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Quarta-feira, 24/3/2004
Digestivo nº 167

Julio Daio Borges

>>> ENXUGANDO GELO “Outracoisa” ficou famosa antes de estar amplamente acessível nas bancas. O jornalismo, especificamente o musical, no final de 2003, só falava na “revista do Lobão” ou na “revista com o CD (do Lobão)”. Havia, ao menos, uma curiosidade – num meio tão carente de publicações que tratem exclusivamente de música. Depois de ler “outracoisa”, percebemos que todo o “hype” em torno era mais do que isso: era, novamente, o desejo de ressuscitar os “anos 80” e, principalmente, de ressuscitar as “figuras” que fizeram os anos 80. A imprensa brasileira, para o bem o para o mal, vive de “repentes” nostálgicos. Vide, por exemplo, as Viúvas de 68: primeiro, na “Caros Amigos”; depois, no “Pasquim21”. A própria “Argumento” – que me perdoem os realizadores e demais envolvidos – teve como objetivo recriar uma “atmosfera” perdida no início dos anos 70. E não se enganem: as Viúvas dos Anos 80 também existem. Afinal, o que pensar de uma revista que traz de volta gente como o próprio Lobão (assinando – ou melhor: assassinando – editoriais); Ezequiel Neves (também uma Viúva de Cazuza); Glauco Mattoso (o homem do “Jornal Dobrabil”, ainda fértil); e Júlio Barroso (que, tudo bem, teve a sua importância – mas que não chega a tanto...). E todos os caminhos levam, mais uma vez, à extinta “Bizz” (da editora Abril) – que, com todos os defeitos (reconhecidos inclusive por quem fez a revista), foi um marco para quem ficou preso nas referências de 20 anos atrás. Nem precisa dizer, pela milésima vez: – O rock brasileiro dos anos 80 morreu; vamos virar a página. Claro que “outracoisa” não é apenas isso – esse saudosismo perdido entre o Rock in Rio e o Circo Voador. Há também discussões atuais sobre o “jabá”, sobre a “cena independente”, sobre a “música digital”, etc. Fora o fato de que é sempre saudável contar com “alternativas” ao mainstream editorial. O que não se pode fazer é se deixar levar pela mentalidade “retrô” de algumas décadas (perdidas).
>>> outracoisa
 
>>> AQUARELA DO BRASIL Na música brasileira, é tempo de pianistas. Arranjadores, instrumentistas e compositores estão se arriscando em empreitadas solo. Com a independência dos pequenos selos, abriu-se espaço para discos dos chamados “músicos dos músicos”. Assim como existe o “writers’ writer” (o “escritor dos escritores”), existe também o “músico dos músicos” – aquele sujeito que desperta a admiração não apenas do público, mas também de seus pares. É o caso de Fernando Moura, que já tocou com todo mundo: desde Chuck Berry até Marisa Monte; desde George Martin até Elba Ramalho; desde Paulo Moura (que está no disco e com quem compõe) até Marcos Suzano (parceiro constante, cujo CD ficou sob sua produção). O álbum de Fernando Moura intitula-se “Do Bom e do Melhor” e é um lançamento da Rob Digital. Para mostrar que não fica só na intenção, Moura recheou seu trabalho de ilustres convidados: além dos citados Moura (Paulo) e Suzano, estão presentes Armandinho, Henrique e Beto Cases, entre outros. O verde-amarelo da capa e do encarte, mais o “feijão maravilha” em primeiro plano, indicam que a intenção, musicalmente falando, é abraçar toda a complexidade de gêneros e ritmos do Brasil. A diferença está na abordagem que Fernando Moura faz da tecnologia: crê que a convergência entre ela e a música será, no futuro, uma coisa inevitável – e já aposta nessa certeza. Mas que ninguém fique preocupado: não vai sofrer com as interferências excessivas do “drum’n’bass”; com as intervenções (nem sempre bem-vindas) dos DJs; e com o aparato de efeitos sonoros (que, muitas vezes, só faz poluir a audição). Fernando Moura é suficientemente refinado para não aderir abertamente a modismos; que o diga, por exemplo, a introspectiva e densa faixa “Alegria do Amor”, de um piano límpido e cristalino. Destaque também para a releitura de “Chovendo na Roseira” (Tom Jobim), com direito a introdução e vocalização (em japonês) de Miyazawa Kazufumi. “Oração ao Tempo” (outra versão criativa sua para uma canção de Caetano Veloso) foi tema da peça “Mais Uma Vez Amor”, com Marcos Palmeira e Luana Piovani. Fernando Moura, como todo artista que quer sobreviver no País, se fez multimídia – mas o CD é uma prova de que não precisou vender sua alma.
>>> Do Bom e do Melhor - Fernando Moura - Rob Digital
 
