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Quarta-feira, 17/6/2009
O Poeta Fingidor, com documentário de Claufe Rodrigues

Julio Daio Borges




Digestivo nº 420 >>> Fernando Pessoa, quem diria, virou atração turística. É a primeira impressão do documentário de Claufe Rodrigues, exibido pelo GNT e agora encartado, em formato DVD, na nova antologia O Poeta Fingidor, pela editora Globo. Desde o mausoléu, entre reis de Portugal, até a estátua, fotografada à exaustão, passando pela casa, pela biblioteca e pelas relíquias da sobrinha-neta, Fernando Pessoa está exposto à visitação pública, embora, durante toda a vida, tenha fugido da realidade, e se enterrado no "sonho", como seu heterônimo Bernardo Soares. É, à primeira vista, uma contradição — e nada indica que sua poesia será melhor compreendida por causa desse alvoroço. Enfim, tirando a curiosidade pela celebridade (da qual nem Pessoa escapa), o documentário vale pelas intervenções de José Blanco, Gonçalo Tavares, entre outros entusiastas da obra. A sugestão de que Pessoa teria superado Camões é exagerada, naturalmente. Ainda que o tenha feito, recentemente, em número de traduções. Conforme um depoimento, muito oportuno, aponta: Álvaro de Campos se media com Walt Whitman, Ricardo Reis se media com o latino Horácio e Alberto Caeiro se media com os gregos clássicos — mas nada indica nem sequer a intenção de superá-los... Carlos Felipe Moisés, no prefácio da antologia, justifica a popularidade de Fernando Pessoa por ele haver antecipado o "estilhaçamento do ego do homem moderno". Não sabemos mais quem somos; somos, portanto, vários — um para cada situação. Daí, os "heterônimos" — e a conclusão, angustiante, de que uma personalidade, só, não basta. "Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me" é um verso de Campos em "Tabacaria"... Não faltam, claro, os clichês no documentário, como o pôr do sol, combinado à leitura de "Mar Português". Ficam, contudo, as revelações, como a do slogan, maroto, criado para a Coca-Cola: "Primeiro, estranha-se; depois, entranha-se". Fernando Pessoa pertence mais à nossa época do que à sua própria, mas essa aparente tragédia, de não ter sido quase publicado (e reconhecido) em vida, pode tê-lo salvado.
>>> O Poeta Fingidor
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

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