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Segunda-feira, 4/4/2011
Plágio
Daniel Bushatsky

O primeiro caso de plágio da história brasileira aconteceu em 1888. O quadro de Pedro Américo, O Grito do Ipiranga, que retrata a cena da Independência Brasileira é uma cópia quase idêntica de uma obra famosa de Jean-Louis Ernest Meissonier, o quadro 1807, Friedland, que celebra uma famosa vitória de Napoleão Bonaparte.

Não obstante o quadro de Pedro Américo não representar nem de perto os acontecimentos, que de glamorosos não tinham nada, pois o Brasil Colônia estava afundado em crises e o Príncipe Regente passava mal (intoxicação alimentar, provavelmente), ficou o triste registro de a primeira obra artística famosa brasileira, pós-independência, ser acusada de plágio.

Pedro Américo, no texto de apresentação da obra, na academia Real de Belas Artes de Florença, no dia 8 de abril de 1888, 66 anos depois da Independência, não citou possíveis semelhanças com a obra de Meissonier. Limitou-se a explicar as mudanças factuais, deixando claro que a pintura tinha uma intenção moral (e talvez de manipulação do povo, em minha opinião).

A acusação de plágio feita pelo jornalista Elcio Gaspari na edição da revista Veja de 15 de novembro de 1982 nunca ficou realmente provada. Isto porque, para a historiadora Claudia Valladão de Mattos, por exemplo, a obra que retrata Napoleão foi, somente, detalhadamente estudada por Pedro Américo.

Polêmica à parte, o fato é que para leigos a obra da Independência é plágio da vitória de Napoleão.

Como não estudamos história o suficiente na escola, a acusação de plágio contra o Brasil voltou a se repetir 122 anos depois, quando da apresentação do logotipo elaborado pela cidade do Rio de Janeiro para as Olimpíadas. As acusações vieram de todos os lados e, mais uma vez, o Brasil e os organizadores saíram pela tangente com argumentos pouco concretos e de amplo sentido, tais como: "inspirado", "lembra", "coincidência".

As palavras que possuem "todo" e "nenhum sentido" relembram o país que já nasceu com sua história alterada, por um possível plágio, sem que ninguém fizesse nada a respeito.

No caso da logomarca das Olimpíadas, o desenho se parece com dois já existentes: o da Telluride Foundation, no estado de Colorado, dedicada à filantropia e o quadro A dança, de Henri Matisse. Ou seja, a inspiração, lembrança e coincidência vieram de duas obras e não de uma só! Haja coincidência!

O que é uma pena nos casos de plágio (e, por favor, não estou dizendo que foi plágio os narrados acima) é a prepotência de achar que vai conseguir enganar organizadores e participantes quanto à originalidade de uma obra.

Quando o evento ainda é importante, como a Independência do Brasil ou as Olimpíadas no Rio de Janeiro, a ilicitude continua a mesma, mas a falta de noção e a vergonha para o Brasil aumentam em progressão geométrica.

Com um pouco de estudo, todos saberiam que cedo ou tarde os plágios são descobertos. Um país que nasceu, artisticamente falando, com uma cópia, poderia mostrar que 122 anos depois é todo original.

Se definir o que é plágio exige técnica e cuidado, pois inspiração não é crime, um pouco de bom senso também deve ser acrescentado à mistura. Ou seja, na dúvida, é cópia, e para o Brasil se destacar, o que menos precisamos é de dúvida.

Vale aqui um parêntese: segundo o dicionário eletrônico Houaiss, plágio é "apresentação feita por alguém, como de sua própria autoria, de trabalho, obra intelectual etc. produzido por outrem".

A título de comparação, a Bosch, empresa mundialmente famosa pelas várias áreas de atuação, passando de amortecedor para carro a fogão, em 2004 registrou 2.791 patentes. Para explicar, é patenteável a invenção que atenda aos requisitos de novidade, atividade inventiva e aplicação industrial.

Supõe-se, assim, que para a filosofia da Bosch, copiar é mais que uma vergonha. A empresa está orientada a sempre ser criativa.

Assim, aqui fica o recado: ou reforçamos as aulas de História ou as de Criatividade. Em ambos os casos o resultado será o aprendizado do que é plágio e a vergonha de se copiar obra feita por alguém como se fosse sua.

Mas o grande resultado mesmo seria tirar um pouco da prepotência de quem não só imita, como ainda acha que ninguém vai descobrir: casos de plágio estão toda hora na mídia.

Espero que daqui para frente "inspirado", "lembra", "coincidência" virem inspiração, esforço e criatividade.

Viva a descoberta! Viva a Bosch!

Daniel Bushatsky
São Paulo, 4/4/2011

 

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