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Segunda-feira, 27/3/2006
Hotmail versus Gmail: nem um, nem outro
Daniela Castilho

Já faz alguns dias que meu editor, o Julio, vem me provocando e me mandando e-mails com links que falam sobre serviços gratuitos de internet. Um pouco mais que isso, o Julio não se conforma de eu não ser fã de carteirinha do Gmail e preferir usar meu bom e velho Hotmail. Eu confesso que respondi com uma certa impaciência aos e-mails do Julio - eu ando um tanto quanto sobrecarregada de trabalho - mas resolvi explicar, detalhe por detalhe, porque para mim, no fundo, não faz a menor diferença se eu uso Gmail ou Hotmail: a verdade é que eu não uso nenhum dos dois. Eu fujo de serviços gratuitos com verdadeiro horror. Eles não são nem um pouco confiáveis.

Se você entrar no meu site pessoal verá que existe um link por lá, não muito evidente, de "fale com a Dani". Verá também que esse link leva à minha conta de e-mail do Hotmail. Como eu também tenho Orkut, eu tenho uma conta de e-mail no Gmail - conta essa que só ativei no dia que o Orkut impôs isso para mim, dizendo "ou abre conta no Gmail, ou caia fora do Orkut". Ok, então eu tenho uma conta de e-mail no Gmail. Confesso que também tenho uma conta de e-mail no Yahoo - assim como um perfil, para me associar aos grupos do Yahoo, mas, novamente, eu não uso. Uso apenas o perfil, para me associar a grupos. Meu e-mail de visibilidade no meu perfil do Yahoo é um e-mail do Hotmail. Meu e-mail secreto de contato, um e-mail ligado ao meu nome de domínio.

Agora vou contar uma historinha ilustrativa. Eu tenho dois perfis no Yahoo. Um deles criado em 2001, e o outro, em 1995. O perfil de 1995 eu criei quando fiz uma página gratuita na Geocities. Usei durante muitos anos, e a página até hoje está no ar. Quando o Yahoo comprou a Geocities, mudou meu nome de usuário e minha senha. Eu tenho essa senha guardada em um caderno - caderno de papel, porque eu não confio em armazenar nada apenas em bits & bytes - e recentemente tentei usar meu nome de usuário e senha para alterar um dado nessa página hospedada na Geocities. A senha, por alguma razão que só o Yahoo conhece, não é mais válida. O e-mail associado a essa conta, por razões que só o serviço gratuito dono desse e-mail conhece, deixou de existir. Tentei todos os métodos oferecidos pelo Yahoo para recuperar ou criar uma nova senha, mudar o e-mail, qualquer coisa que me permitisse acessar a Geocities. Nada funcionou. Moral da história: eu tenho uma página pessoal na Geocities que ocupa a posição número um do ranking do Google quando faço pesquisa pelo meu nome, onde só tem arquivos velhos, diz que eu ainda sou casada, tem fotos de mais de dez anos atrás e ainda um link para a empresa que eu possuía até dois anos atrás. Não tenho como recuperar a senha, não tenho como atualizar as informações da página.

Esse tipo de "catástrofe digital" não é nem um pouco incomum, pois acontece com muito mais freqüência do que se pensa. Computador é computador, não importa se está na sua casa, no seu trabalho, ou em outro país. Os computadores são máquinas que fazem apenas aquilo que você mandar. Não é muito melhor do que uma lavadora de roupas ou um liquidificador sofisticados. Computadores, como quaisquer outras máquinas, se desgastam e param de funcionar. O computador jamais fará o que não está programado para fazer. Trabalhar com computadores e querer preservar seus dados - e suas horas de trabalho - requer um procedimento de segurança chamado back-up. A menos, claro, que você não se importe de perder contratos, contatos importantes e, no final das contas, perder dinheiro.

No caso de serviços on-line gratuitos, o controle da integridade desses dados não está na sua mão. Assim como o controle da segurança de quem acessa esses dados também não está nas suas mãos. Está nas mãos de pessoas que você nem imagina quem sejam - o que incluem funcionários explorados por maus patrões que podem decidir deletar todos os hard drives da empresa onde trabalham ao serem demitidos. Da noite para o dia - kaput! - aqueles dois Gigas de e-mails da sua conta de e-mail ou o seu perfil de usuário em um serviço ou sua página hospedada em um servidor remoto vão para o irrecuperável void dos dados deletados. E não tem como você recuperar.

Só para ser justa, devo admitir que já perdi dados em servidores que eu pago. O meu blog já foi para o espaço duas vezes no passado. É por isso que eu mantenho back-ups atualizados do meu site, é por isso que eu carrego o meu e-mail pessoal através de servidor POP para o meu computador local. Se explodir o servidor texano que eu uso para hospedar meu domínio, eu só preciso transferir o domínio para outro servidor e instalar novamente meu site. Eu faço back-up até mesmo os filtros de spam que eu uso.

