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Quinta-feira, 29/6/2006
Mentiras diplomáticas 1: a Copa do Mundo é nossa
Marcelo Maroldi

Quando eu era pequeno, as copas tinham mais graça para mim. Hoje, já não sinto aquela agitação, aquela alegria quando ela se aproxima, aquela euforia toda. As copas perderam a importância com o passar do tempo e acredito que eu até saiba por que isso ocorreu.

Em primeiro lugar, quando se é criança (ou vagabundo), é possível assistir a todos os jogos da Copa. Você fica lá, jogado no sofá, tomando suco, acompanha até os jogos menos relevantes, assiste às entrevistas, etc., mas depois que você se torna um adulto é raro conseguir fazer isso, e a Copa passa a ser só mais um motivo para você sair mais cedo do trabalho ou mesmo faltar. Aliás, na Holanda o número de pessoas "doentes" que faltam ao trabalho nos meses de Copa do Mundo cresce em torno de 20%. Curioso isso, não? Bem, voltando ao assunto. Quando eu não tinha que me preocupar com nada que não fosse assistir aos jogos, preencher minhas tabelas e álbuns da Copa, eu apreciava mais esse grande evento esportivo. Depois percebi que tenho coisas mais importantes a fazer.

Segundo, quando você começa a entender o que acontece, vai vendo os jogadores não são os "ídolos" que cremos que eles são quando somos crianças. Uns são mulherengos, outros batem na esposa, vários são grandes adeptos do álcool (e mesmo do cigarro e drogas), fazem filhos feito loucos, aprontam em discotecas, brigam, dirigem seus carrões como uns imbecis nas estradas (quando não estão embriagados), sonegam impostos, falsificam documentos, tudo isso. Eles não são aqueles exemplos que tanto buscamos, pelo menos a grande maioria deles não o é (felizmente, nessa atual seleção temos alguns "mocinhos bons"). E, o pior, ganham salários elevados. Antigamente, mesmo os jogadores "de nível" não ganhavam tanto. Não é raro encontrarmos relatos de jogadores do passado que morreram na miséria ou da realização de "jogos-festa" para arrecadar fundos para um ex-atleta com problemas para sobreviver. Mas, agora, qualquer jogador da seleção ganha uma fortuna para correr atrás da bola. Não julgo se é merecido ou não, não me interessa, mas, mesmo o jogador mais "barato" de nossa seleção (que acredito que nesta Copa seja o Mineiro do São Paulo), ganha algo muitas e muitas vezes superior ao salário mínimo. Na verdade, ganham em 1 mês o que 99% da nossa população miserável não ganhará em 1 ano todinho (ou mesmo em 10). Isso me desestimulou um pouco. Sim, mas eles nos dão alegrias, você pode dizer. Mas, é uma alegria tão efêmera que eu tenho minhas dúvidas se vale mesmo a pena. Pergunte a um trabalhador brasileiro se ele prefere ser campeão mundial de futebol com a sua seleção nacional ou se prefere um aumento de salário!

Terceiro, o futebol desta Copa está muito desestimulante. Como em 94, o Brasil poderá se tornar o campeão do mundo, mas, será que vai ter graça? Em 94 foi sem graça, todo mundo se lembra. Este ano está caminhando para a mesma coisa, um futebol feio, magro, de resultado, sem emoção, sem nada. Cadê o melhor time de futebol do mundo? Eu quero me divertir assistindo à Copa e não apenas comemorar o título! Eu quero ver alegria, ver belas jogadas, muitos gols, mesmo que isso venha de nossa maior rival, Argentina. Eu não quero o título pelo título, quero entretenimento e, não, chatice. Grande culpado por essa chatice que acontece é nosso estimado técnico Parreira, que, embora se intitule um grande conhecedor de futebol, não passa de um boboca que não consegue fazer seu time jogar. E o time não jogando, o nó fica preso na garganta, o gol não acontece, os fogos são guardados para o próximo jogo. Assistir à Copa está quase sempre muito chato. O campeonato brasileiro é muito mais emocionante, não resta dúvida.

Por fim, quero destacar a cobertura televisiva da Copa do Mundo 2006. Os canais particulares, claro, dão um banho nas televisões abertas. Evidente, estas nem podem transmitir os jogos por conta do monopólio da Rede Globo, como fariam boas coberturas? Mas, ainda assim, praticamente todas elas têm jornalistas cobrindo os jogos (na Alemanha ou não), e, pior, insistem em produzir umas matérias muito chatas e com o objetivo explícito de "tapar buraco" na grade de programação. Não há uma única que não vá cobrir as embaixadas e mostrar os estrangeiros comemorando os jogos de sua equipe, ou mostrando os parentes dos jogadores, essas coisas sem importância. Isso, sim, é a coisa mais ridícula da Copa do Mundo: mostrar parentes dos jogadores assistindo o jogo ou idiotices feito esta. A Globo, por exemplo, mostra a mãe do "melhor do mundo", Ronaldinho Gaúcho, fazendo comida enquanto espera o jogo. Tenha santa paciência! Benditos sejam SporTV e ESPN Brasil que existem para nos permitir esquecer do Galvão Bueno e da sua arrogância - e ignorância futebolística - exagerada(s). E ainda assim a cobertura da Copa cansa. Ou é jogo sendo mostrado, ou é mesa-redonda debatendo os jogos, ou se desliga a televisão e vai pegar um livro (que não seja de futebol e nem de Copa. Mas, se quiser pegar um sobre o assunto, recomendo Como Eles Roubaram O Jogo - Segredos Dos Subterrâneos Da Fifa).

E sobre os jogos do Brasil especificamente, não generalizo (mas observo) e o que eu vejo é uma oportunidade que as pessoas encontram para beberem mais caipirinhas, esquecerem de seus problemas cotidianos e, muitas vezes, paquerar, pelo menos é assim nas comemorações em cidades pequenas, onde a festa do jogo é quase como um carnaval, e não importa o placar do jogo. É uma versão moderna e controversa da política do pão e circo, ou o que o regime militar fez na Copa de 70, só que esta versão somos nós mesmos que a conduzimos e nem reparamos nisso. Por sorte, a Copa só acontece de 4 em 4 anos e eu posso esquecer que, sempre nesses períodos, o brasileiro típico comemora algo que não vale nada enquanto deixa o que de fato importa para escanteio. Por isso, às vezes me questiono: a Copa do Mundo é nossa mesmo?

Marcelo Maroldi
São Carlos, 29/6/2006

 

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