>>> IN THE LINE OF FIRE O Ripley, de Patricia Highsmith, que começou a se multiplicar nas prateleiras graças à Companhia das Letras, agora ameaça se transportar para as telas num segundo episódio: “O Retorno do Talentoso Ripley”. Quem assistiu ao primeiro (em 1999) se lembra de um Matt Damon charmoso e cruel, ainda com laivos de “Gênio Indomável” (1997, que o revelou) – antes de sucumbir a papéis “fáceis” e seriados. Se o protagonista do Ripley inicial não soube se manter na ascendente, esse seu “Retorno” segue pela mesma estrada. Tom Ripley agora é John Malkovich: logo nas primeiras cenas, o mesmo vilão frio e violento ao qual estamos acostumados (“Na Linha de Fogo” [1993] e “Ligações Perigosas” [1988], entre outros). Mais amadurecido, casado e com ligações no mercado de arte, perdeu em sofisticação e em inteligência e parece resolver tudo na base do assassinato. Quando não consegue o que quer, trata de matar. No primeiro “Ripley”, pelo menos, as mortes têm um caráter acidental e inevitável – como se não fossem planejadas e impusessem ao personagem alguma dor de consciência. No segundo “Ripley”, não: ele mata quase que por esporte; ensina a matar; e, por último, faz da morte uma espécie de passatempo. Nada indica que seja assim nos livros de Highsmith (a criadora do Ripley). Foram-se, igualmente, os cenários deslumbrantes (ainda que Malkovich se mantenha na Itália), a sexualidade e a personalidade dúbias e um “cast” que, junto a Damon, ajudava a sustentar o longa. Malkovich está cercado de atores desconhecidos (ou iniciantes), o que confere à fita um ar de produção “B” – ainda que o astro se esforce. Vale por algumas tiradas (“Você tem a cultura de quem passou a vida lendo revistas de automóvel”; “Numa ação, nunca se preocupe com os detalhes que você não pode controlar”; etc.) Um “Ripley” assim desperdiçado provavelmente encerra a saga; e John Malkovich precisa tomar cuidado, para não acabar no estereótipo.
>>> O Retorno do Talentoso Ripley
 

>>> EVENTOS QUE O DIGESTIVO*** RECOMENDA
(CN - Conjunto Nacional; VL - Shopping Villa-Lobos)


>>> Noites de Autógrafos
* Minoridade Crítica - Luís Antônio Giron
(2ª f., 22/3, 19hrs., CN)
* Doze visões de duas cidades maravilhosas: Rio-Sao - Bob Wolfenson, Cláudio Elisabetsky, Eduardo Muylaert, Emídio Luisi, Tuca Reines, Antônio Guerreiro, Arthur Omar, Miguel Rio Branco, Milton Montenegro, Pedro Lobo, Severino Silva e Nirlando Beirão
(3ª f., 23/3, 19hrs., CN)
* Tarsila - Maria Adelaide Amaral
(4ª f., 24/3, 19hrs., CN)
* Em defesa da escola - Rosely Sayão e Julio Groppa Aquino
(5ª f., 25/3, 18h30, CN)

>>> Shows
* Música das Nações - Trio Images
(2ª f., 22/3, 20hrs., VL)
* Louis Armstrong - Traditional Jazz Band
(6ª f., 26/3, 19hrs., VL)
* Espaço Aberto - Lula Barbosa
(Dom., 28/3, 18hrs., VL)

** Livraria Cultura Shopping Villa-Lobos: Av. Nações Unidas, nº 4777
** Livraria Cultura Conjunto Nacional: Av. Paulista, nº 2073

*** a Livraria Cultura é parceira do Digestivo Cultural
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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