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Quinta-feira, 17/12/2015
No encalço do Natal
Elisa Andrade Buzzo

Estou no encalço do ônibus biarticulado iluminado. Há anos quero estar dentro dele e sentir o espírito de Natal em movimento pelas ruas da cidade. Aperto o passo, chego a correr e consigo alcançar sua porta. Afinal, este ônibus deve ter natureza simpática e acolhedora, então talvez aguarde seus passageiros com certa doçura natalina.

Assim que vou dar o boa-noite ao motorista, ali está um rosto conhecido. Agora, vestindo um traje completo de papai-noel, com direito a chapéu vermelho com pompom branco na ponta. Um papai-noel negro e jovem, sem barba, que dá um sorriso um pouco nonsense. O teto do coletivo tem adereços vermelhos e bonecos pendurados nas janelas superiores. Percorro o ônibus cheio de surpresas, e a cobradora loira também está de papai-noel, os cabelos soltos. Muito despreocupada, mexe em seu smartphone como se nada de diferente estivesse se passando naquele ônibus comemorativo.

E sua passagem vai deixando um rastro de luz azul e branca, refletido nos vidros dos prédios da avenida. Os pedestres são banhados dessa luz diferente, crianças gritam, correndo atrás de nós, enquanto alguns dos passageiros dão tchauzinho. As pessoas olham para aquele bólido ornado e sorriem, espontaneamente. Seria isso o suficiente para este Natal? Um olhar. E um sorriso desinteressado se abrindo em público.

Mas o ônibus colorido passa. Sai da avenida, entra num túnel, agora momentaneamente clarificado por sua presença. Já entra noutra avenida, bordejando e iluminando o muro branco dos cemitérios. Então começa a se embrenhar pelas ruas menos movimentadas dos bairros. Atrai a atenção dos homens do caminhão de lixo, que gritam alegremente em sua direção. E o papai-noel daquele estranho trenó citadino responde com buzinadas curtas.

O ônibus iluminado passou. Passageiros arrastam o estorvo das pesadas cestas de Natal. O ambiente está pacificado em pensamentos esquecidos. Já está chegando meu ponto. Desço e olho mais um pouco para aquela carcaça, até que sua presença se desvaneça na escuridão.

Elisa Andrade Buzzo
São Paulo, 17/12/2015

 

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