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Quarta-feira, 7/6/2006
Poesia para os ouvidos e futebol de perebas
Ana Elisa Ribeiro

Os grandes poetas brasileiros nem sempre foram reconhecidos em vida. Embora alguns casos sejam memoráveis, na maioria das vezes autor e obra ficam para a garimpagem de gerações futuras. Talvez esse panorama tenha sido modificado pela difusão da informação por meio de várias mídias. Certamente, a invenção do rádio e da televisão acelerou a chegada de acontecimentos que demorariam a ser noticiados em épocas anteriores e, assim, também possa ter ajudado a divulgar a obra de escritores em vida, numa espécie de transmissão on-line. E ainda bem que é assim.

A internet também faz parte dessas possibilidades. Na atualidade, é razoavelmente fácil encontrar um escritor vagando pelas listas de discussão virtuais. E foi pela Internet que tive contato com Mônica de Aquino, ou melhor, com alguns de seus textos. Depois, pude conhecê-la pessoalmente em uma das edições do Salão do Livro, em Belo Horizonte. Agora, tenho em mãos o primeiro livro da autora.

Não sei exatamente como, mas quando se encontra poesia há um clique diferente. Não são apenas palavras amontoadas ou imagens empilhadas por metáforas. Não são sentidos distraídos de suas formas e nem as formas fazendo contas entre si. Quando é poesia, há preocupação com a linguagem. Ao mesmo tempo que há domínio, há a língua pregando peças num autor que se finge de desligado. Assim é com Mônica de Aquino.

A poeta nasceu em Belo Horizonte no último ano da década de 1970. A geração dos vinte e poucos anos acontece em forma de livros, e não apenas Mônica. O livro de estréia, Sístole, pela editora Bem-te-vi, do Rio de Janeiro, traz 35 poemas divididos nas partes "Ponto-cego", "Extra-sístole", "Fibrilação" e "Refluxo". Em cada uma delas, a poeta mostra a que veio com versos sensíveis e, principalmente, domados pela música. Neste caso, não a música do ritmo ou, necessariamente, da rima, mas a preocupação bastante evidente com o som, a combinação de palavras, a repetição de sílabas, como neste trecho quase Cruz e Sousa: "vagas no plágio/ do teu gosto/ plagas de areia/ búzio surdo -/ sumo -/ fresta (ferida)/ fundida/ em teu fogo-fátuo".

Mônica de Aquino não deixa de passear pela concisão, mas parece preferir toadas mais longas e vagas, assim como se deixasse o leitor com a sensação de navegar um mar calmo. Em alguns casos, soa leve, mas sem deixar de fazer sua incursão pela descrição poética de uma imagem. Em outros momentos, aparece com uma espécie de auto-retrato: "O que alcanço/ agarro./ E o excesso é cansaço/ mas sigo cega e não paro". Mais adiante, Mônica sugere uma brincadeira distraída com fonemas e planeja florações e amores distraídos. Basicamente, a poesia da autora é feita de silêncios e sensibilidade. Não se pode dizer que seja completamente madura. Também não se pode omitir que alguns textos precisassem de umas aparas em determinados trechos excessivamente assonantes ou em aliterações alongadíssimas. No entanto, neste primeiro livro, a poeta nasce forte e apaixonada. Resta preocupar-se mais com a linguagem exata, daquela que deixa no leitor a sensação de que não poderia ter sido de outro jeito.

Pelada Poética

Uma semana antes da Copa do Mundo, os poetas da capital mineira foram convocados para uma pelada no meio da rua. E olha que a rua era movimentada. O jogão aconteceu no meio da Savassi, nosso coração comercial mais bonito. Estávamos lá 22 escritores e seus textos sobre futebol. Parece piada? Parece, porque eu não sei nada sobre o riscado. Mas até que entendo de outros jogos, então dei a minha contribuição. Estão aqui a foto em que eu e Reinaldo batíamos uma bola e o texto que li lá. E é gol!

Tática para o seu time fazer gol no meu

meu quarto-zagueiro
mineiro
maneiro

deixa a defesa
e vem pro ataque

não dá moleza
banca o craque

faz um charme
toca a bola pelo meio

centro-avante
atirado, sem floreio

tá na minha área
com a canhota
nem me importa

bate firme
não me solta
nem relaxa

toca forte
e entra rasteiro

mira a rede
gol de placa
sem goleiro

Para ir além





Ana Elisa Ribeiro
Belo Horizonte, 7/6/2006

 

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