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Segunda-feira, 2/4/2007
Sexo Social
Ram Rajagopal

O artigo a seguir é uma republicaçào do que já foi apresentado no blogue Cataplum. Você pode se perguntar porque faço isso... Ora, simples, porque adoro este texto. O que ele tem de novo? Nada. Exceto que, com muita sinceridade, desmistifica a "razão" porque temos tanto tesão...

Acho que nunca escrevi sobre sexo, assunto universal ao menos para uma parte dos crentes. Não é porque não penso em sexo, penso como todo homo sapiens que tem uma pitada de sapiens. É mais mesmo porque sexo é o assunto mais discutido, mais falado e, francamente, mais desgastado dos nossos dias. Com a internet então, não precisamos nem mais ter a vergonha de passar na banca de jornal e comprar uma Dicas de sexo ou, senão, a última IstoÉ sobre "Revolução sexual e as posições mais gostosas". O assunto sexo aparece a todo instante. Basta passar dez minutos, com amigos em um café, que o tema sexo surge de uma forma ou de outra. Seja para teorizar a razão da beleza de alguém, ou senão para discutir as vantagens e desvantagens de um relacionamento de longa distância num casamento. O tal sapiens é definitivamente um animal sexual.

Uma das coisas que sempre me surpreendeu sobre sexualidade é a influência dos hormônios na capacidade de uma pessoa pensar com coerência. Sob pressão hormonal, até a mais reflexiva das pessoas se torna intempestiva e é capaz de fazer ou dizer qualquer coisa só para ter um orgasmo. Muitas vezes, depois, se lamenta com amigos e amigas no barzinho de toda a dor de cabeça por alguns minutos de prazer. Ainda assim, essa memória da dor é bem curta. Afinal, já nos acostumamos a pensar, já fomos catequizados que sexo não é mais um prazer, é, sim, o único prazer. Então é aí que eu queria chegar.

A propalada sociedade moderna em que vivemos é uma grande contradição. Vejam só, dispendemos horas incontáveis de nossos dias acumulando fama e salário, especialmente este último, azeitando roupas, economizando para um carro, para ter um apartamento, tudo em função de bancar aquele único prazer. Afinal, todas as outras coisas empalidecem frente ao sexo. Até reconhecimento, segundo os sábios modernos, tem um fundo sexual, a dominação de alguém por muitos, o reconhecimento do seu valor é nada mais nada menos que uma alavanca de status social, e que em última instância é mais uma porta para uma oportunidade sexual mais ampliada. Pois é, construimos uma vida em função do sexo, mantemos uma grande estrutura social e hierárquica para procriar e dar a todos a oportunidade de experimentar o que se convencionou ser o maior prazer da vida.

No entanto, com sinceridade, quantas horas nos dedicamos ao sexo propriamente dito? Quantas horas gastamos nos preparando fisicamente para o maior prazer humano? Quanto tempo limpando os escombros mentais (porque a pior coisa do mundo é ficar pensando ou imaginando enquanto se transa)? Quase nada (é a resposta). É ou não uma contradição? Não só não gastamos tempo algum, como também, aos poucos, esquecemos de como explorar e conhecer nosso próprio organismo. Não só sexualmente, mas em todas as dimensões. Conheço muitas pessoas que, até hoje, não sabem por que seu organismo reage de determinada maneira a determinados alimentos ou emoções. Isso para mim já foi motivação o suficiente para fazer cursos, consultas médicas, e ler bastante, até ter uma compreensão mínima do meu corpo...

Mas, na sociedade moderna, o que se vende é que não há tempo para isso. O sexo perfeito, o amor perfeito, a fama e o reconhecimento podem ser gozados com perfeição, bastando para isso se dedicar feito uma máquina aos princípios da sociedade, da vida social. Basta obedecer, e imaginar metas e objetivos, traçar uma reta ascendente, que todo o resto se consolida. Dispender tempo com outras coisas é errado, é motivo para sentir culpa e frustração. Quando as pessoas descobrem que não é bem assim, que o sexo é frustrante porque não têm tempo o suficiente para se dedicar a ele - ao ato ou ao corpo -, então passamos a comprar ilusões. Entramos na época das imagens. Miramos no corpo de nosso amante, e vislumbramos as cenas de sexo do cinema, a boca de uma atriz, tudo com o objetivo de apaziguar nossa mente. Porque o prazer máximo do sexo é aquele minuto de silêncio mental do orgasmo, em que toda a nossa bagagem, todos pesos, culpas, "nóias", desejos infrutíferos, frustrações, desaparecem. Mas para chegar lá, a mente tem que comprar a idéia...

E aí, o ciclo se fecha. Compramos imagens. Vivemos uma vida caótica, sexualmente alienada. E na hora daquilo que se vende como sendo o único prazer, mal conseguimos curtir o momento, doidos por aqueles minutos em que a mente se apaga. Imagino que, para o homem moderno, os minutos que antecedem a morte devam ser ainda mais prazerosos que o orgasmo. Aqueles minutos de silêncio sem questionamento, em que os decibéis do desejo desaparecem. Talvez, para o homem moderno, a morte seja bem melhor que o sexo.

P.S. - Muitas vezes a crueldade com o momento é tão grande que imaginamos parceiros diferentes, ao invés daquele que está ali, que momentos após uma das mais profundas trocas humanas, pensamos em como aquela experiência deixou a desejar, comparada a algum desejo interno ou à memória imperfeita de alguma experiência anterior. Pior ainda: ao invés de brincar, explorar, esquecer o mundo, mergulhamos ainda mais no mundo, resgatando toda nossa coleção de expectativas, e impondo-a àquele momento de felicidade. Ah, sim, como um post script, vale a pena dizer que Rafael Lima, do Na Cara do Gol, comentou que, na França, o orgasmo se denomina "a pequena morte"... Bom, não à toa, a França anda bastante decadente...

Ram Rajagopal
Berkeley, 2/4/2007

 

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