busca | avançada
59318 visitas/dia
1,7 milhão/mês
Quarta-feira, 21/9/2011
O Dinheiro e as Palavras, de André Schiffrin, pela BEĨ

Julio Daio Borges




Digestivo nº 482 >>> Apocalípticos da internet, que têm o hábito de pregar o fim dos suportes impressos, não costumam ser levados a sério no Brasil. Os jornais, por exemplo, preferem republicar matérias traduzidas que defendem sua existência mesmo nos piores cenários. Editoras preferem acreditar que os tablets continuarão inacessíveis, economicamente, para a maior parte da população. (Ou que a internet em banda larga, no Brasil, nunca irá se popularizar.) Já as livrarias preferem apostar em formatos "proprietários" de livros eletrônicos, cujo preço de capa é muito similar ao do livro impresso original... Ou o nosso País é mesmo um caso à parte, ou jornais, revistas, editoras e livrarias do Brasil estão tentando se enganar. Surpreendentemente, porém, a BEĨ Comunicação publicou, em português, O Dinheiro e as Palavras, de André Schiffrin ― que é o maior vaticínio, impresso, sobre, justamente, o fim de jornais, livros, editoras e livrarias. Provavelmente não recebeu atenção da nossa mídia ― que, como muito paciente em doença terminal, prefere não falar do próprio fim. Antes que André Schiffrin seja taxado de maluco, ou de inimigo da mídia impressa brasileira, o prefácio é de ninguém menos que Carlos Eduardo Lins da Silva, ex-ombudsman da Folha e, sob muitos aspectos, um dos maiores jornalistas em atividade no Brasil. E é Lins da Silva quem, antes de mais nada, admite: "Ninguém duvida da seriedade das ameaças existentes à sobrevivência dos meios de comunicação tradicionais, especialmente os impressos". Reconhecendo, obviamente, que: "Jornais, revistas e livros têm desempenhado há séculos um papel de mediação entre cidadãos e Estado". Mas acrescentando, com algum desalento: "O negócio das palavras poderá nunca mais ser tão lucrativo quanto já foi...". Schiffrin, por sua vez, não joga a culpa na internet ou na digitalização, mas começa afirmando que a raiz do problema está nos "novos capitalistas" que assumiram os recentes conglomerados de mídia (consolidados depois da globalização). No ramo editorial, por exemplo, Schiffrin argumenta que as velhas editoras, que antes se contentavam com 3 ou 4% de lucro, agora, dentro de um conglomerado de mídia, são obrigadas a ter lucros entre 10 e 15%. Então, dá-lhe best-sellers, massificação de conteúdos e pasteurização de ideias. Schiffrin acusa os próprios "editores" de terem ficado com "cabeça de investidores" ou "de banqueiros", tendo de agradar magnatas de mídia, como Murdoch, ou tendo de pagar empréstimos monumentais a investment bankers (vide o caso New York Times). Em contrapartida, Schiffrin sugere que as transformações, no mundo editorial, talvez só reflitam as mudanças em várias outras corporações de ofício: advogados não advogariam mais e, sim, correriam atrás de casos e clientes mais lucrativos; arquitetos não projetariam mais e, sim, maximizariam os custos por metro quadrado; e médicos não praticariam mais a medicina e, sim, maximizariam os gastos de pacientes com planos de maior cobertura. Em suma, a pressão por grandes lucros havia simplesmente chegado ao ramo editorial... Para piorar, o próprio Schiffrin conclui: "Nenhum capitalista sensato investiria em uma livraria hoje, ou em uma editora, ou em um jornal". E num momento de controversa opinião pessoal: "Eu defendo que o mercado tradicional não nos mostrou como preservar o tipo de cultura independente e diversificada que sabemos necessitar". O Dinheiro e as Palavras, evidentemente, aponta soluções, com as adotadas nos países nórdicos (ainda que utópicas). E traz capítulos intitulados "Para ajudar as livrarias" e "Para salvar a imprensa". Com seu assunto é candente, seus dados se desatualizam rápido, mas, neste momento, é um trabalho que, guardadas as devidas proporções, não deixa nada a dever a similares europeus ou norte-americanos. Os guardiões dos nossos "impressos" podem até se fazer de surdos ou cegos diante deste livro, mas, como o paciente terminal que recusa tratamento, vão apenas morrer mais rápido e mais dolorosamente.
>>> O Dinheiro e as Palavras
 
>>> Julio Daio Borges
Editor
 

busca | avançada
59318 visitas/dia
1,7 milhão/mês