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Quarta-feira, 26/5/2004
Digestivo nº 176

Julio Daio Borges

>>> BEDROOM POP Considerando que a troca de arquivos é um fato, a Trama – na contramão de quase todas as outras gravadoras – resolveu inovar: montou seu próprio site de troca de arquivos, divulgação de artistas e disponibilização de informações grátis. Chama-se “Trama Virtual” e é uma mistura de rádio, com “Kazaa” (ou “Napster” ou quejandos), com blogs, com fóruns de discussão, com “top ten” de emissora de televisão. Carlos Eduardo Miranda, o idealizador do projeto, assina o “release” e declara o que pode parecer um paradoxo: “A Trama é pelos artistas, e está transferindo, cada vez mais, o controle dos ‘processos’ para as suas mãos”. Levando essa lógica até o limite, chegamos à pergunta (que não quer calar há anos): – Pra quê, então, gravadora? O raciocínio, felizmente para a Trama, não é tão simples. Se ela conseguir transformar o “Trama Virtual” em “referência” para artistas e para o público, pode estar criando uma nova MTV – e dominando, em etapas posteriores, o lançamento, a difusão e a produção da “nova música”. Tradução: se o “Trama Virtual” pegar, como parece que está pegando, quem estiver fora, no Brasil, vai estar fora do mundo. E existem inúmeras possibilidades de exploração do site: desde a conhecida inserção de banners até a cobrança futura de taxas de adesão e de manutenção dos usuários. Saindo dos negócios e voltando para a arte, enquanto for grátis, o “Trama Virtual” tem tudo para se consagrar. É fácil, organizado, rápido e se revela uma fonte inesgotável tanto para quem persegue (e consome) as novidades quanto para quem quer mostrar seu trabalho (e não tem onde). Em poucos dias, já podemos falar em alguns nomes, como Excelsior, Osmarmotta, Stratopumas e Cansei de Ser Sexy, e em alguns “hits”, como “A Day Like This”, “Perfume pelo ar”, “Graci e o seu charme” e “Meeting Paris Hilton”. E fica provado, pela milésima vez, que existe talento de sobra vagando pela World Wide Web. A indústria cultural, o “mainstream”, só não se renova, há décadas, porque não quer; porque é menos trabalhoso (e até há pouco tempo, mais lucrativo) se concentrar sempre nos mesmos nomes, e modismos, do que enfrentar o mercado brasileiro em toda a sua complexidade. O “Trama Virtual” talvez seja uma “concentração” do que já estava descentralizado, na internet. Ainda assim, é uma ponte entre o leigo e o artista (via especialista) – coisa que será sempre necessária enquanto existir arte.
>>> Trama Virtual
 
>>> FAUX PAS Alexandre Soares Silva se consagrou, na internet, como dândi. Essa figura do século XIX, que Oscar Wilde foi, e que projetava a imagem de aristocrata esnobe, patrono das “decorative arts”, cheio de “witty” e apaixonado por uma disputa (pelo simples prazer da disputa). Mas, antes disso, Alexandre Soares Silva se apresentou como escritor, como o autor de “A Coisa Não-Deus” (Becca, 2000) – um livro de título difícil, que não foi imediatamente lido. Em março último, mais uma vez, investiu nas letras: “Morte e Vida Celestina”, lançado pela editora Candide. Então seus leitores de internet, entre eles Geneton de Moraes e Diogo Mainardi, ficaram se perguntando que tipo de escritor era Alexandre Soares Silva. E a resposta veio: o mesmo dândi virtual. Com uma diferença: se na World Wide Web os seus alvos são os nossos contemporâneos, suas vulgaridades e seus ataques de mau gosto, na literatura, Alexandre criou um mundo fantasioso, uma “realidade” que se situa no paraíso, para mandar – de lá – os seus recados críticos. Suas duas obras, que formam uma seqüência, são de um escritor hábil, criativo e cheio de recursos – infelizmente, porém, misturam gêneros que poderiam funcionar muito melhor separados. Traduzindo: Alexandre deveria insistir na sua crítica social, ferina, e até compor sátiras; mas que abordassem diretamente, e sem rodeios, esta nossa época. Alexandre deveria continuar com seus romances infanto-juvenis, de detetive inclusive, mas poderia simplificá-los, com menos citações eruditas e com menos nomes de intrincada pronúncia. Alexandre Soares Silva é – em suma – muito capaz como artífice, e ninguém duvida que ele seja um dos maiores talentos de sua geração (pelo menos, na Web), mas poderia ser menos ambicioso ao tentar dizer “tudo” em um ou dois livros. Como tem uma obra pela frente, deveria se exercitar em categorias estanques como, por exemplo, “crítica de costumes”, “ensaísmo” e “romance policial” – cada uma a seu tempo, e cada uma em um livro. Os leitores agradeceriam, e o verdadeiro escritor, que está por detrás do dândi, enfim surgiria.
>>> Morte e Vida Celestina - Alexandre Soares Silva - 164 págs. - Candide
 
