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Segunda-feira, 17/6/2002
Em terra de cego, quem tem olho é Pelé
Carlos Benites

E continua a moda dos reality shows. Na semana retrasada, começou um que tem edições de quatro em quatro anos: o Big Brother Fifa 2002. Em alguns casos, conta com pessoas famosas. Em outros, com pessoas desconhecidas. Mas uma coisa é essencial: convencer o público de que o que está na TV é verdade. A velha arte da dramaturgia a serviço da audiência; no limite da verossimilhança, é claro. Ou não... O que vale é emocionar as massas.

Como todo reality show de prateleira, a busca é pelo sucesso e pelo dinheiro que vem dos patrocinadores. Vale, então, qualquer coisa: colocar pessoas em situações ridículas; tomar alguém por louco; trapacear na competição; etc. A diferença é que há muito mais em jogo no BBF2002 (como abusos de poder, por exemplo; o mesmo que a Nike tem sobre a CBF...)

O fato é que poucos eventos ainda conseguem colocar tanta gente em frente da TV simultaneamente em todo o mundo. É um dos negócios mais bem bolados de toda a história do entretenimento. A ponto de fazer uma quantidade absurda de pessoas se levantar às 3 da manhã para ligar a TV. Sem contar que essa atividade toma grande parte do tempo da mídia, monopolizando também as rodinhas de pate-papo no trabalho, no clube, no boteco e até mesmo com a patroa. (Sim, o milagre acontece: BBF2000 faz com que até mulheres queiram entender de futebol.)

Outro dia uma amiga minha perguntou:

- Quem você acha que irá ganhar a copa?

Fui obrigado a responder:

- Sei lá.

- Você não gosta de futebol, não é?

- É que eu tenho um problema com futebol: eu acredito no resultado de uma partida tanto quanto no de uma luta de boxe...

(Não preciso dizer que o papo terminou por aí mesmo.)

Claro, é possível encarar tudo isso como mera diversão. Fritar uma pipoquinha, deitar no sofá, dormir no intervalo e perder o segundo tempo... Mas não me peça para ser patriótico nessa única hora em que todo brasileiro sente orgulho de ter nascido no país de Pelé, de Garrincha e de Ronaldinho.

Não consigo me preocupar de verdade com a possibilidade de a Argentina ganhar do Brasil. Mas, a não ser que eu pretenda ficar de fora de todas as conversas do meu meio social durante um mês, é bom estar minimamente atualizado. Assim, assisto os melhores momentos no jornal de fim de noite, só para comentar que o gol foi impedido, ou que o Felipão não devia ter colocado o Kaká, etc.

Assim mesmo, nunca vou poder comentar que o juiz foi "comprado", que o pênalti foi despudoradamente "fraudulento" e que esse não é um erro aceitável do árbitro. Se fizer isso, vão me acusar, mais uma vez, de falta de patriotismo, etc.

Temos de lembrar sempre que o BBF2000 é um reality show. Então, tudo, absolutamente tudo o que ele mostra é a mais fiel expressão da verdade.

Post Scriptum
Que "sorte" a do Ricardinho; que "azar" o do Romário...

Mise en scène
Fico com a pulga atrás da orelha quando um assunto sem importância ocupa muito espaço na mídia. Mais ou menos do jeito que vi acontecer com o caso do ex-foragido-ilustre-pagodeiro Belo. Será que o fato de ele ter vendido milhões de CDs é suficiente para que se transmita, em diversos canais, em tempo real, cada desdobramento do caso?

"Belo não quer ser entregar". "Advogado de Belo cobra Propina". "Belo vai ao Banheiro da Delegacia". O que mais falta? Estamos em plena corrida presidencial, a situação econômica brasileira sofre um revés como não se vê desde o início da crise da Argentina e os caras só falam no Belo?

Não sou conspiracionista, mas que tem cheiro de coisa errada, lá isso tem...

Carlos Benites
São Paulo, 17/6/2002

 

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