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Sexta-feira, 11/5/2007
Digestivo nº 328

Julio Daio Borges

>>> A FLIP COMO ELA É... O que Nélson Rodrigues diria de uma homenagem a si (e aos seus) numa festa literária? Provavelmente que não a merecia — ou que nela não creria — com sua alma de brasileiro vira-lata. Será que avançaria para além do túnel Rebouças — "tão longe do Brasil..." —, para dar o ar da graça em Parati? E, nas ruas sem calçamento — para as quais até Luis Fernando Verissimo apelou, cronista sôfrego —, seria chamado de Óbvio Ululante, não seria olhado na cara (por haver descrito a vida sexual de todo mundo), e voltaria, portanto, na mais cava e funda depressão — depois de trombar, claro, com bêbados do Eça, de olhar rútilo —, pois constataria que o brasileiro continua um feriado ("literário", no caso). Jabor, que na Flip 2005 sorriu amarelo quando alguém lhe sugeriu que telefonasse para o Anjo Pornográfico, talvez não veja outra saída agora, se for convidado. Estragado pela política, talvez o ex-cineasta não faça falta, mas Ruy Castro, único biógrafo de Nélson, certamente fará. Em compensação, Coetzee, o Nobel de Literatura de 2003, falará de teatro, de Beckett, e fim de papo. Joaquim Ferreira dos Santos, um mestre contemporâneo da crônica (rodriguiana?), explorará o gênero numa oficina (Nélson, se pudesse aconselharia logo: "Sejam burros!"). Para não escapar do noticiário (e da velha política, gorda e patusca), Lawrence Wright falará sobre o melhor livro acerca do 11 de Setembro, o seu, e Art Spiegelman, sobre a melhor graphic novel, a sua. Lehane repisará o tema da violência, presente em Sobre Meninos e Lobos (livro de sua autoria), enquanto que Arriaga o fará tratando de 21 Gramas, Babel e outros mais (roteiros de sua lavra). Amós Oz conciliará a guerra e a paz; e lerá em hebraico, como David Grossman em 2004. Na Flipinha, Nélson advertiria, sempre inconveniente, às criancinhas, que, depois de beijar, o homem começa a morrer; e que a mulher, essa, não deveria nunca ser beijada, nunca! Se fosse vaiado, em tempos de correção política, Nélson Rodrigues retribuiria chamando os intelectuais de "boas bestas" (como Drummond) e de "zebus" os demais circunstantes. Será que a Flip 2007 sobreviveria ao encontro com o artista poderoso, total?
>>> Festa Literária Internacional de Parati
 
>>> ÚLTIMO ROMANCE O Los Hermanos era bom demais pra durar tanto. De Los Hermanos (1999) até 4 (2005), até agora, foram oito anos. Houve quem previsse o rompimento entre Camelo e Amarante desde o DVD, No Cine Iris (2005), onde os dois líderes, no palco, pareciam já desconectados. Camelo se tornou o compositor preferido de Maria Rita, parecia o Caetano Veloso de Qualquer Coisa, ao violão, no último disco, e foi objeto de inveja do mesmo Caetano (2006), ao gravar com Bebeto Castilho, ex-Tamba Trio. Amarante, mais roqueiro, em matéria de letras não ficava atrás, foi gravado em ritmo de bossa nova, não compôs “Anna Julia” mas colabora hoje com Kassin, na Orquestra Imperial, cantando velhos sambas (esperamos que continue...). A banda andava pequena demais para os dois, mais Barba, mais Bruno. À maneira de Cazuza – o exemplo ainda conta... –, ninguém se surpreenda se Marcelo Camelo aparecer solo, “acústico”, longe das guitarras, perto dos sambas, em cada vez mais participações em outros álbuns “de autor”. De Rodrigo Amarante, espere-se praticamente o oposto: participações em álbuns de bandas, tocando guitarra (da qual provavelmente não consegue se afastar), dificilmente solo, preferindo a formação em grupo, fornecendo letras pra Deus e o mundo... O Los Hermanos se tornou um problema por ser grande demais, sufocando criativamente cada integrante. Agora, o problema será outro: meio grupo ou um quarto de grupo faz verão como antes (o grupo todo)? Que o digam os Titãs (se bem que... um oitavo de grupo cada). A diferença é que, dos anos 80, Camelo, Amarante & cia. talvez só percam – se perderem – para o Barão de Cazuza. E vem aí Exagerado e Carnaval reloaded.
>>> Los Hermanos
 
>>> STILL LIFE (TALKING) Eis que o mundo do podcast recebeu um apoiador de peso: o guitarrista Pat Metheny. Não, Metheny não resolveu digitalizar sua obra e distribui-la, gratuitamente, em formato MP3 – como alguns artistas em tempos de irracionalidade dos mercados –, Metheny apenas encarou o desafio de desenvolver seu próprio programa de rádio na internet e, por enquanto, está tirando de letra. Numa era em que a MTV (a Music Television) desistiu do videoclipe (portanto, da música), e em que o rádio tradicional anda meio perdido sem as gravadoras (e seu jabá, admitamos), Pat Metheny sabiamente partiu para uma retrospectiva em podcast. Como conta em seus programas, saiu de uma gravadora cult, a ECM, para uma outra que “popularizou” seu jazz como nunca, a Geffen Records. E como testemunha de uma fase onde as majors reinavam soberanas (fim dos 80, início dos 90), e que obviamente se encerrou, Pat Metheny olha agora em retrospecto, atendo-se estritamente à música, mas inconscientemente se questionando sobre qual será seu lugar, o de seu trabalho e, romanticamente, de seu legado, num universo sonoro que se derrete, incessantemente, como lava de vulcão. É paradigmático que, em vez de demonizar, Metheny tenha se lançado na internet com força, e eleito o podcast como seu principal porta-voz – quando o jornalismo musical superou as piores previsões de Frank Zappa e a antes todo-poderosa indústria se ajoelha no altar do iPod. Mesmo não gostando de Pat Metheny, é um prazer ouvi-lo falar do último Metheny Mehldau Quartet, por exemplo, numa qualidade que o velho dial não atinge mais. Quando locutores e apresentadores jogam irrefletidamente a culpa em produtores de rádio – como jornalistas e repórteres jogavam em editores e diretores de jornal –, os artistas vão tomando de assalto os novos canais, e enterrando, ainda mais fundo, a mídia convencional. Parece não haver esperança para o rádio, assim como não há mais para as bancas de jornal. Felizmente, vivemos a aurora de blogs e podcasts.
>>> Pat Metheny
 
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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