>>> DOIS DEDOS A MENOS Jonny, um detetive pé-rapado, é contratado por um cliente cheio da nota para vigiar sua filha, metida no submundo. É o mundo de Jonny, e para ser respeitado entre a moçadinha que cerca a menina, ele se envolve numa fraude bancária atrás de milhões de dólares esquecidos desde 1930 pelos herdeiros de Al Capone. O plano é bem sucedido, a garotada põe a mão na vultuosa soma, mas é perseguida por uma gangue rival, cuja marca registrada é prender a vítima e decepar sua mão. Jonny se envolve com a moçoila, claro, e, por conhecer o chefão do grupo antagonista, salva o seu traseiro e o dela da morte certa. Parece enredo de filme de ação, mas não é. É “argumento” de história em quadrinho e estamos falando de “Jonny Double”, recentemente lançado pela Brainstore Editora, que faz um trabalho exemplar e que vem insistindo no nicho por tantos abandonado. O volume tem o texto de Brian Azzarello, descontando algumas excessivas liberdades de tradução (para torná-lo ainda mais coloquial?), e a “arte” de Eduardo Risso, que já passou até por “graphic novel” do Batman. Jonny Double é um “baby boomer” falido, em vias de se aposentar; o tipo de anti-herói decadente, charmoso e sem rumo – que tanto atrai o leitor jovem e adolescente. Como todo sobrevivente dos anos 60, rememora algumas passagens daqueles “tempos tão loucos”, que arrancam suspiros e exclamações da platéia que acabou de engrossar a voz. Já a mocinha, Faith (esse é o seu nome), faz o tipo rebelde sem causa, vagando por bares, com um “despojamento” de milímetros e uma feição permanentemente entediada. Vocês conhecem o tipo; já cruzaram com ele. Tirando a diferença de idade, eles não formam o par perfeito? O cenário é a São Francisco de “hoje”, com ecos de insurreição “beatnik” e com eflúvios do “hippismo” de Berkeley. A história não se destaca sobremaneira do que já se fez nos anos 90: em cenários de “Blade Runner”, outras almas perdidas já vagaram e já se encontraram, atrás de um sentido para suas vidas sem porquê e sem razão. Na verdade, os quadrinhos deveriam abandonar as imagens de hecatombe (que ainda não houve) e apostar um pouco mais na aurora do novo século. Talvez assim consigam encaixar um sorriso no acinzentado Jonny Double; e na desconsolada Faith.
>>> Jonny Double - Brainstore Editora
 
>>> CHARGE DA HORA: "DOCE VINGANÇA" POR DIOGO



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>>> EVENTOS QUE O DIGESTIVO RECOMENDA

>>> Cafés Filosóficos
* Neurônios, sinapses e glia: a coreografia do pensamento - Luiz Eugênio Araújo de Moraes Mello (3ª f., 25/5, 19h30, VL)

>>> Palestras
* Qual a importância da arte para a saúde e a vida? - Nise Yamaguchi e Inês Novoa Jezler (Sáb., 29/5, 16hrs., VL)

>>> Noites de Autógrafos
* As artimanhas do ego - José Diney
(2ª f., 24/5, 18h30, CN)
* Por trás das palavras - Mário Eduardo Viaro
(3ª f., 25/5, 19hrs., CN)
* A psicanálise cura? - Roberto Girola
(4ª f., 26/5, 19hrs., VL)
* Teoria e Prática de Reciclagem - Hernán Múrua
(5ª f., 27/5, 18h30, VL)
* Guia dos Vinhos Brasileiros 2004 - Eduardo Viotti
(6ª f., 28/5, 18h30, VL)

>>> Shows
* Música das Nações - Celina Charlier e Fúlvio Ferrari
(2ª f., 24/5, 20hrs., VL)
* Duke Ellington II - Traditional Jazz Band
(6ª f., 28/5, 20hrs., VL)
* Espaço Aberto - Banda Numismata
(Dom., 30/5, 18hrs., VL)

* Livraria Cultura Shopping Villa-Lobos (VL): Av. Nações Unidas, nº 4777
** Livraria Cultura Conjunto Nacional (CN): Av. Paulista, nº 2073
*** a Livraria Cultura é parceira do Digestivo Cultural


>>> Circuito Erdinger & Kiss FM
Acontece nesta quarta-feira, dia 26/5, a partir das 21 hrs., no Old Vic Pub (Rua Diogo Jacome, nº 613 - Vila Olímpia - Tel.: 11 3845-3452), onde estará se apresentando a banda Anjo da Guarda.

* a Erdinger é parceira do Digestivo Cultural
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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