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Sexta-feira, 14/10/2005
Digestivo nº 248

Julio Daio Borges

>>> DEUS É BRASILEIRO Quem observa o hoje carrancudo João Ubaldo, não imagina que ele um dia foi unha & carne com... Glauber Rocha. E quem observa sua atitude ostensivamente esquiva, para com os novos escritores (que insistem em soterrá-lo, cada vez mais, com seus originais), não imagina que João Ubaldo foi um dia, também, um jovem escritor inseguro, incentivado por Jorge Amado, com a natural mania de perseguição, confessando inclusive numa carta a Glauber que, para ele, tudo parecia dar — sempre — errado. E quem observa hoje o escritor recluso em que se transformou, totalmente avesso à badalação, não imagina que ele foi um dos pilares da chamada Geração Mapa, em Salvador, e que se os fulgurantes anos 60 tinham de produzir — além da música popular (MPB) e além do cinema (Novo) — algum escritor, esse escritor é o autor de Viva o povo brasileiro (1984). Livro, aliás, que João Ubaldo desovou em sete anos de concentração na Ilha de Itaparica (sua Macondo), longe do jornalismo e perto da família, numa época, para si, ideal, visto que já declarou o desejo de isolar-se do mundo num farol — para escrever e só (tema de Diário do farol?). Essas e outras histórias, por incrível que pareça, estão no volume que a Nova Aguilar dedicou ao autor de Sargento Getúlio, sempre uma realização solene, em mais de mil páginas e papel-bíblia, mais comumente devotada a escritores póstumos. (A nossa Pléiade, a nossa Library of America...) E "incrível" porque um belo compêndio que tem tudo para ser dedicado à posteridade, contém essas anedotas, mormente na fortuna crítica, em estudos assinados por João Carlos Teixeira Gomes e Eneida Leal Cunha (entre outros). Sem contar, é claro, os romances (Vida real e A casa dos budas ditosos — afora os supracitados), os contos (de Vencecavalo... e de Já podeis da pátria filhos...) e as crônicas (entre elas, a clássica "O conselheiro come"). João Ubaldo Ribeiro anda muito mal-humorado e pessimista na atual fase de sua vida, mas a Nova Aguilar veio lembrar que apenas um sujeito efusivo e tremendamente otimista poderia ter realizado, dos anos 60 pra cá, uma obra de tal envergadura.
>>> Obra Seleta - João Ubaldo Ribeiro - 1421 págs. - Nova Aguilar | De Ubaldo para Glauber | O sorriso do lagarto
 
>>> O CONSELHEIRO TAMBÉM COME (E BEBE) Outro dia, num evento dedicado ao café brasileiro, um dos maiores plantadores da Coffea arabica no Brasil levantou uma objeção ao ranking gastronômico da Veja São Paulo. Ele não era propriamente um restaurateur se queixando da sua má votação na última eleição, entre colunáveis, colocava apenas a seguinte questão: “Por que o La Tambouille nunca figura em nenhuma das (cada vez mais numerosas) categorias?”. Objeções ao lobby da família Fasano à parte, Giancarlo Bolla – ao contrário de seu defensor do ramo cafeeiro “em privado” –, e efetivamente o restaurateur do La Tambouille desde 1971, não parece preocupado. O La Tambouille, afinal, que virou sinônimo de coisa fina (e hors-concours, como dizia aquele empresário do cafezal), em francês quer dizer, aliás, gororoba. Isso mesmo: aquela, produzida para os soldados do quartel. E, enquanto os paulistanos acertam a pronúncia (é “la-tam-buie”), Bolla faz história, por ter introduzido, por exemplo, o carpaccio (e ter causado, claro, no início, estranhamento), e por ter lançado a moda dos restaurantes nos Jardins, quando inaugurou o seu, justamente, na avenida Cidade Jardim (antes todos os “finos” ficavam no Centro – Luiz Gushiken, em seu depoimento à última CPI, defendeu com unhas e dentes que o Cadoro, onde se hospedara, na rua Augusta, não era fino coisa nenhuma). Disputas políticas de lado, o La Tambouille foi igualmente um dos primeiros a produzir pratos decorados, num equilíbrio estético na disposição alimentar, e foi certamente um dos primeiros a homenagear famosos em suas criações assinadas, como a excepcional Mozzarella Cremosa “La Buffalina” com Carpaccio à Fausto Silva (nada a ver com o mau gosto do domingo) e como as Ostras Frescas de Florianópolis alla “Diva” Hebe Camargo (ficamos nos perguntando se as celebridades televisivas merecem tanto). O fato é que o La Tambouille vive irretocável, entre franceses e italianos – e, para quem fundou a alta gastronomia paulistana (ou mesmo a gastronomia paulistana), qual a importância de um ranking?
>>> La Tambouille - Avenida 9 de Julho, nº 5925 - Itaim - 3079-6277
 
