - basicamente essas entrevistas filmadas - Coutinho produz história e não apenas cinema. Alias, cinema é o que menos se tem em seus filmes. Desde Cabra Marcado para Morrer, o documentarista reconta em imagens faladas histórias e, assim, vai reconstruindo a História recente do país. Falar das greves de 79 a 81 no ABC paulista é, sem dúvida, entrar no tema da ditadura militar, da migração nordestina, do conflito de classes e ideológico que marcou os anos 70. Peões, indiretamente, trata de tudo isso e mais um pouco. É um filme, antes de tudo, sobre o ser humano, sobre seres humanos que sofreram e lutaram, em determinada época de suas vidas, contra algo que acreditavam injusto e amoral. Lula foi o epicentro desse movimento, o pavio aceso que levou ao engajamento. Metalúrgicos que fizeram parte das greves - anônimos, como está escrito na apresentação do filme - são entrevistados por Coutinho. O diretor vai ao Ceará conversar com alguns que, depois do movimento, por motivos diversos e distintos, voltaram à terra natal. A maioria dos operários do ABC era nordestinos, atraídos pelo pujante crescimento econômico que se dera nos anos 70 com a indústria automobilística e a expansão da rede rodoviária. Trechos de vidas são remontadas num mosaico tão plural mas ao mesmo tempo tão homogêneo. Cada vida é diferente da outra, retalhos de tecidos guardados que no final darão uma bela colcha.

Há entrevistas tocantes pela simplicidade dos personagens, como a da servente do sindicato (foto abaixo) que se orgulha e chega a chorar quando recorda que salvou o filme Linha de Montagem de ser preso pela polícia. Ela chega a dizer que aquilo era importante porque "era a única história que nós tínhamos". De fato, Coutinho utiliza diversas imagens deste filme e de ABC da Greve, de Leon Hirszman.

Na entrevista final, com Geraldo, soldador desempregado que participou do movimento, este explica o que vinha a ser peão. "Peão é aquele que bate cartão, que veste uniforme". Depois de um longo silêncio, em que a câmera permanece firme no rosto de Geraldo, ele pergunta ao diretor se ele já tinha sido peão. A resposta é rápida e simples: "Não". Escurece a tela e fim do filme. Talvez Geraldo não tenha dado a idéia exata de peão. Peão talvez seja o empregado, aquele que é subordinado, que trabalha horas e horas e ainda consegue chegar em casa e sorrir. Também aquele desempregado, que luta, luta e nada no final do dia. São todos peões, fora do âmbito de poder. E, diante disso, talvez Coutinho também esteja errado. Ele é, assim com Geraldo, um peão. Peão do Brasil, de sua história, de suas imagens.


Lucas Rodrigues Pires
São Paulo, 13/12/2004

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