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Terça-feira, 8/11/2016
Lembrança de Plínio Zalewski
Celso A. Uequed Pitol

“Morte de coordenador do PMDB abala campanha eleitoral em Porto Alegre”, estampou a Zero Hora em sua edição de terça-feira, dia 18.

Abrimos o jornal e procuramos a matéria. Ao lê-la, somos informados de todos os detalhes que cercaram o terrível acontecimento. Lá pelas tantas, no meio do texto e sem maiores explicações biográficas, aparece o nome do morto, cuja figura não parece acrescentar grande coisa à narrativa misteriosa. A maioria passará os olhos por ele e não se recordará. Outros, que lêem com mais calma, podem perguntar: quem é Plínio Zalewski?

É um nome que, de fato, não ressoará nos ouvidos e mentes da maioria. As chamadas de capa devem, por definição, partir do conhecimento comum dos leitores – um conhecimento que, lamentavelmente, não inclui o nome do morto. Para a maioria do público, quem morreu foi o coordenador da campanha eleitoral. Por isso, aqueles que conheceram Plínio Zalewski e conhecem a sua brilhante contribuição à cidade não devem se sentir ultrajados por esta chamada. Devemos perdoar os jornais e o grande público; eles não sabem o que dizem. O que não podemos é deixar de responder à pergunta daquele leitor atento. É preciso que, também ele, saiba quem é Plínio Zalewski.

Há várias maneiras de começar a responder a esta pergunta. Podemos, por exemplo, relembrar das funções que Plínio Zalewski exerceu, como a Direção de Cidadania e Direitos Humanos do governo do Estado, ou o Observatório da Cidade de Porto Alegre. Foi, também, um dos responsáveis pela criação do Prêmio de Responsabilidade Social da Assembleia Legislativa e presidiu o Fórum Permanente de Responsabilidade Social do Rio Grande do Sul. Está longe de ser pouco: mas esta é, por assim dizer, apenas a parte mais visível de uma trajetória impulsionada por uma concepção de gestão pública que ele, junto a seu parceiro e amigo Cezar Busatto, desenvolveram a partir do conceito de Governança Solidária Local, presente no livro “Governança Solidária Local: fundamentos políticos da mudança em Porto Alegre”. Publicado em 2004, foi um dos nortes intelectuais do modelo que venceu a eleição daquele ano na Capital e levou à criação da secretaria de Governança Local, que hoje tem similares em várias cidades do país. Em síntese, a Governança Solidária Local é um modelo de democracia participativa que articula a parceria entre o governo e a sociedade civil, aproximando os cidadãos das decisões efetivas da cidade. Trata-se, enfim, de uma radicalização e um aperfeiçoamento da experiência democrática.

Eis, aí, um resumo da longa e bem sucedida atuação pública de Plínio Zalewski. Mas falta falar de algo importante: do indivíduo, do homem Plínio Zalewski. Quero aqui lembrar do homem que conheci. E faço-o, sobretudo, porque quero mostrar como as ideias que formulou e defendia com vigor estavam incorporadas em seu agir.

Foi no começo de 2003. Era calouro do curso de Letras e escrevia artigos e resenhas para alguns jornais e revistas. Por ocasião da celebração dos 100 anos de “Os Sertões”, de Euclides da Cunha, havia escrito um artigo longo sobre a obra, que meu pai, então assessor na Assembleia Legislativa, fez a gentileza de divulgar entre os colegas de trabalho. Alguns dias depois recebi uma ligação em meu celular: era o Plinio. Apresentou-se como colega e amigo do meu pai e disse que havia lido meu artigo com muito prazer. Em seguida, solicitou meu e-mail para colocar por escrito suas impressões de leitura e pediu autorização para inclui-lo na sua newsletter. Agradeci os elogios e informei o endereço.

No mesmo dia, recebi seu e-mail. Plínio elogiava meu artigo – com alguma generosidade, devo dizer – e fazia algumas observações sobre a sua leitura d’Os Sertões. Respondi, agradecendo a leitura e os apontamentos. Em seguida, recebi o primeiro texto da sua newsletter. Ao longo do tempo viriam muitos outros, sempre versando sobre os mais variados temas políticos, sociais, econômicos e culturais. A lista incluía acadêmicos, políticos renomados e jornalistas, oriundos das mais variadas tendências políticas e muito dispostos a contribuir e debater. Logo percebi o que era aquilo: um verdadeiro espaço de participação. Como a Governança Local Solidária. Como tantos que Plínio ajudou a criar. Para ele, termos como participação e pluralismo não eram meros termos retóricos, e sim uma prática viva, cotidiana e incorporada em todas as suas ações.

Voltemos à pergunta sobre quem foi Plínio Zalewski. Chegou a hora de deixa-lo falar um pouco. Creio que nada substituirá a sua voz se quisermos realmente entender quem ele era. E, para isso, recorro a um dos seus muitos artigos que descansam na minha caixa de e-mails, onde ele traz uma definição da atividade que exercia diariamente: a política. Uma definição que deixa à mostra que ideias o animavam:

“Política é a aparição consciente num espaço público, no qual, pensando com minha própria cabeça, andando com minhas próprias pernas e sentindo com meu coração, expresso o que penso e o que sinto sobre os assuntos da comunidade onde vivo e, sobretudo, coopero para que, neste espaço, nasçam promessas mútuas e pactos traduzidos em ações colaborativas de interesse coletivo”

Plínio Zalewski dedicou a vida a criar canais para as pessoas participarem destes espaços, fossem eles fóruns, seminários ou newsletters. Eis aí o resumo de sua brilhante trajetória. Diante disso, pouco importam as capas de jornal; elas valem, no máximo, para o momento. Homens como ele semeiam para o futuro.

Celso A. Uequed Pitol
Canoas, 8/11/2016

 

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