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Quinta-feira, 8/12/1977
Quem sou eu?
Paulo Polzonoff Jr

Seria muita pretensão minha querer responder a esta pergunta ancestral. Não sei quem sou e, para falar a verdade, não quero muito saber. Não vejo, simplesmente, como estas questões existenciais possam melhorar a minha vida. Então, para que se estressar, não é mesmo? Sou apenas aquilo que penso que sou - e olhe lá! Uns discordarão e então eu terei de retrucar que ninguém entende mais da minha vida do que eu mesmo. Mas não tenho muita certeza do argumento.

Pois comecemos com o meu nome: Paulo Polzonoff Jr. O prenome é português mesmo. O sobrenome é russo. Com o indefectível Jr. para incomodar. Para alguns, porém, eu não sou nada disso. Virei apenas o Polzonoff para a maioria dos que me lêem. Para os amigos sou Paulo. Os mais íntimos me chamam de Paulinho. O Jr. está reservado aos inimigos que acham que isto me deprecia. Já aí deu para perceber que sou três em um, como Deus. Não é muito à toa.

Minha vida de Paulo Polzonoff Jr. começou oficialmente em 1977, mas eu acho que foi bem depois. Minha primeira lembrança é de 1980. Depois as coisas ficam confusas até 1982. A partir de então eu sou capaz de lembrar de quase tudo: morte do Tancredo, explosão da Challenger, fora Collor, Itamar, etc. Só não sou capaz de me lembrar do rosto das pessoas. Portanto, se um dia você me encontrar na rua e eu não o cumprimentar, me desculpe. E saúde, caso você espirre.

Já escrevi em algum lugar que sou uma mistura "implosiva" de russos com italianos e espanhóis. A verdade é que, ultimamente, a alma russa tem imperado. Na reserva fica a alma italiana. A parte esquentada, espanhola, ficou de lado, como um vulcão adormecido. Por favor, silêncio. Não queremos acordar a bichinha, não é mesmo?

Apesar de na minha carteira de trabalho constar apenas que trabalhei como jornalista, na verdade já fui balconista e caixa de padaria, office-boy, arquivista, revisor e editor. Talvez tenha sido alguma coisa no meio disso, mas não lembro porque estava dormindo. Já ganhei prêmio de fotografia mas não sei fotografar. Já ganhei prêmio literário, mas muitos dizem que não sei escrever (e eu não acho que o prêmio desdiga isso).

Já quis ser o Paulo Francis. Depois o Mencken. Antes disso eu quis ser o Cristóvão Tezza, depois o Paulo Leminski. Já quis ser o Indiana Jones e o Jacques Cousteau. Já quis ser o meu professor de literatura Élio Antunes e já quis ser como o meu pai. Nada deu muito certo, confesso. Daí eu me toquei (o óbvio das obviedades!) que eu não tinha cacife para ser ninguém senão eu mesmo. Há quem diga que está dando certo.

Já tomei remédio para caxumba, diarréia, cólica, sarampo, dor-de-cabeça, insônia, depressão, dor muscular, picada de abelha, dor-de-dente, dor-de-ouvido, frieira, gripe e até para uma pneumonia que eu não tive. Parei com isso. Não tomo mais remédio para nada e a minha vida vai bem, obrigado. Consulto médicos apenas para fazer exames de sangue regulares. Mas não sei por que estou dizendo isso. Ou talvez eu saiba. Preciso tomar remédio para esclerose.

Nasci em Curitiba, onde cresci. Primeiro, na Campina do Siqueira, onde fiz muito cocô nas fraldas. Depois, no Bairro Alto, onde li enciclopédias, aprendi a andar de bicicleta e sofri meu primeiro amor. Depois me mudei para o Cabral, onde aprendi a fumar e a jogar sacos cheios de água do 19o andar do prédio. Só coisa útil. Por fim, morei no Alto da XV e no Centro, onde aprendi a morar sozinho. Depois disto tudo, me mudei para o Rio de Janeiro, onde aprendi a gostar do sol (do mar eu já gostava).

Sou um leitor apaixonado de bons livros. Meu ouvido para música não é muito bom, mas eu me esforço. Na pior das hipóteses, sei do que não gosto: música eletrônica, hip-hop e emepeboca. Meu olhar para a pintura não é deste século nem do anterior - e eu acho que isto é muito bom. Gosto de ver televisão bem mais do que gostaria. Em cinema, não gosto de filmes iranianos. Por outro lado, sou fã de Austin Powers. Em política, sou de centro-esquerda, mas já fui de esquerda e de direita. Sou heterossexual assumido, sem religião definida, não-fumante, bebedor de fim de semana, flamenguista e meu índice de massa corporal é 24, mas já foi menos.

Sou isto e sou mais, muito mais. Mas, hoje em dia, quem é que tem paciência para descobrir o outro, não é mesmo? Por isso eu posso ser divertido e interessante para alguns e arrogante e burro para outros. Quer saber? Eu sou mesmo é um homem que gosta de olhar as ondas batendo nas pedras, indo e vindo, tentando nos ensinar a eternidade que não nos é compreensível. E me traga mais uma água de coco, por favor.

Paulo Polzonoff Jr
Rio de Janeiro, 8/12/1977

 

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