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Quarta-feira, 8/8/2007
Esqueçam o velho jornalismo
Tais Laporta

A web dividiu o jornalismo em duas categorias. A primeira insiste em sujar os dedos com tinta de jornal, reforçando o apego a um glamour do século XIX. Nela estão os conservadores das velhas redações - os mesmos que fazem campanha contra os blogueiros, "amadores que não merecem ser lidos", pensam, resmungam. Na segunda categoria estão os jornalistas do futuro (diplomados ou não), íntimos da tecnologia. Eles usam a união das mídias digitais a favor de quem estiver conectado. Esta geração high-tech está inventando um novo jornalismo: interativo, sem fronteiras métricas, sem barreiras trabalhistas, sem (necessariamente) diploma.

Os jornalistas da web devem roubar os assentos dos repórteres e editores artesanais - principalmente daqueles que resistem às noções mínimas de web writing. Nada mais natural que as velhas estrelas do jornalismo se sintam incomodadas com essa invasão. Mais ainda porque se recusam, com arrogância, a reinventar-se dentro da tecnologia, prestando um desserviço a si mesmas. Qual o interesse das futuras redações em contratar uma enciclopédia humana que mal sabe enviar um e-mail?

Jornalismo sem tecnologia está fadado a desaparecer. Não é sem motivo que até os impressos utilizam as ferramentas digitais para se manter. Quem resistir a essa revolução vai ter que se contentar em apertar os parafusos da notícia, ao contrário de quem investe, hoje, em mão-de-obra qualificada: a união do conteúdo com o domínio das ferramentas digitais. Leia-se, o conhecimento de recursos gráficos e diversas linguagens da web. Significa afirmar que o jornalismo do futuro passa longe, muito longe, das gráficas dos jornais. A nova linha de montagem da notícia são as oficinas virtuais, que unem texto, vídeo e som em uma mesma mídia.

Os resultados são infinitamente melhores e o leitor só tem a ganhar com o ambiente multimídia. Não há porquê resistir em nome de argumentos tão desinteressantes (tais como: "é preciso sentir o papel com as mãos"). Ora, quem prefere uma mídia estática, intransponível, quando podemos navegar junto a ela? Quem prefere a luz de velas à energia elétrica? O pombo-correio ao telefone? Só quem trabalha com velas e pombos insiste em lucrar com isso.

Velhos mitos - A web está derrubando crenças arcaicas da mídia convencional. Uma delas é a de que algumas pessoas - dotadas de uma "aura" especial - nasceram para informar, enquanto que outras, para receber a informação. Falácia que os blogs e sites informativos derrubaram. Com mais pessoas escrevendo, e um acesso mais democrático à notícia, amadores e profissionais constróem juntos o novo jornalismo. Acabou a fronteira nítida entre amador e profissional. Muita gente criativa, que escreve muito bem e que jamais teria a chance de ser publicada nas bancas, está realizando o sonho de ser lida, com um público fiel da internet, sem nunca ter pensado em se tornar jornalista. Existe oferta e demanda a um custo zero, ou, pelo menos, bem mais em conta que a produção e distribuição dos impressos.

Novas disciplinas - Por falar nisso, as faculdades de jornalismo ainda não perceberam a importância de se introduzir novas (e urgentes) disciplinas em sua grade. Exatamente como quando a taquigrafia parecia algo útil, já passou da hora de eliminar velhas discussões em sala de aula, sobre imparcialidade e afins (que mais servem para "encher a lingüiça" dos cursos, do que ensinar alguma coisa), para assim reservar horas-aula de noções sobre um novo software gráfico, ferramentas de desktop publishing, por quê não?

Não que as faculdades façam mal em discutir teoria - jamais deixará de ser importante - mas, isoladamente, ela não passa de um mundo fantasioso, primitivo, desencontrado. O conteúdo é a matéria-prima da notícia, mas o que a transforma em produto é o aparato digital. Se as faculdades não perceberem a urgência em adaptar seus currículos às novas tecnologias, continuarão fabricando mais apertadores de parafusos, desorientados, chorando por uma vaga que não existe, num mercado imaginário.

Talento sem diploma - Existem pessoas realmente talentosas na web, fazendo jornalismo de primeira em diários on-line, sem imaginar que são jornalistas. São lidos e relidos, sem saber que esse privilégio era exclusivo, pouco tempo atrás, a poucos figurões da mídia antiga. Pessoas que nunca pisaram em uma faculdade de jornalismo estão produzindo conteúdo de qualidade, enquanto que uma massa de recém-formados disputa, aos pontapés, uma apertada vaga no que sobrou das (ex-grandes) redações de jornais e revistas.

Qual o valor em querer ter o nome publicado em uma grande folha de papel, ao invés da internet? Ser lido por um grande público? Estatisticamente, os maiores leitores dos jornais impressos de hoje são homens na terceira-idade, aposentados. Os mesmos que não acompanham a era da internet. E quando essa geração tiver ido embora? O apego ao tradicionalismo só atrasa conseqüências inevitáveis. Existe um mundo em expansão para quem quiser se aventurar por ele - e é o que estão fazendo pessoas com visão ampliada.

Até as melhores revistas e jornais impressos alimentam seus portais na internet, diariamente. A publicidade, ainda bem apegada às mídias tradicionais (haja vista o site NoMínimo, que oficialmente acabou por falta de patrocínio) também não perde o filão da internet. Outras alternativas também não faltam: os links patrocinados, as parcerias, e vários outros meios de produção de conteúdo gratuito e auto-sustentável. Mas, para isso, é preciso ser amigo, muito amigo, da tecnologia.

Para onde vai o jornalismo? - Só vejo duas respostas para a pergunta deste Especial. O jornalismo do futuro estará em qualquer lugar, a qualquer momento, em tempo real, pronto para servir a qualquer um que não estiver alheio à inclusão digital. Já o velho e o glamouroso jornalismo de papel vai amarelar. Em outras palavras, o destino do velho jornalismo é o museu, e que fique a cargo de seus curadores.

Tais Laporta
São Paulo, 8/8/2007

 

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