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Terça-feira, 1/1/2002
Tem fim do mundo para todo mundo
Alexandre Ramos

Todos se lembram que em agosto de 1999 e, incompreensivelmente em menor escala no fim de 2000, havia por aí um papo de fim de mundo. Mas eis que termina o primeiro ano de um novo milênio, século e década e tudo vai como sempre. Isto é, mal. Mas continuam firmes os propósitos que estabeleci para o milênio em 1o de janeiro de 2001, a saber: pegar uma grana emprestada, ao juro que quiserem, para pagar lá por 2874, começar uma dieta rigorosa em todas as 47.952 segundas-feiras, e caminhar em passo acelerado 45 minutos por dia, cerca de 11.406 dias de caminhada nesse período, o que dá para fazer o trajeto Curitiba-Teresópolis 1141 vezes.

É verdade que há um dado preocupante. Segundo minhas próprias investigações (1), a última profecia de Nostradamus, em poder do Guardião Oculto da Suprema Confraria dos Sacripantas Místicos (mas disponível na banca da esquina), permite uma datação muito próxima do Fim dos Tempos:

Os Quatro Vendedores de Enciclopédias se levantarão nos cantos da terra, e se precipitarão sobre ti, e o teu tédio será mortal. Tu fugirás para o Norte, e o ACM estará lá. Irás para o Sul, e o Maluf chegará antes de ti. Ligarás a televisão, e verás o Ratinho em rede nacional. E isso ainda não será o fim, pois quando a carne estiver no fogo e o samba rolando, descobrirás que tem cerveja, sim, mas ESTÁ QUENTE.

Mas se o mundo não acabar, tenho também ambições mais elevadas além de diminuir a barriga. Vou fazer algo pela paz mundial. Vou jogar fora um plano de fazer inveja ao Cebolinha, que envolve um latão, uns litros de água, um pacote de corante e uma corda, e dar uma chance ao meu vizinho, um tipo assim, ahn, "exótico", que insiste em ouvir hinos militares na maior altura no meio da noite. Estou saindo de Curitiba e posso agüentar mais uns poucos dias, em nome do Espírito do Natal. Também estou aprendendo de cor a data do aniversário da minha noiva, que me ameaça com torturas babilônicas se depois de casado eu esquecer a efeméride.

Como volta e meia escrevo sobre assuntos católicos, ou a partir de uma perspectiva católica, com muita freqüência já disse que não gosto nem um pouco dos bettos & boffes da vida. Tenho inúmeros e solidíssimos motivos para isso e quero ver o bom de papo que vai me convencer do contrário. Mas foram poucas, muito poucas, as vezes que rezei por eles. Quero fazer isso daqui por diante, pelo menos com um pouco mais de freqüência e, espero, sinceridade.

E cada vez que eu fizer uma coisa dessas, o Colin Powell vai hesitar antes de mandar os marines para algum lugar, um palestino e um judeu vão se olhar sem ódio, um muçulmano vai reconhecer um irmão no rosto de um cristão, um político de Brasília vai fazer com que toda uma verba destinada às crianças pobres de algum canto do país chegue lá inteirinha, um terrorista vai desarmar a espoleta da bomba, os torcedores vão chamar o juiz no máximo de ladrão (mas menos do que isso nem eu admito), os motoristas do Rio de Janeiro vão ficar só um pouquinho acima do limite de velocidade, um médico abortista vai lembrar do juramento de Hipócrates, aqueles enormes baleeiros japoneses serão detidos pela coragem dos militantes do Greenpeace em seus botezinhos, um comunista vai duvidar de sua fé (quase) inabalável na inexistência de Deus, muitas (na verdade muitíssimas, mas estou pegando leve hoje) mulheres deixarão de reclamar por causa daquele objeto que está dois milímetros fora do lugar, todos os homens do planeta vão levantar o assento da privada antes de urinar, as velhas chatas darão uma folga, os homens de Wall Street vão lembrar que são humanos, os governos e guerrilheiros africanos vão deixar que a ajuda internacional chegue a quem precisa, um traficante vai pensar em seus filhos e nos dos outros e arrumar outro meio de ganhar a vida, e...

...se eu acredito que vai mesmo ser assim? Não, não desse jeito. Mas estou certo de que ou a paz mundial começa em mim, ou não começa de jeito nenhum.

Nota

(1) Agora estou assim. Se um bando de imbecis se considera habilitado para dizer se Jesus existiu ou não e o que ele queria afinal de contas, ou qual o anjo do dia, ah, dá licença que eu também posso.

Alexandre Ramos
Teresópolis, 1/1/2002

 

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