Agora, questões mais delicadas e complexas. E a segurança? Há uns três anos, eu tive o desprazer de ganhar um stalker de presente. Um stalker é alguém que é um fã obsessivo da sua pessoa. No meu caso, esse fã veio através de um fórum de jogos eletrônicos. Ele colecionada os add-nos que eu fazia para um jogo de simulação e se declarou meu fã, tecendo elogios à minha pessoa. Eu não acredito em "amizades virtuais". Eu tenho como procedimento padrão procurar conhecer pessoalmente quem eu conheço através da internet, em locais públicos e seguros, durante o dia. Assim, o pessoal do fórum trocava fotos, fazíamos encontros e reuniões, criávamos amizades reais e não apenas virtuais. O meu stalker, entretanto, vivia em outro estado. Não tinha como participar dos encontros.

Um belo domingo, meu telefone tocou. Era ele, o stalker. Ele tinha descoberto meu telefone através da internet, procurando a empresa que eu possuía, olhando o site e pegando o telefone. Durante quase 4 meses ele me telefonou, primeiro de quinze em quinze dias, depois semanalmente, depois diariamente. Começou a tentar descobrir mais coisas a meu respeito. Eu só me livrei do cara porque eu conheço bem como funciona a internet.

Uns três meses depois que o stalker colou em mim, tínhamos decidido promover uma festa fechada com o pessoal do fórum. O stalker, como em vezes anteriores, disse que iria à festa - e, claro, não apareceu. Só que desta vez existia uma necessidade: dar nome, sobrenome, endereço completo, RG e CPF para poder entrar na festa. Eu até hoje não sei por que ele deu os dados reais dele, mas ele deu. Usando esses dados, em menos de meia hora eu levantei todo o histórico da vida dele pela internet. Descobri as escolas onde estudou, o bairro onde morava - ele mentiu sobre isso - eu até mesmo vi o local da casa dele através de foto por satélite. Facilmente eu localizei pessoas relacionadas a ele, amigos, colegas de trabalho, tudo. E aí o stalker se apavorou e saiu deletando suas contas de ICQ, de e-mail, do Yahoo, tudo que ele pôde rapidamente excluir para tentar deter o meu rastreamento. Não foi bem sucedido. Meses depois eu o localizei no Orkut e encontrei o novo blog dele. Quem acabou virando stalker dele fui eu. Serviu ao propósito: o cara parou de me mandar e-mail, de telefonar, ele sumiu. Mudei meu número de telefone e fim de história.

Não acredite quando disserem que suas informações pessoais são confidenciais. A maioria delas não é. Achar uma pessoa e descobrir informações sobre ela é muito mais fácil do que se imagina. Basta essa pessoa ter alguma coisa no nome dela, um telefone, por exemplo, ou uma matrícula de faculdade. Se você tiver o nome e o sobrenome da pessoa, é o que basta para localizá-la em dois minutos, saber o que tem feito, onde mora, onde estuda, onde trabalha, se casou ou não, se tem algum processo jurídico. Se usar o cache do Google, então, em menos de quinze segundos você localiza todo tipo de informação.

Agora imagine confiar uma grande quantidade de informações pessoais ou importantes a um serviço gratuito. Você já se perguntou por que um determinado serviço é gratuito? Se você não está pagando a conta, pode acreditar que alguém está. Não existe nada de graça no mundo, alguém sempre paga a conta. Agora imagine aquele seu e-mail gratuito que você usa para trocar mensagens pessoais e que você, feliz da vida, deixa armazenado no servidor do provedor que te deu esse presente. Imagine agora o provedor montando uma base de dados com informações que você voluntariamente deu para ele e vendendo isso para alguém. Imagine que você, em meio aos seus e-mails, enviou ou recebeu alguma informação realmente valiosa para você ou realmente confidencial. Em qualquer provedor o operador de sistema pode ter acesso instantâneo a essa mensagem sem nem precisar saber sua senha. O operador é o que se chama de "superusuário", ele tem acesso a todo o conteúdo do que estiver no computador dele. E você sabe quem é essa pessoa? Não, você não sabe. Em serviço pago, ao menos, o usuário tem o nome completo do dono do serviço, seu telefone, endereço completo e um contrato comercial. Em caso de problema realmente sério, pode até mesmo colocar o caso na justiça. Em serviço gratuito ninguém sabe nada. É uma caixinha de surpresas.

É por isso que, para mim, entre o Gmail e o Hotmail, tanto faz. Eu uso mesmo é o meu e-mail pessoal, no meu nome de domínio, em servidor que eu pago e com quem tenho um contrato que incluem cláusulas de integridade de dados e segurança de informações.

Nota do Editor
DaniCast é diretora de arte e assina o blog MadTeaParty.

Daniela Castilho
São Paulo, 27/3/2006

 

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