>>> NA CASA DO MOURO Quem viu Christoph von Dohnányi, em sua estréia no Brasil, regendo furiosamente o balé Petruchka, pela temporada 2005 do Mozarteum Brasileiro, podia imaginar que ele transmitia, quase depois de um século, a bronca de Diaghilev, o encenador, ao compositor Stravinsky, que, em vez de entregar-lhe a encomenda de uma peça pagã, havia produzido apenas fragmentos vários ao piano... Mas, no fim, Diaghilev teve a visão de Petruchka, segundo ele, “o imortal e infeliz herói das feiras russas”, e se entregou – como se entregou, também, a platéia da Sala São Paulo, aos braços de Dohnányi, e da NDR de Hamburgo, regida por ele, depois de ter tido o privilégio de conviver com maestros efetivamente clássicos como Karl Böhm. Já Tchaikovsky surgiu, na mesma noite, com mais uma de suas meditações sobre a morte (segundo os biógrafos, Tchaikovsky era um suicida contumaz), através da sua Sinfonia nº 4, que, por parte de Dohnányi e da NDR, na nossa metrópole, mereceu um tratamento denso, amplo, oceânico, como se aos espectadores fosse comunicada a referida mensagem do “Destino”, conforme a profecia, nos comentários, de Eddynio Rossetto (sempre certeiro nas suas observações). E a imaginação correu solta para prefigurar o que seria Dohnányi e o prelúdio do “Primeiro Ato” do Lohengrin de Wagner; e o que seria a Sinfonia nº 7 de Beethoven, a mesma que teria colocado virtualmente o mesmo Richard pra dançar... – no dia seguinte. É por essas e por outras que a temporada de concertos, nesta nossa capital, tem sido incomparável (na realidade, sem precedentes na história da cidade), como, aliás, colocou Nelson Kunze, da revista Concerto, no Estação Cultura de Gioconda Bordon. E por mais que se diga que Kunze é “parte interessada”, desde o São Paulo Musical que ele não esteve tão coberto de razão.
>>> Christoph von Dohnányi & NDR | Mozarteum Brasileiro
 
>>> EVENTOS QUE O DIGESTIVO RECOMENDA



>>> Mesa Redonda
* Gilberto Freyre – Um Vitoriano nos Trópicos - Maria Lúcia Pallares-Burke, José de Souza Martins, Elide Rugai Bastos e Antonio Dimas
(Ter., 18/10, 19h00, VL)

>>> Noites de Autógrafos
* Manual de Processo Penal - José Carlos G. Xavier de Aquino e José Renato Nalini
(Seg., 17/10, 18h30, CN)
* Arquiteto Décio Tozzi - Décio Tozzi
(Ter., 18/10, 18h30, CN)
* O Homem à frente das profecias - Mario Enzio
(Qua., 19/10, 18h30., CN)
* Opus Dei – os bastidores - Dario Fortes Ferreira, Jean Lauand e Marcio Fernandes da Silva
(Qua., 19/10, 19h30, VL)
* Tarso de Castro – 75kg de Músculos e Fúria - Tom Cardoso
(Qui., 20/10, 19h00, CN)

>>> Shows
* Original Dixieland Jazz Band - Traditional Jazz Band
(Sex., 21/10, 20hs., VL)

* Livraria Cultura Shopping Villa-Lobos (VL): Av. Nações Unidas, nº 4777
** Livraria Cultura Conjunto Nacional (CN): Av. Paulista, nº 2073
*** a Livraria Cultura é parceira do Digestivo Cultural
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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