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Quinta-feira, 29/1/2004 Todos Os Dias Da Semana, de Angela D. de Menezes Ricardo de Mattos O volume é formado por sete contos, cada um dedicado ao dia da semana que lhe serve de título. Orelhas e resenhas bem recomendam-no, mas enfrentá-lo diminui as expectativas de encontrar algo realmente bom para ler. Apresentados como contos humorísticos, trazem o humor grotesco encontrável em alguns livros de Voltaire, apelativo em conformidade a algumas passagens de Swift, mas todos sem um fundo que os ampare. Não sem algum favor foi feita a comparação. São meros exercícios, provocam mais indiferença que risadas ou melhora de disposição. O papel pode não suster a hilaridade momentânea de algumas situações do cotidiano. Também receio que a autora tenha querido mostrar-se muito à vontade. Por vezes lembra uma pessoa desejosa de afectar familiaridade e logo na primeira visita a nossa casa já descalça os sapatos e coloca os pés sobre o sofá. Incluo-me entre as pessoas que sabem ouvir e com gosto cultivo esta virtude entre as minhas poucas. Busco portar-me como um padre confessor. Entretanto, se em vez de ler eu ouvisse alguém contando as estórias do volume, fatalmente exigiria: "Fala logo"! A escritora estende-se em demasia ao expor um caso de comicidade duvidosa. No conto de Sexta-feira, acrescenta dados demais acerca da insanidade da personagem. Começa com graça, mas perde-se. O conto de Quarta-feira, além de não ter graça, tem o enredo forçado. Lógica, verossimilhança, preocupações com o realismo, são elementos relaxados em textos cómicos, cedendo por vezes lugar ao absurdo. Apesar disso não devem ser totalmente desprezados justamente para mostrar o engenho do escritor ao equilibrá-los. Os patamares são elevados e deles não descerei: em Dom Quixote, muitas cenas são engraçadas, mas o hilário é sustentado pela lógica quando mostra ser o absurdo e a incompatibilidade frutos da mente exaltada do fidalgo. É impossível um homem adulto ser engolido inteiro n'uma só bocada por um crocodilo, por maior que seja, e dentro do réptil continuar vivo e falante. Dostoievski inicia uma breve sátira com este mote. Em síntese, ou mostra-se a realidade de uma forma hilariante - daí, na televisão, o mérito de certas comédias de situação -, ou recorre-se ao fantástico para comunicar de maneira divertida alguma ideia. Não é o caso dos textos de Todos Os Dias Da Semana. Sábado e Segunda-feira foram os dias escolhidos para o "humor negro". Tenho para mim que esta variante surge bem ao acaso de algumas situações narradas inicialmente para chocar, o paroxismo da desgraça despertando a risada constrangida. Exemplo disso encontro em Crime e Castigo quando a viúva Marmeliedova, já ensandecida, manda seus filhos dançarem na calçada para obter alguns tostões. Se bem lembro, ao descrever o ridículo da cena Dostoievski coloca entre os circundantes tanto pessoas consternadas com a cena, quanto pessoas rindo. Todos Os Dias Da Semana não tem tal altitude. Com mínimo gasto de letras e obtenção máxima de comicidade, recomendo Crimes Exemplares, do hispano-mexicano max Aub. No conto de sábado, a escritora tentou criar um personagem de tripla personalidade. Revolta da criatura contra a criadora, aquela manteve-se firme com apenas duas. Para ir além Ricardo de Mattos |
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