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Segunda-feira, 22/7/2002
Cyrano de Bergerac
Nemo Nox

Existiu realmente um Cyrano de Bergerac, na primeira metade do século XVII. Mas, apesar de ser um escritor mediano (seu livro mais famoso, entre a fantasia e a ficção-científica, é Voyage dans la Lune et Histoire comique des etats et empires du Soleil), possivelmente teria sido relegado para o esquecimento se não fosse a inspirada peça de Rostand.

Edmond Rostand nasceu em Marselha em 1868, filho de um poeta. Formou-se em Direito, mas desde cedo dedicou-se ao teatro, escrevendo peças de sucesso como Le Gant Rouge a partir dos vinte anos de idade. Nada se comparou, porém, a Cyrano de Bergerac, que foi lançada com o famoso Benoit Constant Coquelin no papel principal (é possível que a peça tenha sido escrita com Benoit em mente, já que o manuscrito é dedicado a ele). Passada na mesma época em que o verdadeiro Cyrano viveu, a história conquistou de imediato o coração dos franceses com suas tramas de amor, seus duelos de espadas e, principalmente, o humor fino e inteligente dos diálogos. Até a sua morte em 1918, Rostand nunca conseguiu escrever outra peça que repetisse o sucesso de Cyrano de Bergerac.

Paris, 1640. Cyrano de Bergerac é um talentoso poeta e exímio espadachim, integrante da companhia militar chamada Cadets de Gascogne. Mas ele possui um nariz absurdamente comprido, que lhe dá uma aparência ridícula para acompanhar seus dotes mentais e físicos. Apaixonado pela própria prima, Roxane, ele se acredita demasiadamente feio para merecer o seu amor. Quando Christian de Neuvillette, um jovem nobre, se junta aos Cadets de Gascogne e também se enamora de Roxane, Cyrano acaba assumindo o papel de protetor do rival, a pedido da prima. Como Christian é, digamos, pouco dado a exercitar os neurônios, sobra para Cyrano escrever suas cartas de amor. Roxane, é claro, apaixona-se pelo homem que escreve aqueles maravilhosos textos, sem suspeitar que é o brilhante primo e não o simplório nobre.

Com esta trama básica, Cyrano de Bergerac desenvolve-se em cenas de amor e episódios de batalha, sempre com o protagonista mostrando que sua língua ferina é tão afiada quanto a sua espada. O humor, em tiradas sutis, está presente em todo o texto, mas se a primeira metade pode ser considerada uma comédia, a partir de certo ponto o tom muda e vai se tornando bem mais sombrio. O final da peça é emocionante, daqueles que deixam as plateias enxugando as lágrimas quando as cortinas se fecham e as luzes se acendem. E Rostand brilha nas referências a clássicos da época, de Os Três Mosqueteiros (comparação óbvia para os Cadets de Gascogne) a Romeu e Julieta (com uma paródia da famosa cena do balcão).

Na Broadway, Cyrano foi interpretado em 1947 por Jose Ferrer, que recebeu o prêmio Tony pelo seu trabalho (outro Cyrano premiado com um Tony foi Christopher Plummer, pela versão musical de 1974). Ferrer também interpretou o papel principal da versão cinematográfica de 1950, com direção de Michael Gordon, e dessa vez levou um Oscar. Mais recentemente, em 1990, Gerard Depardieu foi o Cyrano do cinema francês, um papel perfeito para o ator (também indicado ao Oscar), dirigido por Jean-Paul Rappeneau. Roxane é uma versão curiosa da mesma história, com a ação transportada para os dias de hoje e os Cadets de Gascogne substituídos pelos bombeiros voluntários de uma cidadezinha norte-americana. Surpreendentemente, Steve Martin (como Cyrano) e Darryl Hanna (como Roxane) conseguem manter algo do encanto do original, e apesar de ainda ser uma comédia leve serve como interessante contraponto ao Cyrano de Rostand.

Nota do Editor
Texto gentilmente cedido pelo autor. Nemo Nox é editor do blog Por um Punhado de Pixels e do site Burburinho, onde este texto foi originalmente publicado.

Nemo Nox
Washington, 22/7/2002

 

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