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Sexta-feira, 28/12/2007
Digestivo nº 350

Julio Daio Borges

>>> O KINDLE, DA AMAZON A Economist, a melhor revista do mundo, não poupou elogios e decretou: o livro (de papel) acabou. No Brasil, passou meio despercebido — enquanto os brasileiros ainda tentam processar o iPhone (aliás, o último grito em matéria de contrabando). O fato é que o Kindle talvez não seja, mesmo, a solução final para o livro eletrônico. Como tecnologia, responde ao desafio de não precisar de computador (como o iPod), mas fica no meio do caminho entre um browser e o sucessor do livro físico. Ocorre que a tecnologia de Gutenberg não é mais a última fronteira em termos de leitura: hoje se lê tanto na internet quanto no papel (ou mais). Ou seja: qualquer leitor (aparelho) que se preze, não pode se dar ao luxo de resolver o problema dos leitores (ledores) de livro de papel apenas, ele tem de contemplar, igualmente, os leitores de internet (internautas). Parece complicado, mas, conceitualmente, não é. Jeff Bezos, da Amazon, se ocupou, durante anos, com a questão de fazer o livro de papel migrar para o seu "iPod de texto". Essa parte... talvez tenha conseguido. Mas quando tentou integrar a internet — os sites, os blogs (novas fontes de leitura) — ao Kindle, tropeçou no problema de ter de transformar seu leitor eletrônico, que deveria ser simples, num... computador. Quem pensou em Palms, Blackberrys, e até iPhones, acertou. Afinal, onde termina o leitor, puro e simples, e onde começa o computador? Quem for ler a internet, vai querer, também, navegar por ela? E quem for seguir hiperlinks, vai querer enviar e-mails, publicar comentários, consultar o Google? O Kindle dá conta disso tudo? Por que vou preferir ler na sua tela e, não, no meu iPhone, que tira, também, retratos? Por que vou preferir dar forwards através dele se, no meu Blackberry, posso fazer também ligações? Por que vou fazer, nele, anotações, se a minha agenda está sincronizada com o meu Palm? Essas questões têm resposta? O Kindle é a resposta? Não sei, não.
>>> Kindle
 
>>> SAMBA MEU, DE MARIA RITA Nove entre dez críticas feitas a Maria Rita abordam "o problema do repertório". Talvez a associação sempre inevitável com sua mãe, Elis Regina, gere inconscientemente o desejo de ouvir Maria Rita cantando, de novo, o "cânone" da MPB. Se já é comparada com a mãe por fazer o que faz, imagine o que aconteceria se ela seguisse a receita dos guardiões do nosso cancioneiro. Maria Rita, na verdade, tenta o mais difícil: estabelecer um novo repertório, revelar uma nova geração. Como, aliás, fez sua mãe. Acontece que a indústria, a mídia e o público, às vezes, parecem tão refratários às novidades que, de repente, se esquecem de que o cânone musical dos anos 60 também já foi... lançamento. Seria muito mais cômodo, para Maria Rita, gravar se inspirando nas efemérides (como os 50 anos da bossa nova, logo ali ao lado); posar de musa cool & inacessível (cantando tatibitates superproduzidos); ou até se lançar numa "carreira" no exterior (fingindo intimidade com Nova York, mas implorando pelos nossos espaços de divulgação). Nesse sentido, seu terceiro disco é talvez seu salto mais arriscado. De compositores efetivamente conhecidos, só Gonzaguinha, com a ótima "O homem falou"; o resto, quase totalmente dominado por Arlindo Cruz (e parceiros variados), nas boas "Num corpo só", "Tá perdoado" e "O que é o amor"; e, ainda, grandes momentos com Rodrigo Bittencourt ("Samba Meu"), Serginho Meriti ("Cria") e Edu Krieger ("Maria do Socorro"). A opção pelo samba, neste terceiro registro em estúdio, talvez tenha tido um poderoso efeito de marketing, mas não deve ser esteticamente ressaltado, porque Maria Rita já havia visitado o gênero antes e porque ela não precisa, necessariamente, apoiar-se na sua "versatilidade" como cantora. Se é verdade o que dizia Schopenhauer — que os grandes espíritos devem assumir seu papel de liderança —, então, em vez de reclamar do repertório não ser justamente aquele que já conhecemos, deveríamos agradecer a Maria Rita por tentar nos mostrar novos caminhos, agora, no samba.
>>> Samba Meu
 
>>> O ROMANCE MORREU, DE RUBEM FONSECA Embora estivessem na internet — acessíveis no Portal Literal —, as crônicas de Rubem Fonseca não fizeram o mesmo sucesso que seus contos e romances. Também, pudera: um autor tão identificado com a "mídia" livro talvez não tenha tido oportunidade de comunicar que estava igualmente disponível na Web. Enfim: provavelmente pensando nisso, a editora Companhia das Letras transformou as crônicas virtuais de Rubem Fonseca em livro físico, o recente O Romance Morreu. Na internet, quando saíam, pareciam crônicas engraçadinhas, alternando "causos", como o caso de Luma de Oliveira com o bombeiro (essa fora do livro), com histórias ("estórias", se ainda existisse) da literatura e filosofices várias (insights seria melhor?). No livro — na seqüência —, parece que o Rubem Fonseca cronista não pega no tranco: são textos bem escritos, com aquele vocabulário interessante dos demais volumes (contos, novelas, romances), mas: ou o autor desvia do assunto ou não produz uma conclusão 100% satisfatória. No entanto, como que salvando ou justificando o livro, de repente, no final, "José — uma história em cinco capítulos": as memórias despercebidas — pelos resenhistas — de José Rubem Fonseca. É bem possível que o cronista da Web não emplaque a tempo, mas as memórias do escritor Rubem Fonseca deveriam ser continuadas, e concluídas (além desses cinco primeiros capítulos), para o bem da nossa literatura. Nelas estão a vida em família (de origem portuguesa), os primeiros bicos do jovem "José" e, naturalmente, as caudalosas leituras. Aliás, se compararmos com a "formação" de seus colegas escrevinhadores de internet, em termos de literatura, é uma humilhação. Tudo bem que nem tudo que sai, todo ano, tem valor, mas O Romance Morreu merece, nem que seja, uma espiadela discreta na livraria.
>>> O Romance Morreu
 
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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